Aos 61 anos, Gordin fala baixo e com dificuldade. Consequência dos problemas de saúde que enfrenta desde a década de 1970. As histórias dele envolvendo abuso de LSD e internações em sanatórios contribuem para reforçar a fama de gênio indomável. De perto não é bem assim.
“Toquei, toquei, toquei não parei mais”, diz. Não à toa é considerado pela crítica especializada como um dos principais guitarristas da história da música brasileira. O adjetivo “emblemático” é facilmente empregado a ele. “Recebo com a maior honra. Fico muito feliz de ser o guitarrista emblemático da sociedade brasileira”, brinca.
Filho de pai russo e mãe polonesa, Alexandre Gordin nasceu em Xangai, na China, em 28 de novembro de 1951. Viveu um período em Israel antes de se mudar para o Brasil com a família. O pai era dono da casa noturna paulistana Stardust, por onde começou a carreira. Um dos momentos marcantes do início foi a participação no show de Wanderleia, ainda na década de 1960.
“Como estava muito cru, comecei o show tocando no máximo volume. Toquei uma posição só, não sabia mais nada. No fim, um pessoal chegou para a Wanderleia e falou: ‘Você é maravilhosa, canta muito bem, é divina e tal, mas manda aquele rapazinho abaixar a guitarra um pouco que não estamos aguentando mais’. No outro dia, ela me despediu”, lembra.
Depois da breve experiência com a moça da Jovem Guarda, Lanny Gordin juntou-se ao Brazilian Octopus, de Hermeto Pascoal. “Aprendi muita coisa com ele e fui me entrosando. Comecei a ficar cada dia melhor”, diz. Foi pelo empenho e pela qualidade que já apresentava que um dia foi convidado para ir à casa de Gilberto Gil. Quem o chamou foi Tony Osanah, integrante argentino dos Beat Boys, surpreso com o som que Lanny conseguia tirar.
Daquele momento o guitarrista se lembra da imagem de Gilberto Gil abrindo a porta. “Ele nos atendeu com o cabelo blackpower, uma bata indiana, super-hippie. Toquei com ele uns 20 minutos e aí ele falou: ‘Você é o guitarrista que a gente estava procurando para entrar no nosso grupo’”, recorda. Daquela época, Lanny gravou as guitarras em pelo menos quatro álbuns de Gal Costa, entre eles o antológico Fatal – a todo vapor. Com Caetano Veloso esteve no famoso Álbum branco, além de outros dois de Gil: Gilberto Gil 1969 e Expresso 2222.
Fora da Tropicália, tocou com Jards Macalé, Erasmo Carlos, Antônio Carlos & Jocáfi, Elis Regina, Tom Zé e Jair Rodrigues. “Hoje, eu me sinto muito amadurecido. Passei por tudo isso e cheguei à conclusão de que o importante na vida é muito simples. Acredito na lei da evolução. Qualquer ser humano vai chegar a ponto de realização espiritual, que vai para onde quiser”, divaga. “Hoje, me considero um guitarrista que cumpriu a missão.”
Inspiração Lanny Gordin nunca frequentou escola de música. “Criei meu estilo com o talento que Deus me deu. Foi uma espécie de inspiração que tive a todo momento. Não copiei ninguém e isso me tornou um guitarrista muito original”, diz. Segundo ele, também nunca se permitiu acomodar na criação, mesmo nos períodos de surto.
“Todo dia toco lá em casa”, conta. A moda agora é praticar uma nova técnica com liberdade total para o braço. Detalhes dessa invenção ele prefere manter em segredo. “Estou inventando da minha cabeça. Vamos ver o que vai pintar por aí. Pretendo gravar mais alguns discos. Planejo fazer um novo trio de guitarras. Vamos fazer shows por aí”, anuncia. O disco mais recente foi Auto-hipnose (2010) do projeto Kaoll & Lanny Gordin, distribuído pelo selo Baratos e Afins.
Participação em outros discos
• Brazilian octopus (1968)
• Gilberto Gil (1969)
• Le Gal (Gal Costa) (1969)
• Erasmo Carlos (1971)
• Gal a todo vapor (Gal Costa) (1971)
Expresso 2222 (Gilberto Gil) (1972)
• Jards Macalé (1972)
• Araçá azul (Caetano Veloso) (1972)
• Build up (Rita Lee) (1972)
• Aguilar e a banda Performática (1982)
• Aos vivos (Chico César) (1995)
• Vange Milliet (1995)
• Cuscuz clã (Chico César) (1996)
• Catatau (1997)
• O Q faço é música (Jards Macalé) (1998)