À disposição na internet para download desde a última quarta-feira, 9 — o disco físico chega no dia 15 às lojas, pela Universal —, o álbum 'World peace is none of your business' (A paz mundial não é da sua conta) é o novo trabalho do cantor britânico Morrissey, de 55 anos.
Um dos grandes poetas do rock, Morrissey também tem marcado sua trajetória por ser um ativista de acentuadas contradições. Mas, em 'World peace', suas contradições estão tão bem engatadas que parece manifesto de uma nova (e melodramática) contracultura.
É o 10º disco de Morrissey - o mais recente fora 'Years of refusal', de 2009. Chega justamente um ano após ele lançar suas memórias, o livro 'Autobiography', que se tornou um best-seller mundial. Nas 11 faixas, algumas com mais de 5 minutos de duração ele trata de política, vegetarianismo, violência, sexualidade e ambientalismo.
Há ôuôuuuuuus em toda a extensão da música. Os vocais de Morrissey estão cristalinos, e o estilo discursivo e político parece desprovido de senso poético - o que é a mais famosa armadilha de Morrissey. Trata-se, no todo, de um dos mais elaborados trabalhos literários dos últimos anos no pop rock, e cada encaixe é feito de uma construção poética em simbiose com um suporte musical.
Ouça faixa-título do novo álbum de Morrissey:
'Neal Cassady drops dead', a faixa mais bonita, parte de antissolos de guitarra para apoiar versos que vêm como declamações, tipo spoken words de um beatnik temporão. O tema central é o luto do poeta Allen Ginsberg ao saber da morte do também poeta Neal Cassady, seu ex-companheiro. "Neal Cassady caiu morto/E o uivo de Allen Ginsberg se tornou um grunhido." Uivo é o nome do poema mais importante da beat generation. A canção vai se "aflamencando" no final, com ênfase nas cordas de aço de um violão. Fosse só essa e Morrissey já teria batido o cartão com êxito em 2014.
'Istanbul' tem um som mais clássico de guitarras, e até mesmo um clima de rock setentista. 'I’m not a man' tem 1min38 de introdução iniciando com o som de um portão de ferro na sonoplastia inicial. Daí vem uma percussãozinha lânguida. A canção sugere uma paródia de Harold Arlen, uma Judy Garland às avessas. É o manifesto da própria liberação pessoal do artista. "I’m not a man/I’m something much bigger and better than/A man" (Não sou um homem/Sou algo muito maior e melhor que um homem).
'Earth is the loneliest planet' tem um scratch bizarro, além de violão e guitarra. É um som circular, com um corinho gospel no meio, e brinca com a ambiguidade entre o protesto ambiental e a conclusão de que nasceu com o sexo errado. 'Staircase at the university' é a que mais dignifica o estilo Smiths. 'Smiler with knife' teatraliza um estupro. 'Kick the bride down the aisle' tem pinta de oração pop, com teclado de catedral.
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O cantor demonstra grande forma artística justo no momento em que vive um rosário de cancelamentos de shows, por conta de problemas de saúde. A turnê norte-americana de 2013 teve mais de 40 cancelamentos. Cancelou ainda shows em São Paulo, Rio e Brasília, em julho de 2013.