Fernanda tinha apenas 12 anos quando perdeu o pai. Apesar da tenra idade, já tinha uma gravação fonográfica no currículo. Cantou o clássico Asa branca com os irmãos, Daniel e Amora, e o pai, Gonzaguinha, no disco Luizinho de Gonzagão Gonzaga Gonzaguinha, de 1989, um tributo ao Rei do Baião com músicas juninas.
A saudade é embalada por canções de Gonzaguinha e envolta em muita admiração pelo trabalho dele, morto em acidente de carro, aos 45 anos, em 29 de abril de 1991, após apresentação no Paraná. No ano em que Gonzaguinha completaria sete décadas de vida - em 22 de setembro -, ela pretende lançar o primeiro disco solo, apenas com composições do pai, duas delas nunca gravadas, e pede ajuda ao público no site de financiamento coletivo Embolacha. A campanha termina na sexta-feira (3/7).
“Tem várias músicas inéditas guardadas. Dá pra um disco. Essas duas estão lá, guardadas, e eu resolvi pegar pra mim, já que meus irmãos ficaram quietos. Passei na frente e peguei pra mim”, brinca. Caminhos do coração e Guerreiro menino também estão no repertório, composto pelas canções de que ela mais gosta - várias delas menos exploradas. Cercada de certo mistério, a escolha pretende mostrar as diversas facetas do artista, o viés político, romântico, existencialista dele.
Fernanda e Daniel são filhos do primeiro casamento, com Ângela. Ela tinha 3 anos quando os dois se separaram. Eles sempre moraram no Rio de Janeiro, enquanto Gonzaguinha residia em Belo Horizonte, com a segunda esposa, Louise Margarete Martins (Lelete), e Mariana. Amora é filha da atriz Sandra Pêra.
“Meu pai era um pai normal. Ele morava em Belo Horizonte, mas isso não fazia dele um ausente. Mesmo tendo filhos de várias histórias, era muito importante para ele manter os irmãos juntos”, recorda. Nas férias, toda a prole o acompanhava nas viagens a trabalho e presenciavam as apresentações na plateia ou nas coxias.
A relação com o Rei do Baião era mais distante, pois ele se dividia entre as casas na Ilha do Governador e em Exu, no Sertão pernambucano. “Ele era uma pessoa muito simples e os netos eram uma grande alegria. Em Exu, era um espaço enorme. A gente passava o dia brincando. Tinha criança da nossa idade. A casa do meu avô era aberta para a cidade. Todo mundo o conhecia”, recorda. As crianças dividiram o palco com o pai.
Apesar de ainda não ter lançado um álbum solo, Fernanda canta desde os 16 anos, quando foi convidada por Paula Leal para integrar o elenco de uma peça teatral. Arrastou a irmã, Amora, e depois conheceram Isadora Medella. Quase sem compromisso, surgiu o grupo Chicas, quarteto cujos espetáculos são dedicados à música brasileira, com canções de Gonzaguinha, Caetano Veloso, entre outros. A carioca saiu do grupo em 2011. “Senti a necessidade de me afastar, mas não teve briga, nada. A minha questão foi pessoal. Eu me afastei da música em geral”, explica. Ela se dedicou mais aos filhos, Caio, de 14 anos, e os gêmeos Joaquim e Sofia, de 8, e a um ateliê de costura.
O recomeço, no ano passado, foi impulsionado pelo que chama de abstinência. E nenhuma canção poderia deixá-la mais à vontade do que as composições do pai. “A falta que ele faz é estúpida, não tem como mensurar. A falta é diária. Alguém assovia na rua, eu entro no táxi e escuto. Não tem como descansar a perda, mas nunca coloquei peso nela”, diz. Agora, ela vai colocar voz na saudade, em formato de canção.
As inéditas
Relativo
“Pessoa é o que ela é
só ela vê o que ela vê
só ela faz o que ela faz
só ela sabe o que viveu”
“A música aborda pontos de vista, das diferentes perspectivas de uma mesma coisa. Eu enxergo uma coisa diferente de você, que enxerga diferente do seu amigo, do seu pai. É uma música muito do meu pai. Ele era observador, curioso com as características das pessoas e tinha esse olhar para tudo”.
Aprender a sorrir
“Fala basicamente de viver sem medo e de se abrir para a vida. Fala de uma leveza e de perder o medo mesmo, das coisas da vida, dos relacionamentos. De se abrir para o carinho mesmo, não necessariamente casamento. É uma música doce, leve”.
Como ajudar
Na sexta-feira (3/7), acaba a campanha de financiamento coletivo no site Embolacha. Os contribuidores podem ajudar com R$ 20 a R$ 1,5 mil para cobrir os custos com músicos, masterização, mixagem, prensagem, recompensas e o percentual do site, de 15%. A meta é de R$ 27.710.
Homenagens
Daniel Gonzaga está à frente do show Moleque: Gonzaguinha 70 anos, com ele, Fernanda e a banda Chicas no elenco, além de convidados como Paulinho da Viola, Elza Soares.