Tem uma jovem compositora mineira que anda recebendo importantes considerações: Thais Montanari, de 28 anos. Ela foi escolhida durante o 45º Festival de Inverno de Campos de Jordão (SP) para compor peça que será apresentada na edição de 2015. Chegará ao próximo evento como aluna convidada, selecionada em grupo de sete bolsistas. “É um prêmio ótimo. Todos os envolvidos no festival são bons instrumentistas”, observa. “E é um incentivo para continuar compondo. Meu trabalho está dando frutos”, garante.
A peça para o festival não é a primeira encomenda que Thais Montanari recebe. Ela escreveu Quinquilhares para a Flutuar Orquestra de Flautas e fez, em 2009, trilha para alunos do Grupo Corpo. Paisagens (2014) foi feita a pedido do instrumentista e construtor de instrumentos Leandro César, do grupo Urucum na Cara. Não são os únicos momentos em que as composições dela estiveram em destaque. Acrescente-se participação no Derivasons, em residências, movimentação que deixou rastro de peças apresentadas no Brasil e no exterior. “É bom ter desafios regularmente”, garante.
Interferências (2011), Cala (2013) e A ser roído (2013), para a compositora, podem ser uma síntese do trabalho realizado até agora. “São peças que construíram os lugares que me interessam trabalhar. Música visual, que envolve também cenário, luz, vídeo e o gesto do instrumentista. Depois, vem a eletrônica, que produz gama de sons interessante. E a articulação do eletrônico com o acústico. Ambos são muito bonitos, prazeres diferentes”, explica. Obras são também valorizadas por terem sido realizadas em boas condições e com bons instrumentistas. “Vi Interferências acontecer três vezes, algo inimaginável para mim”, comemora.
É a própria compositora quem avisa que tem outro interesse: a difusão da música contemporânea. “Acho importante apresentar a música contemporânea de concerto fora do meio acadêmico”, afirma. “Pode ser a praça pública, o teatro, o centro cultural, lugares que não foram criados para concerto”, exemplifica, reafirmando projeto caro ao Derivasons. Situações que trazem novos modos de pensar a música e de lidar com a questão do espetáculo. E que permitem experimentar outra acústica e conhecer diferentes públicos.
Exatamente por esse motivo, Thais Montanari não esconde carinho especial pelo Centro Cultural São Bernardo, de BH, onde tocou, com o Derivasons, em programa que tinha, no mesmo dia, um grupo do bairro. “Tivemos público mais interessado no que fazíamos do que o que encontramos em lugares já acostumados à música contemporânea”, recorda.
Identidade “O desafio posto a quem compõe é fazer boa música, o mais de acordo possível com o que gosta”, afirma. “É achar sua identidade e exercitá-la, independentemente de pressões, seja para descobrir coisas novas, comerciais e até as vindas da história da música contemporânea no Brasil. Há uma nova geração que tem muitos compositores bons, gente que se interessa por coisas que não estão nos limites do contemporâneo”, avisa.
“Vivemos momento em que há mais recursos musicais do que há 50 anos. Há mais liberdade para falar da música. Ainda há resistência, não do público, mas dos patrocinadores”, conta. Para quem faz música de concerto, recursos significam, por exemplo, condições para pagar os instrumentistas. ‘‘Eles são gente boa, mas também são artistas profissionais”, afirma.
Muitos caminhos
Primeiro surgiu o desejo de estudar um instrumento e teoria musical. Uma amiga sugeriu, então, que ela se inscrevesse nos cursos da Fundação de Educação Artística (FEA). Estudou flauta e, em aulas dos professores Sérgio Rodrigo Lacerda e José Padovani, conheceu os muitos caminhos e experimentações da música feita hoje. “Fiquei encantada em descobrir que existia música tão diferente”, recorda. Decidiu fazer vestibular para a Escola de Música da UFMG sem nem saber que área escolher. Acabou optando por composição, mesmo sem ter escrito nenhuma peça.
“No início, como todos os meus colegas de turma já tinham alguma experiência, ficava com vergonha de mostrar o que fazia. Mas fui me soltando e amando compor. Hoje, vejo que foi a melhor escolha que podia ter feito”, afirma Thais. O curso universitário trouxe aulas de piano. “Tocar um instrumento é essencial para um compositor. Abre a escuta, desenvolve atenção à relação entre instrumentos, faz o compositor se sentir na pele do intérprete”, explica. A artista valoriza programas de residência, que considera oportunidade de trabalho, estudo, conhecimento do público e outras realidades.
Compor, afirma Thais, exige dedicação. “Tem que cumprir prazos. O que quer dizer abrir mão de outras atividades para se concentrar”, conta. Tempo que pode ser de uma semana (“o que é desesperador, mas há concertos que aparecem inesperadamente”) até três meses. Feita a partitura geral, é comum o próprio compositor ter de fazer o trabalho de edição, isto é, criar a partitura especifica de cada um dos instrumentos que usou. Tudo pronto, não é raro o autor ter de batalhar, e muito, para ouvir o que escreveu. “Por isso, quanto mais possibilidade de mostrar a composição, melhor”, frisa Thais.
A mineira não se incomoda com prazos curtos, mas anda feliz pelo fato de ter seis meses para compor a obra para Campos do Jordão. “Dá tempo para amadurecer uma ideia, consultar amigos instrumentistas, ver como tocam o que você escreveu. A opinião de quem estuda anos seu instrumento é sempre importante”, justifica. Até porque gosta sempre de levar em conta o temperamento do músico, de modo que o instrumentista fique à vontade tocando.
Thais Montanari integra o Derivasons, formado pelos compositores Luis Friche, Marcos Braccini, Marcos Sarieddine e Renam Fortes, voltado para apresentação de peças dos seus integrantes.