Musica

Sérgio Reis lança disco de inéditas depois de 10 anos

Com a tradição na música de raíz, Roberta Miranda comemora 25 anos de carreira com CD e DVD

Eduardo Tristão Girão

É com certa surpresa e nostalgia que termina a audição de 'Questão de tempo' (Radar), novo disco do cantor Sérgio Reis. Num cenário dominado pelos sertanejos universitários, a música e a temática adotadas por ele quase soam como algo vintage. Aos 73 anos e com nada menos que 54 de carreira, ele fez neste disco (o primeiro de inéditas em 10 anos) o que sempre soube fazer bem: ouvir as composições dos que o procuram e gravá-las com sua inconfundível interpretação.


“Procurei fazer um trabalho que a turma não esqueça. Um disco mais para cima, dançante. São músicas engraçadas, no estilo 'Pinga ni mim' e 'Panela velha', além de algumas coisas mais leves e a faixa-título, que é do Moacyr Franco. Ele é um baita compositor, canta bem para caramba e participou dessa música. No meio da gravação ele começou a chorar, pra você ter ideia da verdade da letra e do que é ser artista”, conta Sérgio Reis.

O disco conta com 10 faixas e, à exceção da canção que lhe dá título, todas foram compostas recentemente. “São de compositores que vêm de longe e me procuram para mostrar músicas. É preciso ouvi-las. O grande problema é que os artistas grandes não ouvem. O Amado Batista, por exemplo, ouviu 'Matuto', que incluí no disco, e aposta que essa é uma composição para estourar no Brasil. Ele tem ouvido bom para essas coisas”, lembra Sérgio.

O autor de 'Matuto', Amaduci, assina sozinho outras duas canções no disco, 'Morena faz de conta' e 'Fã de Jesus', firmando-se como compositor mais frequente do trabalho. “Ele é de Londrina, amigo do meu produtor e meu fã. Quando veio me mostrar o CD dele, ouvi as músicas e já escolhendo as que queria. Se você não dá atenção aos compositores, é difícil fazer um trabalho bom. Se me oferecessem para gravar 'Ai se eu te pego' eu não pegaria, pois não tem a ver com meu estilo. É preciso prestar atenção”, diz.

O cantor se lembra, por exemplo, de quando deixou passar a oportunidade de gravar a canção 'Era um garoto que como eu amava os Beatles e os Rolling Stones', quando ainda era um cantor da Jovem Guarda. Por outro lado, Filho adotivo, um de seus maiores sucessos, foi gravada a contragosto do empresário Tony Campelo. “Ele a achava muito longa”, conta. Praticamente acidental, por fim, foi 'Pinga ni mim', cujo registro pioneiro de Teodoro e Sampaio não agravada nem um pouco a Sérgio. “A versão deles era lenta, não acabava nunca. Foi o Tony quem me obrigou a gravá-la, mas meio vaneirão”, confessa.

Seresta

A febre do sertanejo universitário ele vê com bons olhos, mas com pequena ressalva: “Agora é a vez deles, como já foi a do pagode. Acho bom, acho válido. A gente conhece novos talentos, embora o que eles cantem não seja sertanejo. Eles fazem iê-iê-iê como fiz no passado, é o mesmo ritmo. Eles cantam bem e conhecem tudo de sertanejo, mas para eles o sucesso é por outro caminho. O sucesso está aí, as músicas tocam o dia inteiro. Não adianta brigar com o público”.

Com shows agendados praticamente no Brasil inteiro e turnê de uma semana prevista para outubro nos Estados Unidos, o cantor anuncia como um de seus próximos projetos um disco só de seresta. “Meu pai era seresteiro e me pôs para cantar 'Deusa da minha rua' quando eu tinha 7 anos. Fui amigo do Carlos Galhardo”, lembra. Já chamou Zeca Pagodinho para gravar com ele uma composição de Ataulfo Alves e está articulando a participação de Maria Bethânia.

Roberta Miranda precisou garimpar num repertório de 430 músicas as faixas do novo disco
Roberta Miranda precisou garimpar num repertório de 430 músicas as faixas do novo disco
Num piscar de olhos


“Vim do nada, me tornei algo e minha conduta sempre foi essa”, resume a cantora e compositora Roberta Miranda, outra veterana do sertanejo que está lançando disco. Com '25 anos – Ao vivo em estúdio' (Som Livre, também em DVD), ela revisita sucessos e apresenta duas inéditas autorais: 'Quem sentiu' (com participação de Alcione) e 'Onde mora o coração'. Nascida na Paraíba, a artista lançou seu primeiro disco em 1986 e tornou-se uma das cantoras brasileiras que mais venderam discos na história.

“Quando terminei de gravar o DVD, assisti-o para ver como tinha ficado e chorei muito. Esses 25 anos se passaram num piscar de olhos. Agradeci por ser mulher e nordestina num mundo tão machista e por ter adquirido credibilidade e um fã-clube enorme. Foi um momento de muita reflexão”, conta Roberta. Ela ficou seis meses envolvida na produção desse trabalho, cuja direção geral assina. Prestes a partir para a estrada novamente, ainda quer arranjar tempo para finalizar um disco de tango. “'Majestade, o sabiá' ficou linda nesse ritmo”, revela.

As 15 faixas foram escolhidas a partir de critério bem claro: só entraram as que fazem parte de discos com vendagem superior a 500 mil cópias. A artista assina quase todas, como 'Esperando você chegar', 'Dia D', 'São tantas coisas', 'Duas taças' e, claro, 'Majestade, o sabiá'. Ponto fora da curva é 'Café da manhã', clássico de Roberto Carlos e Erasmo Carlos. No DVD, há três faixas a mais: 'Tempo ao tempo', 'De igual para igual' e o pot-pourri 'Sol da minha vida/Desespero de uma noite'.

“Tenho só 430 músicas gravadas”, ironiza a cantora, que tem mais cerca de 300 na gaveta. Ela conta que o processo de composição é um tanto solitário, mas não durante o tempo todo: “Esse bichinho sempre me morde de madrugada e aí vou para o violão. Só faço música quando sinto. Aí levo para o maestro Caixote e dou as diretrizes do que quero”. Caixote (apelido de Marco Antonio do Carmo Pontes) é um experiente produtor e arranjador paulista, com larga experiência na cena sertaneja.

Como Sérgio Reis, Roberta se mostra simpática à geração do sertanejo universitário: “É um momento importante para eles, que respeito muito. Não tenho de remar contra a maré. Eles têm o talento deles e nós já somos consagrados. Temos de abraçá-los. Relaciono-me com todos eles e ele têm maior carinho e respeito por mim. Olho para jovens talentos como Talita Real, Laís e Thiago di Melo e vejo os sonhos e a força que sempre tive”.