Musica

DVD gravado no festival de Montreux traz a banda americana Stray Cats no auge da forma

Grupo se separou em 1984, tentou ressuscitar e acabou atropelado pelo bonde da história

Arthur G. Couto Duarte

Brian Setzer, vocalista do Stray Cats, causou sensação no underground londrino na década de 1980
Tomada em retrospectiva, a história do rock vem nos lembrar de que forma contundente e hegemônica alguns anos se viram subitamente arrebatados pelo surgimento de determinada banda ou artista solo. Como deixar de pensar em 2001 sem ser simultaneamente sobressaltado pela lembrança da explosão transcontinental desencadeada pelos Strokes? De que modo dissociar 1972 da invasão extraterrestre comandada por David “Ziggy Stardust” e suas aranhas de Marte? E 1977, com a anárquica irrupção do slogan “no future” alardeado pelos Sex Pistols? Ou a letal bomba de nêutrons batizada Nevermind que o Nirvana preparou para ser deflagrada em 1991?


Por analogia, impossível deixar de vincular 1981 à estratégia de guerra-relâmpago de que o trio norte-americano Stray Cats se valeu para tomar de assalto a Inglaterra. Adornados por volumosos topetes, tatuagens, sapatos de sola grossa, paletós drapeados e jaquetas de couro preto e zíperes, Brian Setzer (vocal, guitarra), Lee Rocker (contrabaixo acústico) e Slim Jim Phantom (bateria) deixaram a ilha nova-iorquina de Long Island para se entrincheirar no underground londrino e, de lá, comandar a revolução do neorrockabilly. Um subgênero marcado pelo mesmo espírito iconoclasta e atitude de rebeldia que, nos idos anos 1950, motivou a ascensão de ícones teen como Eddie Cochran, Gene Vincent, Johnny Burnette, Carl Perkins,Warren Smith, Charlie Feathers e Link Wray.

Elogios

Naquele ano, a investida dos “gatos vadios” resultou em casas de show abarrotadas por toda a Europa, um álbum e três singles cravados no intervalo de nove meses no topo das paradas de sucesso, além de elogios rasgados da parte de integrantes dos grupos Led Zeppelin, The Who e Rolling Stones. Não faltou sequer o efeito bumerangue que os arremessou de volta aos Estados Unidos a tempo de beneficiá-los pela exposição massiva de seus vídeos na então nascente MTV.

A “straycatsmania” ainda se estenderia por mais dois anos. Porém, a superexposição acabou por minar o poder avassalador da banda, levando-a a se dividir em duas facções: enquanto Setzer optava pela carreira solo, os demais se alinhavam com um ex-guitarrista da banda de apoio de David Bowie para fundar o power-trio Phantom, Rocker& (Earl) Slick. Como ambas investidas não deram em nada, os Stray Cats quiseram voltar atrás, reunindo-se de novo em 1986. Em vão, já que a mágica inicial havia se desvanecido no ar.

Para quem não teve o privilégio de ouvi-los no auge da forma ou ficou curioso com tal história, a chegada do DVD Stray Cats – Live at Montreux – 1981 ao Brasil vem mesmo a calhar. Transbordando carisma, técnica instrumental e energia, Setzer, Rocker e Phantom só precisam de alguns segundos para deixar o público literalmente de quatro.

Ao longo de 80 minutos, o velho rockabilly rejuvenesce a olhos vistos graças à fabulosa pressão imposta pelo trio. Milagre sônico manifesto não só durante a execução das autorais Rock this town, Runaway boys, Drink that bottle down, Storm the embassy e Rumble in Brighton, mas que adquire ares de completa veracidade quando, tomados de fúria e feeling, os Stray Cats releem clássicos do gênero como Be-bop-a-lula (Gene Vincent), Sweet love on my mind (Johnny Burnette), Ubangi stomp (Warren Smith) e Somethin’ else (Eddie Cochran).