Com dois salários e o décimo terceiro de 2016 atrasados, o primeiro bailarino do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Felipe Moreira, se viu obrigado a recorrer a uma nova atividade para poder quitar dívidas e garantir o sustento de sua família, formada pela também bailarina Élida Brum e o filho Heitor Moreira, de 6 anos. Para garantir o sustento da casa, ele usa o carro emprestado pela mãe e atua como motorista do aplicativo Uber.
A crise financeira do estado do Rio de Janeiro começou a ser sentida pelos funcionários do Theatro Municipal do estado em meados do ano passado, quando o pagamento dos salários passou a sofrer atrasos de 10 a 20 dias. "Em janeiro, fevereiro deste ano, nós já tínhamos três meses de atraso. Foi o momento mais grave dessa crise para os funcionários do Theatro Municipal", disse Felipe Moreira.
O corpo de baile do local tem 105 bailarinos. Felipe disse que o seu caso é ainda mais grave porque duas pessoas da mesma família estão sem salários: "A gente não tinha de onde tirar dinheiro. O dinheiro não entrava de nenhuma maneira". Na impossibilidade de pagar as contas, o aluguel, o plano de saúde do filho, além de "fazer cortes", Moreira começou a procurar outro trabalho para poder sobreviver. Ele tentou dar aulas de balé clássico, de dança e trabalhar em outros lugares como bailarino, mas a crise financeira chegou a todo o Rio de Janeiro, o que limitou o mercado de trabalho: "Não tinha o que fazer. Minha última alternativa foi dirigir Uber".
Ele afirma que, apesar de ser um trabalho digno e muito bom, não é a sua profissão. O balé exige dedicação exclusiva e um tempo de oito a dez anos para formação profissional, afirma o artista. "Você sair daquilo que trabalhou durante muito tempo, estudou, prestou prova pública de cinco dias, trabalhou com afinco para poder crescer dentro de sua carreira e depois abdicar de tudo isso e fazer um trabalho paralelo que você não nasceu para aquilo, é muito difícil", comentou. A esposa de Moreira, Élida Brum, sobrevive graças a um brechó online. Segundo o primeiro bailarino do Theatro Municipal, os salários da categoria estão defasados. Por isso, os bailarinos mantêm atividades dentro da profissão, como complementação ao salário. Alguns dão aulas ou são convidados para dançar em outras companhias de balé.
Cultura
Apesar da situação grave, os bailarinos, de comum acordo com a direção do Theatro Municipal, decidiram não paralisar as atividades: "Entendemos que o Rio de Janeiro, mesmo em um momento de crise, não pode ficar sem cultura, sem o Municipal, porque o teatro não só é um cartão-postal do Rio de Janeiro, é referência em termos de balé, de dança, para o Brasil e a América Latina. Por isso, chegamos ao consenso que era melhor fazer um espetáculo, mesmo sem salário".