Sem dúvida, 'Ventos do norte', que o saxofonista carioca Leo Gandelman lançou pela Saxsamba/Azul Music, é candidato a melhor disco de música instrumental do ano no Brasil. Com o mesmo grande talento demonstrado em seus últimos álbuns, os notáveis 'Origens' (2011) e 'Vip vop' (2012), o artista faz apanhado de 13 composições de saxofonistas nordestinos que, cada um à sua maneira, ajudaram a desenvolver uma linguagem própria para o instrumento no país.
“Foi um trabalho de pesquisa intenso, mas o resultado ficou muito musical, com peças leves”, afirma Gandelman. “Cheguei a ficar com medo de que o disco ficasse muito denso”, confessa. Saxofone porque choras, clássica composição do paraibano Ratinho (Severino Rangel), com a qual abre o repertório, foi a primeira música que o saxofonista tocou em seu instrumento, ainda no início da carreira, desvendando nota por nota de ouvido, sem auxílio de partitura.
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Os sergipanos Netinho (Pedro Silveira Neto) e Luiz Americano Rego, o potiguar K-Ximbinho (Sebastião Barros) e os pernambucanos Severino Araújo, Moacir Santos, Zumba (José Gonçalves Júnior) e Duda (José Ursicino da Silva) completam o quadro de compositores contemplados no disco, muitos deles nascidos antes dos anos 1930. Como costurar tudo? “Com minha visão musical, interpretação e arranjos. Não houve preocupação em ser fiel demais ao texto. Usei algo mais contemporâneo para os arranjos”, responde Gandelman.
Dessa maneira, o saxofonista impressiona ao não deixar dúvidas sobre a existência do tal saxofone brasileiro em releituras inspiradas de 'Chorinha da Tula' (Netinho), 'Dancing avenida' (Luiz Americano Rego) e da maravilhosa 'Espinha de bacalhau' (Severino Araújo), esta última peça escrita em resposta a choro complicado que um colega do maestro da Orquestra Tabajara, em João Pessoa (PB), havia escrito. Outro ponto alto é tocante performance de 'Ternura' (K-Ximbinho) – para não falar do já sabido alto nível das peças de Moacir Santos.
A assinatura final do disco é feita em dois tempos com a luxuosa participação do Maestro Spok nos frevos 'Cara lisa' (Duda) e 'Bicho danado' (Zumba), que assinou os arranjos do que ele e Gandelman tocaram. “A linguagem desses saxofonistas que pesquisamos era muito diferente da dos saxofonistas norte-americanos da época. Aqui há uma linguagem própria, incluindo sonoridade e abordagem, fora as composições em si. A primeira referência dos estudantes é o jazz, mas aqui já existe uma escola de saxofone. Não faz o menor sentido quere tocar como os norte-americanos”, finaliza.
Veja vídeo: Leo Gandelman fala sobre 'Ventos do norte':