“O que é uma vida de artista/ No mercado comum da vida humana...”, interrogam os inspirados versos de Abel Silva para a melodia de Sueli. O registro límpido de Simone reaviva, em boa hora, a certeza de que “cada um que conhece a sua sede/ É artista da vida ou da morte”. Como ela faz questão de ressaltar, no país das cantoras as compositoras acabaram superadas pelos colegas homens – salvo raríssimas exceções, como Chiquinha Gonzaga, Dolores Duran e Maysa.
“Em um mundo muçulmano, as mulheres são guerreiras”, constata Simone. Parceira de Abel Silva ('Merecimento') e de Hermínio Bello de Carvalho ('Vale a pena tentar'), a baiana se deu o privilégio de musicar um trecho da carta que recebeu de Fernanda Montenegro. Na relíquia, oportunamente reproduzida no encarte do CD, a atriz diz: “Uma pessoa é o que a sua voz é”. E salienta o fato de a artista ser “uma das poucas mulheres/cantoras integradas com a sua própria identidade interior de ser humano”.
Amor O novo disco traz várias Simones, afirma a cantora. “A partir do momento em que Fernanda Montenegro chancelou o projeto, parti para ouvir a obra de autoras contemporâneas, limitando o repertório ao ano 2000”, relata. A empreitada ficou difícil diante da variedade de canções compostas por mulheres. “O conceito desse CD é não ter conceito. Trata-se, na verdade, de um conceito musical”, garante.
“O universo feminino é lindo, cheio de curvas”, avalia Simone, lembrando que captou esse olhar nas canções, algumas construídas junto de parceiros homens. Presenças obrigatórias no repertório são Joyce ('Os medos', com Rodolfo Stroeter) e Fátima Guedes ('Haicai'), ambas gravadas por ela no início da carreira. A novidade é a presença de Alzira Espíndola, irmã de Tetê, que divide com Vera Lúcia Motta a autoria da incisiva Mulher o suficiente, perfeita na interpretação de Simone.
Regravações de Rita Lee ('Mutante', parceria com Roberto de Carvalho) e Marina Lima ('Charme do mundo', com Antonio Cícero) podem até soar inoportunas, mas releituras de composições de Adriana Calcanhotto ('Aquele plano para me esquecer'), Joanna ('Descaminhos', com Sarah Benchimol), Teresa Cristina ('Trégua suspensa', com Lula Queiroga), Angela Ro Ro ('Só nos resta viver') e Dona Ivone Lara ('Acreditar', com Délcio Carvalho) são bem-vindas na moderna canção brasileira, universo em que as mulheres avançaram bastante.
Simone gosta também de Mart’nália e de Tulipa Ruiz. Só não incluiu composições delas no novo CD porque o repertório ficaria extenso demais. A relação com Zélia Duncan, aprofundada a partir do CD 'Amigo é casa', gravado pelas duas em 2008, é responsável por 'Só se for', assinada pela dupla. “ZD transita maravilhosamente bem em todos os meios”, diz a baiana, elogiando a amiga, a quem se refere pelas iniciais. A compositora fluminense ajudou a selecionar o repertório do álbum.
BH A turnê de Simone chega à capital mineira em 8 de dezembro, no Palácio das Artes. Além de canções do novo CD, ela incluiu no set list de Candeeiro (Teresa Cristina) à classica Outra vez (Isolda), passando por Canteiros (poema de Cecília Meireles musicado por Fagner) e Primeira estrela, de Luli (da ex-dupla Luli & Lucina).
A cantora se esbalda em cena, inclusive ao som de sambas de roda baianos. “A ‘minha’ que levo para o show é Jura secreta”, diz, referindo-se ao hit de sua carreira, composto por Sueli Costa. Dirigida por Christiane Torloni – inclusive, ela cita no disco o bordão da atriz: “Hoje é dia de rock, bebê” –, Simone estará acompanhada de Bia Paes Leme (teclado) e Leandro Braga (direção musical, piano e teclado), que assinam a produção de seu CD.
SIMONE
Palácio das Artes. Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. Em 8 de dezembro, às 21h. Plateias 1 e 2: R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia). Plateia superior: R$ 100 (inteira) e R$ 50 (meia). Ingressos já estão à venda.