A ousadia de inovar esteticamente após mais de 30 anos de carreira rendeu, ao Titãs, o prêmio de melhor show segundo a Associação Paulista de Críticos da Arte (APCA). O DVD Nheengatu — ao vivo, lançado neste mês, foi gravado durante a turnê do ano passado e tornou-se a nova marca da banda.
Com a irreverência de sempre, o Titãs toca em assuntos espinhosos como pedofilia, violência contra a mulher e a miséria. Mas as letras, mais cruas e ácidas como as do início da carreira, vêm acompanhadas de uma nova proposta de apresentação. “A gente se retificou como grupo e isso trouxe um frescor, uma nova pegada titânica”, afirma Branco Mello, vocalista e baixista.
A música que abre o show é Fardado, umas das nove faixas inéditas. Inspirada nas manifestações de 2013, a canção faz uma ponte com Polícia, do disco Cabeça Dinossauro, que aborda a truculência dos polícias de 30 anos atrás. As máscaras e narizes de palhaços utilizados nos protestos serviram de inspiração para o primeiro videoclipe do álbum. “Pintamos o rosto para a gravação e o efeito foi tão bacana que decidimos incorporar na turnê”, conta Paulo Miklos,vocalista e guitarrista.
Durante a primeira parte do show, os integrantes estão de máscaras e perucas — semelhantes às pinturas do clipe — sob um jogo de luz que confere atmosfera cenográfica ao que acontece no palco. “Quando a gente entra mascarado não dá outra: as pessoas ficam muito atentas à letra das músicas. E isso foi ótimo, porque apresentamos só canções inéditas nesse momento do show”, comenta Mello.
Foi essa força visual que acabou fazendo de Nheengatu a nova identidade do Titãs. “Nós conseguimos alcançar algo inédito mantendo as coisas mais básicas e importantes: a sonoridade e a personalidade do nosso som”, explica Miklos. Para ele, a sintonia atual da banda foi o que possibilitou essas inovações, e ela é resultado de um longo processo de amadurecimento coletivo.
Satisfação
Todo o grupo é composto por três vocalistas, dois baixistas, dois na guitarra e um no teclado. E essa conta só fecha porque a maioria dos integrantes desempenha mais de uma função no palco. “Estamos nos arriscando e seguindo em busca da satisfação artística”, comenta Paulo Miklos. Para o show Nheengatu, o Titãs ainda contou com a participação do baterista Mário Fabre, que segundo Miklos, também consolidou-se criativamente na banda.
Além das faixas novas, canções de discografias que há bastante tempo não subiam ao palco, foram resgatadas, como Massacre e Televisão, de 1985; Desordem e Jesus não tem dentes no país dos banguelas, de 1987; Lugar Nenhum, de 1998; e Vossa Excelência, de 2005. “Todas estas foram selecionadas porque dialogam muito bem com o repertório novo”, explica Branco Mello.
O DVD é composto por 19 faixas e quatro músicas extras, selecionadas a partir das mais pedidas pelo público durante a turnê. “Quando finalizávamos o show, a plateia sempre pedia mais uma e, por isso, resolvemos adicionar algumas que não estavam no roteiro original”, conta Mello. Todas elas são do disco Cabeça Dinossauro, de 1986.
Para saber mais
O que significa nheengatu?
A definição da palavra vem nos tempos coloniais. Sem conseguir distinguir as línguas e dialetos falados na nova terra, os colonizadores portugueses ouviam apenas uma “língua brasílica”. Derivado do antigo tupi-guaraní e dos ouvidos pouco apurados dos colonos, nasceu uma forma de comunicação eficaz entre eles e os índios: o nheengatu. Resgatando a origem da palavra, que evoca a promoção do entendimento coletivo, Branco Mello afirma que essa também é uma das intenções do Titãs: “Que as pessoas ouçam umas às outras”.
Nheengatu — ao vivo
DVD da banda Titãs. Gravadora Som Livre. 19 faixas.
Preço sugerido: R$ 32,90.