Belo Horizonte, já há muitos anos, é pródiga em eventos culturais gratuitos, mas em praças e parques. De uns tempos para cá, a oferta de espetáculos em teatros com entrada franca ou ingressos a preços bastante razoáveis vem crescendo. Em 12 de agosto, uma multidão madrugou em frente ao Sesc Palladium para trocar um quilo de alimento não perecível por ingressos para o show 'Chão de giz – Zeca Baleiro canta Zé Ramalho'. E muita gente voltou para casa com as mãos abanando.
Também no mês passado, no dia 10, uma segunda-feira, uma fila de pelo menos três horas se formou em frente ao CCBB para adquirir senhas da apresentação que o ex-Police Andy Summers faria no teatro. Para o público que já tem prática no esforço de conseguir um ingresso de graça, as horas na fila valem a pena. Que o diga o massoterapeuta Marco Aurélio Gomes de Oliveira, de 49 anos, que chegou ao Teatro Bradesco às 23h de domingo para ficar na fila – a bilheteria só abriu ontem ao meio-dia. Primeiro a ser atendido, ele só teve companhia depois das 4h, quando o segundo fã de Simone chegou.
“Vi de graça Zélia Duncan, Adriana Calcanhotto e Ana Carolina. Mas também virei noite para comprar ingresso para Bethânia. Acho que o prazer de ver quem a gente gosta bem de perto é o maior incentivo para chegar cedo”, comentou Marco Aurélio. Um pouco atrás dele, a engenheira civil Luciana Ribeiro, de 31, aguardava, com três amigas, a chegada de sua vez. “Há uns anos, BH não tinha tanta opção. Hoje, dá para assistir a muita coisa de graça em lugares de qualidade”, comentou.
PÚBLICO ECLÉTICO Pagar pouco ou nada para um show também leva um público diferente aos teatros. Vendedor desempregado, Jarison Pacheco, de 30, conheceu o Sesc Palladium no show de Baleiro. Havia chegado às 5h no teatro e surpreendeu-se ao encontrar uma fila. Foi o penúltimo a pegar as senhas (as de número 497 e 498, das 500 distribuídas). “Era uma madrugada fria, fiquei com fome e vontade de ir ao banheiro. Mas faria novamente. Teve muita gente querendo comprar, mas não venderia de jeito nenhum. Não é o valor monetário, mas o esforço que fiz”, disse Jarison.
Se, para ele, o esforço é novidade, para o estudante Guilherme Veloso, de 23, é prática antiga. Já viu Alceu Valença, 14 Bis, entre outros, só ficando na fila. “E você não perde em nada a qualidade do show. Mesmo sendo gratuito, ele é igual ao pago.”
Estudante de música, Felipe Rezende, de 21, também frequenta o circuito “de graça”. Mas está longe de aceitar tudo que vem pela frente. “Não faz sentido ir a um show gratuito se não me interessa”, afirmou ele, que dá preferência a shows de jazz e música brasileira, além de concertos.
Três perguntas para... Simone, cantora
1 - O que você espera da turnê a R$ 1, que começa quinta-feira em Belo Horizonte?
O preço por vezes acaba afastando o público que tem vontade de ir, mas nem sempre consegue. Era um sonho bem antigo. Sempre me apresentei para grandes plateias, fiz muitos shows ao ar livre, mas uma turnê com concepção, luz e cenografia de teatro, praticamente gratuita, será a primeira vez. E, simbolicamente, acho interessante o valor de R$ 1. O que se compra com esse dinheiro hoje em dia?
2 -Salvo engano, à exceção da Sandra Pêra (no espetáculo Baiana da gema), você foi dirigida em toda a sua carreira por homens. O que o olhar de Christiane Torloni na direção de É melhor ser representou para você?
Queria ter o olhar feminino, de uma pessoa de teatro e que olhasse para mim e me visse. E foi exatamente o que a Chris fez. Ela é uma grande atriz, e tem esse universo que eu queria mostrar. E eu precisava desse olhar atento no momento em que imagino, simbolicamente, esses 40 anos de carreira.
3 - Que pontos em comum você vê entre as compositoras escolhidas para o repertório?
Acho que, a partir dos anos 1970, período que retrato no disco ('É melhor ser', lançado em 2013), houve um florescimento de compositoras. Até então, a composição no Brasil era quase exclusiva dos homens. Enfim, houve uma vontade de homenagear essas mulheres de vanguarda, guerreiras, amantes e, acima de tudo, grandes artistas. E percebo que, além da escrita feminina, cada uma dessas compositoras tem uma assinatura muito particular, uma linguagem fortíssima que as diferencia. Mas, para esta turnê que estreia em BH, ampliei o leque de compositores, sinto necessidade de oxigenar o roteiro, cantar outras coisas de tanto tempo. A essência permanece, mas será um show bem diferente daqui para frente.
De graça (ou quase)
45 anos da FCS – Até o dia 22, apresentações no Palácio das Artes com Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, Cia. de Dança e Palco de Encontro (músicos mineiros). A partir de
R$ 10 e R$ 5 (meia). Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400.
CCBB – Espetáculos de artes cênicas a R$ 10 e R$ 5. Shows Claro Experiências, às quartas, gratuitos (senhas uma hora antes do show). Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400.
Filarmônica – Apresentações regulares: assinantes que não podem comparecer doam ingressos, que são distribuídos para estudantes (alunos de música têm prioridade). Concertos para a Juventude, projeto mensal, com ingressos a R$ 5 e R$ 2,50 (meia). Rua Tenente Brito Melo, 1.090, Barro Preto, (31) 3219-9000.
Dois na Quinta – De outubro a dezembro, encontros de músicos mineiros na Sala Juvenal Dias. Dia 1º de outubro, Pedro Morais e Luiz Gabriel. R$ 5 e R$ 2,50 (meia). Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400.
Jazz por 10 – Nas terças de setembro, o percussionista Túlio Araújo faz show com convidados na Autêntica. R$ 10. Rua Alagoas, 1.172, Savassi, (31) 3654-9251.
Meio de Campo – Quintas de setembro, shows no Cine Theatro Brasil. Nesta semana, Hermeto Pascoal e Rafael Macedo. A partir de R$ 20 e R$ 10 (meia). Praça Sete (Rua dos Carijós, 258, Centro, (31) 3201-5211).