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Palácio das Artes

Paulinho da Viola comemora 50 anos de carreira com show em BH

Ao Estado de Minas, músico diz que "não há nada a comemorar" e afirma que não se deve ter atitude conservadora diante das mudanças históricas

Ailton Magioli
Paulinho da Viola toca neste sábado no Palácio das Artes, acompanhado de banda que tem seu filho João Rabello ao violão - Foto: KELLY FUZARO/DIVULGAÇÃO“Não dá para ficar chocado com mais nada”, afirma Paulo César Batista de Faria, o Paulinho da Viola, de 72 anos, 50 dos quais dedicados à música, desde que ele subiu ao pequeno palco do célebre Zicartola, de Cartola e Dona Zica, no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1964. Avô de Renata, de 24; Luciana, de 23; Amanda, de 13; Luan, de 10; Isadora, de 9; e Vicente, de 2 anos, o cantor, compositor e instrumentista faz show comemorativo do meio século de carreira amanhã à noite, no Palácio das Artes.


O sambista diz que, com o passar do tempo, é preciso compreender a força de determinadas manifestações musicais, capazes de provocar, inclusive, mudanças de comportamento. “Como o rock, que, ao chegar ao Brasil, nos anos 1950, provocou um verdadeiro bochicho no colégio público em que eu, então com 13 anos, e meu irmão Francisco Batista de Faria, um ano mais novo, estudávamos”, recorda. “Naquela época, onde era exibido o filme 'No balanço das horas' não ficava uma cadeira. Quebravam tudo.”

 

Veja: Ausier inicius e Lucas Telles interpretam 'Choro negro', do disco 'Nervos de aço' (1973)

 

 

 

Nesse tempo, Paulinho era acostumado a ouvir Pixinguinha, Jacob do Bandolim e Ciro Monteiro, ao lado de seu pai, César Faria, e teve dificuldade de entender o que aquele ritmo alucinante provocava em jovens como ele. “Fiquei perplexo com aquela música demoníaca”, diz. A revolução de comportamento foi percebida por ele  vendo as primas do subúrbio dançarem  freneticamente ao som do então nascente rock’n’roll. “Achava aquilo uma loucura.”

Apesar de admitir ter-se mantido distante de muitos movimentos que o rodearam desde então, Paulinho afirma que não dá para ter um comportamento conservador diante das novidades. “A maioria é que decide. Ninguém controla isto. Você pode não gostar do rap, do funk, mas não pode ignorá-los.”

 

Michele Andreazz e Lucas Telles homenageiam Paulinho da Viola e cantam 'Para ver as meninas':

 

 

 

Sobre o show iniciado em 2014 a partir da data redonda de seus 50 anos de carreira, diz: “Não há o que comemorar. Não tinha nem pensado, as pessoas próximas é que me cobraram”. Ele sobe ao palco acompanhado de banda formada pelo filho João Rabello (violão), Dininho Silva (baixo), Ricardo Costa (bateria), Adriano Souza (piano), Mário Seve (sopros), Celsinho Silva (ritmo), Hercules Nunes (percussão), Muiza Adnet e da filha Beatriz Faria (voz).

BAÚ Para montar o repertório, ele foi ao fundo do baú da própria criação, onde pescou pérolas como 'Botafogo chão de estrelas', em parceria com Aldir Blanc, feita para Walter Alfaiate gravar em seu primeiro disco. “Falamos um pouco do bairro, de muitos anônimos que se tornaram conhecidos pela capacidade de agregar, seja em bailes, seja em blocos de carnaval”, recorda.

Do início da carreira trouxe 'Coisas do mundo minha nega', que há muito tempo ele não cantava, além de composições feitas com Elton Medeiros, tais como 'Recomeçar', 'Ruas que sonhei'. “Há também as mais conhecidas, que não podem ficar de fora, como 'Dança da solidão', 'Onde a dor não tem razão', 'Sei lá', 'Mangueira', 'Para um amor no Recife' e 'Pecado capital'”, cita. 'Bebadosamba', 'Roendo as unhas', 'Sarau pra Radamés' e o choro instrumental 'Inesquecível' também estão no roteiro do show, assim como 'Foi um rio que passou em minha vida'.

