Se em 'Radamés e o sax' (1987) o foco era a música do gaúcho Radamés Gnatalli e em 'Vento do norte' (2014) o culto era aos estilistas nascidos no Norte e no Nordeste do país, agora a atenção se dirige ao mineiro de Guaxupé José Godinho Filho, o Casé.
Nascido em junho de 1932 e encontrado morto num hotel da Boca do Lixo, em São Paulo, em dezembro de 1978, ele começou tocando bateria, aos 10 anos, acompanhando o pai, que era sapateiro de profissão e músico nas horas vagas. Teve um irmão trompetista e três irmãos saxofonistas. Aos 12, assumiu o sax e clarineta e, além de bailes, tocou em circo, boates e gafieiras. Tornou-se o primeiro saxofonista da orquestra da Rádio Tupi aos 13 anos e, aos 21, excursionou por Europa, Oriente Médio e Estados Unidos.
Tocou com nomes consagrados, como Zimbo Trio, Dick Farney e Nailor Proveta, e influenciou Nivaldo Ornellas, Paulo Moura e Raul de Souza. Mesclando elementos de samba, jazz e choro, ficou famoso como o maior improvisador do saxofone brasileiro nos anos 1950 e 1960. Gravou uma dúzia de discos como solista, mas só um, Samba irresistível, saiu com seu nome. Na década de 1970, não tinha o mesmo prestígio e participava dos shows da boate Oba-Oba, de Sargentelli.
Leo Gandelman, que comemorou os 59 anos de idade no dia 10 de agosto, começou a estudar música clássica nos anos 1970 e aos 15 anos já atuava como solista num Concerto para a Juventude da Orquestra Sinfônica Brasileira. Passou um tempo dedicado à fotografia, estudou na Berklee College of Music e, a partir de seu disco de estreia, em 1987, foi ganhando o posto de principal nome do jazz fusion brasileiro, feito no Rio de Janeiro com colegas como Ricardo Silveira, William Magalhães, Nico Assumpção e Carlos Bala.
Na segunda metade dos anos 1990, começou a diversificar a carreira e, nos 2000, passou a mostrar maior versatilidade, em discos como 'Lounjazz'(2005), 'Sabe você' (2008), 'Origens' (2011), 'Vip vop' (2012) e nesta série dedicada a investigar os caminhos do sax brasileiro.
A homenagem a Casé foi bem- executada, com misto de técnica e entusiasmo a cargo de um grupo bem integrado, com Leo se revezando entre os saxes alto, tenor e barítono, ao lado do baixo do sobrinho Alberto Continentino, do piano de Eduardo Farias, de Rafael Barata e Antonio Neves na bateria, do sopro de Serginho Trombone, das guitarras de Ricardo Silveira e Lula Galvão, com a percussão de André Siqueira e Beto Cazes.
O repertório, que vai de 'Linda flor' (Henrique Vogeler e Luis Peixoto), de 1928, a 'Coisa nº 10' (Moacir Santos e Mario Telles), de 1965, começa com Noel Rosa ('Feitiço de oração' e 'Feitiço da vila'), passa uma turbinada em Lupicínio ('Se acaso você chegasse'), relembra a rara parceria de Vandré e Carlos Lyra ('Quem quiser encontrar o amor'), apimenta o Nelson Cavaquinho de 'A flor e o espinho', recupera a 'Menina moça' de Luiz Antonio, o Baden de 'Cidade vazia' e o 'Amor proibido de Cartola', desaguando no malandrinho 'Tamanco no samba', de Orlandivo e Helton Menezes.
Um conjunto de standards que recebe do grupo um tratamento ao mesmo tempo respeitoso e inspirado, com bons solos e uma sonoridade bem-definida, com arranjos bem-concatenados de Leo e do pianista Eduardo Farias. Casé, com certeza, ficaria feliz com a homenagem.