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Com o fim de Cora, termina também uma das tramas paralelas mais bizarras e surreais da teledramaturgia brasileira. A "novela" de Cora bem poderia se chamar 'Duas caras', trama assinada por Aguinaldo Silva e protagonizada por Marjorie Estiano em 2007.
A saga da vilã
Recapitulemos. Em novembro do ano passado, no auge de 'Império', Drica Moraes precisou se afastar das gravações. Labirintite foi a causa anunciada para seu afastamento. Drica chegou a retornar aos estúdios, mas, afônica, não conseguiu trabalhar. Repentinamente sem a intérprete da vilã, a poucos dias do momento da trama em que ela teria sua primeira noite com o Comendador, a Globo tomou a ousada decisão de escalar para o papel a intérprete da vilã na primeira fase da novela, sendo que a trama já havia dado um salto temporal de 30 anos. A troca de Drica, de 45 anos, por Marjorie, de 32, foi explicada com um sumiço misterioso no qual a megera ‘repaginou’ seu visual.
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No entanto, para uma história que se passa em pleno século 21 e no Rio de Janeiro, mesmo se tratando de ficção, não foi tão fácil para os telespectadores engolirem a mudança. Em seu blog oficial, o novelista comentou que ficou sem dormir por dois dias para solucionar a volta da vilã.
O jornalista e pesquisador Nilson Xavier, autor do 'Almanaque da telenovela brasileira', achou a solução do autor bastante criativa e condizente com o universo fantasioso de Aguinaldo. Xavier elogia o desempenho de Marjorie. “Gosto mais da Cora dela; é mais engraçada, mais louca. Acho que ela está excelente”, afirma.
Não deve ter sido nada fácil tomar uma decisão arriscada como aquela. Marjorie foi corajosa. Se mal recebida pelo público, a volta da atriz poderia grudar em sua carreira um selo negativo. No entanto, mesmo tendo a mesma idade na vida real de sua sobrinha, vivida por Leandra Leal – a principal queixa do público – Marjorie tornou crível a sua Cora.
Nas redes sociais, as brincadeiras pipocaram: ‘Quero o creme rejuvenescedor da Cora’ ou ‘Cora deve ter participado do filme 'Interespacial', já que, enquanto o mundo envelhece, os protagonistas do longa continuam jovens, à medida que viajam pelos planetas’. Inicialmente, o dramaturgo justificaria a troca por uma cirurgia plástica, mas desistiu dessa explicação, optando posteriormente por uma solução à la Aguinaldo Silva. A justificativa dada para o rejuvenescimento foi o uso de urina de jacaré.

Drica Moraes acabou não voltando mais à trama, apesar de ter declarado o contrário no Domingão do Faustão. Em mais um aval ao trabalho de Marjorie, Silva afirmou que em time que está dando certo não se mexe. “A troca, não por nossa vontade, mas por impossibilidade da atriz, já foi um risco altíssimo, um lance ousado que, graças a Deus, acabou dando certo. Mas eu concordo plenamente com o provérbio grego segundo o qual não se deve desafiar os deuses. A destroca é um desafio que não me sinto em condições de bancar. Portanto, Cora é Marjorie Estiano até o fim de 'Império' e o assunto está encerrado”, declarou na época.

A personagem foi crescendo, Marjorie mostrou cada vez mais o seu talento e conseguiu conquistar respeito da crítica, do público e dos colegas. Assim que terminou de escrever a cena da morte de Cora, com direito a um líquido verde (veneno) escorrendo de sua boca feito cobra, depois de lhe proporcionar a tão sonhada noite de amor com o Comendador, o novelista exaltou mais uma vez a atriz curitibana e deu um bilhete a ela: “Querida Marjorie Estiano: fico lhe devendo esta para o resto da minha vida. Não só porque você aceitou sem hesitar e sem pensar duas vezes uma missão impossível… Mas também porque mostrou, já na primeira cena que gravou nesta segunda fase de Cora, a grande atriz que é – enorme, generosa e totalmente entregue ao que faz. Quero você para sempre em minhas novelas. E lhe beijo as mãos. Obrigado mil vezes”.
E a intérprete de Cora retribuiu o agradecimento. “A novela foi muito marcante pra mim, desde o início. A gente se envolve muito com as questões da personagem e acho que a Cora ficou muito marcada na minha vida. Ele (Aguinaldo Silva) falou de estar agradecido, mas acho que na verdade é algo astral, que tinha que acontecer. Existe uma sincronia, uma combinação, sei lá de onde vem, que faz com que as coisas deem certo. Aguinaldo é um autor incrível, super-respeitado. Adoro o trabalho dele, fico muito feliz e me disponibilizo também para estar sempre trabalhando com ele”, devolveu.
Troca-troca na telinha
Não é de hoje que imprevistos acontecem em uma novela. Exemplos de atores que deixaram o elenco em razão de doença, desentendimentos e até morte são mais comuns do que se pensa, como lembra o jornalista e pesquisador Nilson Xavier, autor do 'Almanaque da telenovela brasileira'.

A atriz Djenane Machado viveu Bebel no primeiro ano do seriado 'A grande família' (a primeira versão, dos anos 1970), mas não quis continuar no programa. Foi substituída por Maria Cristina Nunes. Durante o episódio, a única alusão à substituição foi a fala irônica de um personagem que achou Bebel “um pouco diferente“.
Em 'O clone' (2001-2002), Débora Falabella ficou doente e sua irmã, Cynthia, também atriz e parecida com ela, entrou em seu lugar por alguns capítulos. Um dos casos mais traumáticos aconteceu na novela 'O primeiro amor', da Globo, em 1972, por conta do falecimento do ator Sérgio Cardoso, que vivia o protagonista da trama. Faltavam apenas 28 capítulos para a novela terminar, e ele acabou sendo substituído por Leonardo Villar. A troca foi feita com todo o elenco reunido no estúdio. Sérgio Cardoso aparecia saindo por uma porta em sua última aparição na novela. Depois, com a cena congelada no vídeo, um texto lido por Paulo José explicava o que acontecera e relembrava a trajetória do ator. Por fim, batia-se à porta e, quando a cena recomeçava, entrava Leonardo Villar, sendo recebido pelo elenco.