Realmente, não é pouco. A caminho dos 70 anos, que serão completados em outubro do ano que vem, o carioca Luiz Alves dedicou a vida a ser baixista de vários dos mais importantes trabalhos brasileiros, sobretudo da MPB e do instrumental. Com muita humildade e talento. “Ainda não pensei em nada a respeito de comemoração, mas estou querendo fazer alguma coisa. De repente, lá para janeiro, fevereiro. É muita trabalheira”, afirma. Alves anda ocupado com o trio com Donato e o baterista Robertinho Silva, além da nova formação do Som Imaginário e de mais um disco com o gaitista Maurício Einhorn, entre outros.
Com isso, sua produção autoral continua restrita ao álbum 'Mar azul' (Niterói Discos), lançado em 2008, com temas seus ('Bolerito pro Gusmão', 'Fátima e Abre o olho') e outros em parceria, como Minha esperança, 'Céu de Iracema' (com Luizão Paiva) e 'Mar azul' (com Wagner Tiso). O trabalho, que também homenageia o pianista Luiz Eça (com quem Alves tocou por anos), teve participação de craques como Tiso (piano), Donato (piano), Kiko Continentino (piano), Robertinho Silva (bateria e tamborim) e Einhorn (gaita).
Gravado na mesma época, o álbum 'Autoral acústico', só com músicas escritas por Alves, ainda está engavetado, embora ele queria lançá-lo no ano que vem. Os arranjos são assinados pelo pianista Gilson Peranzzetta, que entrou em estúdio com Luiz ao lado do flautista e saxofonista Mauro Senise e do baterista João Cortez. O trabalho ainda precisa ser mixado, mas o baixista não tem pressa “O bom é que o nosso tipo de música dura para sempre. Não tem essa de ‘já gravamos há não sei quanto tempo’.”
“Não fico batalhando, correndo atrás. Fico fazendo mais as coisas que aparecem. Não tenho tanto nome como o Luiz Eça e o João Donato têm. Vou fazendo vários trabalhos. Também faço eventos particulares, coquetéis, shows para firmas. Para fazer meu trabalho solo é mais complicado. De vez em quando aparece. Meu trabalho solo faço até mais fora do Rio de Janeiro”, conta.
Escola
Alves começou a tocar aos 8 anos, aprendendo violão com o pai, que trabalhava na Casa da Moeda e, paralelamente, tocava com a cantora Carmélia Alves, com o conjunto vocal Os Boêmios e na Radio Mauá. O baixo só veio mais tarde, por volta dos 18, por sugestão de um tio que era baterista (Fernando Careca) e, depois, do saxofonista Oberdan Magalhães (ex-integrante da Banda Black Rio). “Comecei tocando baixo acústico na noite. Peguei e saí tocando. Fui quebrando a cara, levando broncas”, lembra.
O aperfeiçoamento veio quando decidiu estudar o instrumento com o italiano Sandrino Santoro. “Fui procurar o professor Pedro Mião na Escola Nacional de Música, mas ele já era idoso, não queria mais tocar nem dar aula. O Sandrino estava terminando o curso e foi minha salvação, o grande cara na minha vida. Comprei um método e passei a ir à casa dele estudar. Viu que eu tinha jeito e já me passou uma professora de solfejo. Orientou-me e até hoje é o cara. Ligo para ele para conversar, trocar ideia, tirar dúvidas”, conta.
Os estudos foram de extrema importância para o seu progresso, mas foi na noite que Alves realmente se formou. “Aprendi muita música, tive conhecimento de harmonia, toquei com vários pianistas, foi minha faculdade. Falo com o maior orgulho e prazer que toquei com os grandes pianistas brasileiros. Aprendi com todos eles”, lembra. Um, sem dúvida, é Wagner Tiso, responsável por apresentá-lo aos demais músicos mineiros com os quais viria a trabalhar.
“Aprendi muito sobre harmonia com a turma de Minas. Wagner, Milton Nascimento, Toninho Horta. Wagner era da nossa praia. Tocava bonito, com uma harmonia diferente. Ficamos amigos logo de cara e andava sempre com a gente. Eu era muito diferente do Robertinho Silva, pois gostava de ir embora e não de ficar na noite. O Robertinho é que ficava com o Wagner por aí, por isso ficaram mais ligados. Montamos um trio e aí o Wagner falou de um amigo quer era muito bom, que tinha inscrito umas músicas em festival”, conta. O amigo era Milton Nascimento e restante do caso virou história.
Exterior
O baixista chegou a morar um ano em Los Angeles, nos Estados Unidos, na década de 1970, e conta que, se não fosse por Egberto Gismonti, provavelmente teria ficado de vez por lá. “Era uma época brava no Brasil, uma confusão, não acontecia nada. Recebi uma proposta para ir para lá fazer a peça Orfeu negro. Fui com Robertinho Silva, quem nos chamou foi o pianista Dom Salvador. Ficamos por lá depois que o contrato acabou, mas aí o Egberto foi lá me chamar para gravar o disco Circense. Já tínhamos gravado juntos e ele disse que estava com outros trabalhos, que queria fazê-los comigo. Foi muito gente boa, me ajudou muito. Aprendi muito com ele e ele comigo, modéstia à parte”, lembra.