Longe dos palcos, Rita Lee usa a escrita como terapia

Com 50 anos de carreira, a roqueira vai lançar um livro com as "historinhas" que publicou no Twitter

por Diário de Pernambuco 06/08/2014 11:48
A&E/Divulgação
Irreverente, Rita Lee faz 50 anos de carreira e vai publicar livro (foto: A&E/Divulgação)
A ruiva e sardenta Rita Lee Jones sempre chamou a atenção pelo carisma e pela beleza. Na escola, era uma garota brincalhona e travessa, mas ficava séria e focada durante jogos da seleção de handebol, da qual fazia parte — não gostava de perder. Morava em um lar musical, onde o rádio estava sempre ligado e a casa se enchia com as vozes de Ângela Maria, Cauby Peixoto e outros cantores de sucesso na década de 1950 em São Paulo. A música ganharia para Rita um sentido quase vital ao longo dos anos.


Mas quem desconfiaria de que a garota levada teria talento para instrumentos? A professora de piano, famosa pianista da época, Magdalena Tagliaferro, deu a dica ao pai de Rita, o dentista Charles Jones: "A menina tem talento, mas é muito tímida." Mal sabia ela que Rita Lee se transformaria na rainha única do rock brasileiro, de voz marcante e suave e de intensa personalidade no palco.

Versátil, Rita Lee sempre mostrou domínio em diversas linguagens da arte ao longo de 50 anos de carreira, comemorados neste ano. Desde performances poéticas e ousadas em shows, até a aventura muito bem-sucedida como escritora. Em 2012, a cantora chegou a anunciar aposentadoria, após impecável carreira solo. Mas deixou o pijama de lado para comemorar na estrada as cinco décadas dedicadas à música.

Em entrevista ao Correio Braziliense/Diario, contou que escrever tem sido a melhor terapia que encontrou desde que foi internada para uma mastectomia — cirurgia de remoção completa da mama que consiste um dos tratamentos para o câncer. "Nada melhor do que cicatrizar em paz tendo um brinquedinho novo nas mãos, quando o Twitter virou um vício eu tratei de me desintoxicar, como fiz com todas as drogas antes navegadas. Um Twitter na mão, uma fiçcão na cabeça, era assim que eu funcionava, quando eu ia ver, já era… a teclinha 'send' foi mais rápida. Devo ter escrito umas 200 historinhas, umas boas outras um lixo."

Sobre o próprio estilo de escrita, Rita classifica como "insanidade gentil" e revela que se empenha em produzir uma autobiografia. "No momento estou viciada em escrever minha biografia, se rolar baixaria, me autoprocesso." (risos).

Casada com o músico Roberto Carvalho, desde 1976, a cantora experimentou a maternidade e a cumplicidade. "Acho que o sucesso do meu relacionamento pode ser atribuído à cumplicidade no crime de amar até as últimas consequências". Ao longo da carreira, cantou tabus femininos, como a menstruação, em Cor-de-rosa choque, e a menopausa (Menopower). Mas hoje em dia, ela diz que envelhecer talvez seja o maior tabu feminino, além dos mistérios e das transformações intensas pelas quais as mulheres passam.

Entrevista

Foram meses de negociação com a maior roqueira do Brasil. Rita Lee, sempre educada e atenciosa, alegava algum motivo para adiar a entrevista. Enfim, a ex-vocalista dos Mutantes respondeu. Confira a conversa com a cantora e saiba um pouco mais sobre o jeito Rita Lee de viver.

Literatura e terapia

Há séculos, quando meus filhos eram pequenos, lancei três livros infantis sobre as aventuras do dr. Alex, um cientista que virou ratinho de laboratório e fugiu para declarar a independência dos animais. Me expresso bem melhor escrevendo do que falando, letras de música só consigo a lápis, o "santo" gosta e entende minha escrita. O Twitter me fez chegar mais perto das pessoas e vomitar minhas loucuras em 140 caracteres. Depois de um tempo, encheu o saco. Fiz muita terapia, mas a melhor de todas as terapias está sendo escrever.

Tradução

Se há alguma tradução séria para mim deve ser numa língua extraterrestre tipo . Na minha lápide, se não me cremarem como quero, estará escrito "não foi um bom exemplo, mas era gente fina".

Muita calma, muita euforia


O que me acalma é controlar a respiração e observar bichos, plantas e pedras. Euforia mesmo só quando minha neta espontaneamente diz que me ama.

Storynhas, o livro


Confesso que não mexi uma palha nesse livro. A ideia toda partiu da editora (Cia. das Letras), que se antenou nas bobagens que eu escrevia no Twitter, selecionou algumas e propôs o convite ao (à) genial Laerte, sem dúvida um bom casamento à primeira vista.

Biografias


Biografia autorizada de celebridade é sempre meio babação de ovo. Quem lê gosta mesmo é da pimenta, inventada ou não. Trabalhei 50 anos direto na estrada sem nunca ter recebido apoios culturais para turnês e temporadas, o que, aliás, muito me orgulha. Estou morando no mato cercada de bichos, cuidando da horta, pintando vidrinhos vazios de perfume e nas horas vagas compondo músicas novas. Agitação urbana só quando vou ao dentista.

Leituras, música e TV


No momento, estou relendo meus gibis do Mandrake, reouvindo Kid Creole and the Coconuts, reassistindo A feiticeira e colecionando James Dean.

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