O cantor lembra que continua criando, mas não com a mesma intensidade. “Às vezes até com uma provocação, como a do Eduardo Gudin, que me ligou avisando que estava gravando e esperava a letra ('Ainda assim') que havia me pedido há 15 anos. O meu processo é este”, diz Paulinho da Viola, que deu para a filha Beatriz Rabello gravar  em seu disco de estreia o samba 'Bloco do amor'.

“Componho principalmente choro instrumental, de que eu gosto muito”, diz, atribuindo sua parcimônia em parte às mudanças do mercado fonográfico. “O clima começou a ficar estranho nos anos 1980”, diz, lembrando que naquela época ligava as FMs e quase não ouvia música brasileira. “Nem os grandes nomes tocavam. Quer dizer, alguma coisa estava acontecendo”, afirma, sem citar diretamente a prática do  jabá (execuções pagas).

Desde então, o cantor passou a ter uma carreira mais espaçada em discos, gravando apenas esporadicamente. Ele conta que certa vez ganhou de presente do filho um pequeno gravador digital, no qual passou a registrar muitas de suas criações. Até o dia em que deixou o objeto escorregar e cair dentro d’água, perdendo tudo. “Então, também, não fico angustiado para gravar. Sei que tem o momento para acontecer.”


PAULINHO DA VIOLA E BANDA

Sábado, às 21h, no Grande Teatro do Palácio das Artes, Av. Afonso Pena, 1.537, Centro. Classificação: 16 anos. Ingressos – Plateia 1: R$ 240 (inteira) e R$ 120 (meia); Plateia 2: R$ 200 (inteira) e R$ 100 (meia) e Plateia superior: R$ 180 (inteira) e R$ 90 (meia). Informações: (31) 3236-7400 e 4003-2330.

 

Eles preferem Paulinho

 

“Paulinho da Viola é uma grande referência. Ele é de uma escola de grandes mestres: Candeia, Paulo da Portela, Argemiro da Portela e toda a velha guarda da escola. Minha preferida do repertório de Paulinho é Sinal fechado, por causa da musicalidade e do arranjo, além da letra”
>> TONINHO GERAIS, sambista



“Em tempos em que cada um luta ferrenhamente para reinventar sua roda particular, Paulinho da Viola é um dos exemplos mais claros de que a roda não se reinventa. Poucos compositores souberam compreender como ele a importância de ter os pés fincados na tradição para desenvolver a sua linguagem própria. A obra dele sobrevoa o samba, mas com os pés plantados no seu chão. Afinal ‘a rapaziada está sentindo a falta de um cavaco, de um pandeiro e de um tamborim’. Ele soube beber do samba, e bêbado dele é que soube expressar o seu sentimento ao mundo.”
>> SÉRGIO SANTOS, cantor, compositor, instrumentista



- Foto: Aline Calixto/Divulgação“Poucos fazem samba com tanta perfeição. Lembro-me da primeira vez que estive com ele. Mal consegui dizer umas míseras palavrinhas. Eu o observei, com toda a sua calma, perceber meu nervosismo e até achar engraçada a situação. Da segunda vez, acho que fui mais atrapalhada ainda, pois consegui expressar meu carinho e admiração por uma sequência ininterrupta de palavras e o convidei para ouvir a regravação que fiz de uma de suas músicas para o meu segundo CD. Gravei uma das que mais amo dele: Coração vulgar.”
>> ALINE CALIXTO, cantora



“O Paulinho é a minha referência desde a infância.  A linha melódica dele é boa demais e única. Paulinho também me influenciou na forma de tocar cavaquinho. A paleta dele é muito simples, mas de uma grandeza absoluta. Gosto de toda a obra dele, mas  a que mais me atrai é Argumento,  que, dizem as más línguas, ele teria feito depois de o Benito de Paula botar piano no samba.”
>> SERGINHO BH, sambista



“Paulinho da Viola é aquele tipo de compositor que tem músicas para chorar, para refletir, para sambar, para amar.  É o tipo de pessoa com quem dá vontade de conversar horas, pela doçura, inteligência e humildade. Minha música preferida dele é Ainda mais, da parceria com Eduardo Gudin.”
>> MARINA GOMES, cantora