De forma intuitiva, a gaúcha acha que essa tem sido a levada de sua carreira. Já são 24 anos desde que lançou 'Enguiço', o primeiro álbum. “No começo, as pessoas já apontavam isso. Diziam que as letras se sustentam sem canção. Era só ler. A partir daí, comecei a cuidar mais disso”, conta. Adriana Calcanhotto subirá ao palco do Grande Teatro do Palácio das Artes em formato que a deixa muito à vontade: voz e violão.
“É um formato tão natural para mim, porque a vida inteira foi assim. É o máximo de transparência. É assim que toco em casa, me aproprio de composições dos outros”, diz. Outro aspecto que a tranquiliza é o repertório. “Está tão bem encadeado que não tem aquele momento ‘ai meu Deus, agora vem aquela canção da qual estou enjoada’. É uma delícia para mim”, garante. E olha que o repertório nem é tão novo assim.
Desta vez, Adriana apresenta aqui o show 'Olhos de onda'. Embora nunca saiba ao certo como vai estruturar o set-list, já que o concerto foi gravado em DVD – o terceiro da carreira –, sabe-se que é um passeio por diversas fases da carreira. Terá cerca de 20 canções, entre elas, a promessa de soar 'Vambora', 'Devolva-me', 'Esquadros', 'Metade', 'Maresia'. Também terá versões para 'Back to black', de Amy Winehouse, e 'Me dê motivo', de Michael Sulivan e Paulo Massadas. Bem, isso é o previsto. Surpresas não estão descartadas.
“É uma das possibilidades da voz e do violão, dá para encaixar outras coisas. Alguém pode pedir uma música ou eu posso não estar com vontade de cantar determinada canção. É uma liberdade muito maior”, garante. Adriana reconhece que, às vezes, pode parecer impopular, mas se naquele dia não tem clima para determinada música, não toca mesmo. “Acho desonesto cantar algo que não estou com vontade”. Algo que não ocorre com frequência.
Reencontro 'Olhos de onda', a canção que dá nome ao show, marca um momento de retomada na carreira de Adriana Calcanhotto. Em 2012, ela precisou operar o pulso para a retirada de um quisto. Por causa da lesão, ficou afastada do violão. Passou um ano e meio sem pegar no instrumento e, durante esse período, nem pensou em migrar para outro. “Não quis arriscar para não sofrer. Como sou prática, fiquei pensando ‘uma coisa a menos para carregar’”, lembra. Foi a época em que lançou 'O micróbio do samba' e contou com o apoio de Davi Moraes no violão.
O reencontro com o instrumento veio também cheio de questões. “Não teria como ser igual. Queria ver se eu era capaz de novo de fazer o que já tinha conseguido. Era uma meta para suportar a fisioterapia e quando estava terminando esse processo recebi o convite para fazer o show”, conta. A proposta veio da Fundação Gulbenkian, de Lisboa. “Fiz sem plano nenhum de virar uma turnê”. Não deu outra.
Na bienal
Música e poesia têm se misturado tanto na vida de Adriana Calcanhotto, que, além do show de nesta sexta, tem o sábado com compromissos literários. A cantora e escritora é convidada do Café Literário na Bienal do Livro de Minas junto com Gregório Duvivier, outro artista que se divide entre a atuação e a redação. O tema da mesa deles é “A poesia que me fez”. A proposta é de um bate-papo descontraído sobre as referências literárias de ambos e como as leituras os influenciaram como criadores.
Uma curiosidade é que 'Olhos de onda', a canção que dá nome ao DVD e ao show que Adriana apresenta hoje, também tem raiz nas letras. É uma homenagem a Machado de Assis, ou melhor, uma referência aos “olhos de ressaca”, de Capitu, protagonista do romance homônimo. Calcanhotto tem seis livros publicados, sendo um romance ('Saga lusa') e pelo menos três de ilustrações, como a 'Antologia Ilustrada da Poesia Brasileira', lançada este ano.
A participação no Café Literário está marcada para 14h, no Pavilhão de Feiras do Expominas, Avenida Amazonas, 6.030, Bairro Gameleira. Os ingressos custam R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
INHOTIM
Todas as vezes que vem a Belo Horizonte, Adriana Calcanhotto faz questão de chegar um dia antes para outro compromisso, quase religioso: visitar Inhotim. Já foi e voltou várias vezes. A última vez que esteve na cidade deu azar de se deparar com um dia chuvoso. “Gosto muito de rever as coisas. São novos olhares. É lindo porque vai guardando memórias diferentes”, comenta. Para ela, se apresentar por aqui é sempre hora de se encontrar com uma plateia educada. No mês passado, Adriana foi uma das convidadas do Fórum das Letras, de Ouro Preto. Mais uma vez diz ter se surpreendido com as conversas que manteve por aqui. “É tão bom o contato. Em evento literário é a mesma coisa do camarim. Tem um encontro direto com as pessoas, o público tem a oportunidade de fazer pergunta, conversar”.
ADRIANA CALCANHOTTO
Sexta, às 21h. Palácio das Artes. Avenida Afonso Pena, 1.537, (31) 3236-7400. Ingressos: Plateia 1: R$ 140 (inteira) e R$ 70 (meia); plateia 2: R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia). Também à venda na internet.