Um veio da Mangueira, o outro da Imperatriz, o terceiro era do Salgueiro, já o quarto da Portela… Em meados dos anos 1960, uma turma de amigos de diferentes escolas de samba do Rio de Janeiro resolveu se reunir para formar um grupo de bambas com um nome pra lá de original: Originais do Samba. O saudoso ex-trapalhão Mussum (Antônio Carlos Bernardes) no reco-reco; Rubão (Rubens Fernandes) no surdo; Bidi (Murilo da Penha Aparecida e Silva) na cuíca; Chiquinho (Francisco de Souza Serra) no agogô; Lelei (Wanderlei Duarte) no tamborim; e Bigode (Arlindo Vaz Gemino) no pandeiro. Este último, aliás, o único integrante que está até hoje no grupo.
“Inicialmente, éramos um conjunto mais focado na coreografia, no samba no pé. A coisa de cantar veio depois e nos tornamos o primeiro grupo de samba do Brasil a gravar um disco. Isso lá pelos idos de 1968”, destaca Bigode, de 72 anos. “Sou o único remanescente daquela época. E olha que fui o último a entrar. É como diz o ditado: os últimos serão os primeiros”, brinca.
Embora muita gente pense que o grupo não se mantenha na ativa, o músico assegura que a agenda continua abarrotada de compromissos. O atual quarteto – completado por Scooby (cavaco), Rogério (violonista) e Júnior (vocalista) – nunca parou de fazer shows. Além de percorrer várias cidades do interior, todas as quintas eles sobem aos palcos da casa de espetáculos Bar Brahma, em São Paulo. “Quando você some um pouco da mídia, o pessoal acha que o grupo acabou ou não existe mais. Mas estamos aí na estrada, a todo vapor. Lançamos um CD recente, Originais do Samba – Não deixa o samba morrer, com participações especiais de Zeca Pagodinho, Benito di Paula e Reinaldo, o príncipe do pagode. O disco foi superbem recebido pelos nossos fãs”, comemora.
Em 2015, o grupo Originais do Samba vai completar meio século de trajetória e já está de olho nas comemorações. Para marcar a data, pretende gravar o primeiro DVD da carreira. “E tem que ser ao vivo, porque é outra história. E é bom lembrar que além dos quatro que fazem parte do conjunto, temos mais seis músicos que tocam na banda de apoio. E eles fazem toda a diferença”, ressalta Bigode.
O músico lembra com carinho dos tempos em que estouraram no Brasil e no exterior. No começo da carreira foram contratados por Carlos Machado (produtor e diretor musical) e acompanharam grandes nomes da música popular brasileira, como Elis Regina, Jair Rodrigues e Vinicius de Moraes. “A gente viajou por toda a Europa e América Latina. Argentina, Peru, Bolívia, Paraguai, Suécia, Suíça, França e Holanda foram alguns dos países onde nos apresentamos. Fizemos muito sucesso mesmo”, recorda o artista.
O sexteto original se tornou conhecido quando gravou Cadê Teresa, de Jorge Benjor. Era o início do chamado suingue ou balanço. “Hoje é o que chamam de samba-rock. É uma música que nunca falta nos nossos shows, assim como O lado direito da rua direita, Tá chegando fevereiro, Saudade e flores e A subida do morro, entre outras”, lembra Bigode.
Estilo
O atual vocalista do conjunto, Júnior, de 36 anos, está há 22 no Originais do Samba e tem muito orgulho de fazer parte desta “família. Para o cantor, o segredo de o grupo estar há tantos anos na estrada é, sobretudo, a persistência, fazer o que gosta e procurar gravar o que o público quer ouvir. “A gente se mantém fiel ao samba tradicional, ao samba-raiz, e não gravamos modinha. O samba atualmente é mais comercial e foge muito das suas raízes”, opina.
Já Bigode diz que a essência foi preservada ao longo desses 50 anos e o fato de os atuais integrantes terem crescido ouvindo as músicas do Originais do Samba contribuiu também para a preservação do estilo. “Nunca fizemos nada de errado, nunca saímos da linha. A gente se manteve fiel à nossa tradição, não só no jeito de tocar, mas até no modo de vestir. Essa coisa do paletó, da camisa de seda e da gravata. Isso foi muito importante para estarmos aqui até hoje”, acredita.
três perguntas para...
Bigode
sambista
Até que ponto a saída do Mussum atrapalhou a carreira do Originais do Samba?
Quando ele saiu, em 1979, sem dúvida, a gente sentiu muito, porque o Mussum era o nosso líder. Aquilo pesou demais. Mas ele optou por ser um Trapalhão, então não tinha muito o que fazer. Mas conseguimos superar e hoje as pessoas associam o Mussum muito mais com os Trapalhões do que com o Originais do Samba. Já são 35 anos. Acho que conseguimos, sim, caminhar com nossas próprias pernas.
Como você analisa o atual momento do samba?
Não vejo o samba em seu melhor momento. A gente vê o pessoal do pagode e alguns grupos como o Revelação e o Sorriso Maroto sempre bombando, mas ninguém com grandes sucessos como antes. São fases. Mas a maioria vive mesmo do passado, até mesmo os principais bambas, como o próprio Zeca Pagodinho e o Jorge Aragão. E acho que essa coisa de ter tantos ritmos em voga, como o sertanejo, o funk etc., acaba atrapalhando um pouco. Mas o samba é assim: agoniza, mas não morre.
Você consegue imaginar a sua vida sem os Originais do Samba?
De jeito nenhum. Comecei nessa vida ainda adolescente e tudo que eu tive foi por meio do Originais do Samba e da música. Conheci não só o Brasil inteiro, mas vários países, e se tudo der certo vou continuar no grupo por muitos anos. Estou me sentindo muito bem de saúde e tenho muito tempo de música pela frente. Estou com 72 anos, mas o corpinho é de 50 (risos).
Assista ao clipe da música dos Originais do Samba: