Paulo Jr., baixista do Sepultura, fala sobre vontade de voltar a morar em BH

Músico avalia a fase atual da banda que saiu do Santa Tereza e revela que já pensou em largar a carreira

por João Renato Faria 20/11/2011 08:35

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Jackson Romanelli/EM/D.A Press
Paulo Jr. no Bolão: história da banda passa por Santa Tereza e hoje decora as paredes do bar mais conhecido do bairro (foto: Jackson Romanelli/EM/D.A Press)

 

Sentado em um bar de esquina no Bairro Santa Tereza, enquanto lembra fatos da história do Sepultura, o baixista Paulo Xisto Pinto Júnior é constantemente interrompido por pessoas que o cumprimentam e pedem notícias da família do músico. A reação é a mesma enquanto ele caminha pela Praça Duque de Caxias e entra no tradicional Bar do Bolão, onde discos de ouro e fotos do grupo adornam as paredes. Quem interrompe o músico são vizinhos e amigos, gente que viu o então Paulinho crescer e se juntar aos amigos e também moradores do bairro Max e Igor Cavalera para criar o Sepultura.



Esse contato quase íntimo, que só velhos conhecidos podem ter, mostra que, mesmo com quase 30 anos de carreira, milhões de discos vendidos e shows em todos os continentes, Paulo Jr. ainda faz questão de voltar a Belo Horizonte. “Gosto de estar perto do povo. É uma sensação sempre boa voltar para casa e recarregar as baterias. Gosto de queijo, café, cachaça, essas coisas de mineiro. Isso faz muita falta na estrada”, garante.

Estrada que, graças à rotina corrida da banda, é hoje a casa de Paulo. “Estou meio nômade, minhas coisas estão em um guarda-móveis, já que com as turnês não tem muito propósito manter um apartamento que vai ficar fechado”, descreve o músico. A correria também faz com que hoje ele esteja solteiro. “A vida que levo é difícil, é muita correria para conseguir manter um relacionamento. É complicado deixar uma pessoa em um lugar e viajar”, pondera. “Mas felizmente tenho conseguido vir mais BH, ver os amigos, a família, os jogos do Galo. É importante não se esquecer de onde você veio”, avalia.

E foi a própria história na estrada e a origem da banda em Belo Horizonte que inspiraram o Sepultura no disco mais recente, Kairos, lançado em junho. “É difícil falar dos seus filhos, mas no momento o disco que mais gosto da nossa carreira é esse. Cada um registra um momento da nossa vida para sempre, mas o Kairos ainda está sendo digerido e vamos trabalhar bastante em cima dele”, avisa.

Hoje, depois de várias mudanças na formação, Paulo é o último remanescente da formação que gravou os primeiros discos do Sepultura. A primeira baixa ocorreu em 1987, quando o guitarrista Jairo Guedz deu lugar a Andreas Kisser. Já a saída de Max Cavalera, que foi substituído por Derrick Green, foi bem mais traumática. O vocalista e guitarrista decidiu abandonar o grupo em 1996, depois de desentendimentos por causa da empresária, Gloria, que também era sua esposa. “Com a saída dele, a gente perdeu bastante coisa”, avalia Paulo. “Ficamos sem uma estrutura que demoramos anos para conquistar, sem empresário e sem a confiança da gravadora. A gente voltou para a estaca quase zero. Se eu, Andreas e Igor não tivéssemos nos unido, não só na parte musical mas também na irmandade, não teríamos segurado a bronca”, analisa. Já a saída de Igor Cavalera foi bem menos problemática e Paulo reclama que o antigo baterista está sumido. “Nós nunca brigamos, nunca batemos boca. Ele saiu na boa”, garante.

A falta dos irmãos fundadores fez com que o Sepultura passasse a conviver com constantes comparações com o passado. Mas para Paulo a melhor resposta que o grupo pode dar é no palco. “Nunca vamos conseguir agradar a todo mundo. Acho que somos a banda que mais toma pedrada dos fãs, mas estamos preparados para isso”, dispara. A mudança mais recente deixou Paulo como único mineiro da banda. Na segunda-feira, o grupo anunciou a saída do então substituto de Igor Cavalera, o baterista Jean Dolabella, nascido em Uberaba. Para seu lugar, foi confirmada a entrada do paulista Eloy Casagrande no comando das baquetas.

Giannini branco A verdade é que, se não fossem as mudanças de integrantes, Paulo não estaria no Sepultura, uma vez que a banda já existia como uma brincadeira de adolescentes quando foi apresentado aos irmãos Cavalera por um amigo em comum. Quando o primeiro baixista do grupo, Roberto Raffan, brigou e saiu do grupo, a escolha por Paulo acabou sendo natural. “Só entrei porque tinha um baixo Giannini branco, novinho”, recorda. Ele garante que ainda tem o baixo, bem guardado. “Não toco com ele na estrada, mas de vez em quando dou umas relembradas, é um instrumento de coleção, de relíquia”, conta.

Se no início as influência de Paulo nas quatro cordas eram grandes nomes da música pesada, como Gene Simmons, do Kiss, Steve Harris, do Iron Maiden, e Geezer Butler, do Black Sabbath, hoje ele garante que ficou bem mais abrangente. “Gosto muito do Geddy Lee, do Rush , Arthur Maia, Jaco Pastorius, Stanley Clark, gente desse calibre”, lista.

Paulo entrou para a banda depois que Max, Igor e o então vocalista Wagner Lamounier (que logo saiu para fundar o Sarcófago) já tinham agendado o que seria o show de estreia do Sepultura. A apresentação, no fim de 1984, coincidia com as férias escolares e a família de Paulo tradicionalmente passava o fim do ano em Montes Claros. “Como eu era menor de idade, não me deixaram ficar sozinho aqui. Eu bem que tentei, mas não deu. Meu primeiro show com a banda acabou sendo no festival Metal BH I, que rolou no Ideal Clube em 85”, desenterra.

Junto do baixista, veio um local para a banda ensaiar, já que os pais de Paulo não só apoiaram o filho como praticamente adotaram os jovens metaleiros. “O suporte dos pais foi uma das chaves do nosso sucesso. A gente tinha um quarto vazio e meus pais não só emprestaram o terreno, mas também o carro para levar equipamentos e davam almoço para todo mundo quando a gente ensaiava”, explica. Seu Paulo e dona Odete apoiaram inclusive a decisão do filho de largar os estudos e se dedicar à banda. “Tenho dois irmãos e uma irmã mais novos e todos estudaram. Se não fosse baixista, provavelmente seguiria meu pai, estudaria direito e seria advogado”, especula Paulo.

Sem uma educação formal, ele explica que acabou se formando na estrada, durante as longas turnês do Sepultura. “Me tornei quem sou na escola que a banda é. Vi e vivi muito mais coisas do que se estivesse atrás de uma carteira de escola, matérias como geografia e história. Entramos na Rússia, por exemplo, logo depois do fim da União Soviética e vimos de perto o racionamento de comida, o caos pelo fim do regime. Faltava tudo, só não faltava vodca”, diverte-se o músico.

Paulo se diverte também quando lembra que a única pretensão da banda era se apresentar na capital paulista. “Depois que gravamos o primeiro disco com a Cogumelo, nossa ideia era chegar a São Paulo, que era o grande mercado da época. Conseguimos ir para lá, e depois para o Rio de Janeiro, Nordeste, Sul, Manaus, Brasília. Foi quando vimos que a fama do Sepultura já era maior do que o Brasil e que tínhamos potencial para sair do país e fazer uma coisa maior”, destaca.

Com tanta oscilação ao longo da carreira, o baixista revela que já pensou em seguir os passos dos Cavaleras e deixar o Sepultura. “A última vez foi um mês atrás”, garante. “É uma coisa na qual penso, converso muito com minha família sobre o assunto. Banda é igual a casamento, você briga, tem problema, precisa resolver, mas tem que ter compromisso, amizade”, esclarece.

Aos 42 anos o antigo dono de uma vasta cabeleira negra exibe um tom grisalho na cabeça e na barba. “Será que o corpo aguenta mais alguns anos? Da minha parte, garanto o ciclo do Kairos e quando ele acabar a gente vê. A idade está chegando, as costas doem”, lamenta. “Mas quando subimos no palco a energia se renova e dá um gás para continuar”, garante. Os fãs, aliviados, agradecem.


NA PELADA
Atleticano fanático, o baixista comemora as chances que teve de jogar com craques como Reinaldo, Éder e Luisinho. Ele entrou em campo com os jogadores para uma série de partidas beneficentes, os Jogos das estrelas. “A ideia era juntar um monte de grandes jogadores que vimos atuar em campo, alguns artistas amigos, como a turma do Skank, e disputar uma partida”, conta. Realizados desde 1999, o ingresso para ver os jogos era um quilo de alimento, que depois era doado para instituições de caridade.


NO PARALELO
Apesar de o Sepultura ocupar o baixista em tempo integral, Paulo achou espaço na agenda para unir forças a músicos de outras bandas de Belo Horizonte no projeto The Unabomber Files. “Sou eu, o Alan Wallace e o André Márcio, do Eminence, e o Vladimir Korg do Chakal. Expliquei a eles que não poderia abrir mão do Sepultura e eles entenderam”, conta. Para Paulo,
tocar com outras pessoas ajuda a distrair da rotina com a banda principal.
“Dá uma arejada”, garante.

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