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Tesouros do quintal

Famosa plantadora de cacau do Pará participa de festival em Belo Horizonte

O chocolate artesanal de Dona Nena está presente nas receitas de restaurantes estrelados como o D.O.M., do chef Alex Atala, e Remanso do Bosque, de Thiago Castanho

Produzidos no quintal, iguaria chega a restaurante estrelados - Foto: Elivaldo Pamplona/Divulgação
Belém (PA)
– O barco deixa a capital paraense cruzando o Rio Guamá e 20 minutos depois atraca na Ilha do Combu, margeada pelos igarapés Combu e Periquitaquara e com um restaurante, logo na entrada, chamado Saldosa maloca – isso mesmo, “saldosa” certamente para combinar com a comida de sal. Nomes sonoros permeiam a paisagem amazônica, pródiga em biodiversidade e rica em culinária, com os sabores vindos da floresta, das águas abundantes e da criatividade do povo.
Nem é preciso caminhar muito para se chegar à casa de Izete Costa, conhecida como dona Nena, viúva, mãe de Patrícia, de 31 anos, e de Viviane, de 29. Simpática e receptiva, ela planta cacau no seu quintal e produz chocolate artesanal, presente nas receitas de restaurantes estrelados como o D.O.M., do chef Alex Atala, de São Paulo (SP), e Remanso do Bosque, de Thiago Castanho, em Belém. Os dois estão na lista dos 50 melhores restaurantes da América Latina, conforme ranking britânico. Peixes e carnes ganham o auxílio luxuoso da cobertura de chocolate e causam surpresa, um pouco antes de agradar em cheio a quem está à mesa.

Experiente e certa da importância do negócio familiar, dona Nena criou a marca Filha do Combu e está feliz da vida com o resultado. “Não sou fraca, não!”, dispara, enquanto caminha mostrando a propriedade de 14 hectares e de onde extrai o sustento e muito da alegria de viver.

Izete Costa, conhecida como dona Nena e sua filha patrícia - Foto: Elivaldo Pamplona/Divulgação
NO CAMINHO Participante do Festival Internacional do Chocolate e Cacau, recém-realizado em Belém, promovido pelo governo do Pará e parceiros, dona Nena estará neste fim de semana em Belo Horizonte de 3 e 4 deste mês para mostrar o chocolate com 100% de cacau, no Festival Fartura BH. Com certeza, fará sucesso com os brigadeiros robustos na forminha, cobertos de nibs (amêndoa de cacau seca e triturada) e aquele tipo de comer de colher. E quem sabe, de joelhos.

Mesmo com o dia quente e úmido, as boas-vindas nessa “casa das três mulheres” são dadas com um copo de chocolate quente, que, curiosamente, desce tão bem a ponto de o paladar pedir bis. Logo em seguida, a ribeirinha convida para conhecer a sua área de plantio e sombreada pelos pés de açaí, pupunha, cupuaçu e outras árvores típicas da região.

Tudo feito em casa

“No quintal, os pés de cacau ficam no meio das árvores, na sombra. Já plantei até chicória aqui, mas agora o chocolate comanda”, afirma. Com um gesto, ela segue em frente pelo terreno e vai apresentando seus tesouros. “Ainda temos abelha. A natureza aqui faz tudo e a gente trabalha. É preciso sempre deixar bem limpo”, acrescenta.

Depois de mostrar a área de produção, colher um cacau, abri-lo e oferecer as sementes brancas, dona Nena volta para casa e, na varanda, faz uma demonstração do seu processo. Os frutos são selecionados, lavados, “totalmente higienizados”, sendo, então, retiradas as sementes. A etapa seguinte é colocar as sementes na caixa-prensa (tipiti ou espremedor) para extrair o suco (mel do cacau), usado para licores, geleias, doces etc. Na sequência, deixar as sementes de três a quatro dias secando ao sol.

A próxima etapa será levar as sementes ao forno – na casa, o fogão é a gás – e deixar de 10 a 15 minutos. Finalmente, retirar as cascas e passar as amêndoas no moedor manual próprio de café, de onde vai saindo a massa uniforme e brilhante devido à manteiga do cacau.

VISITA O produto é posto à venda em barrinhas de 100 gramas, sem adicionar açúcar, e ainda cacau em pó e nibs, mas, artistas da cozinha, dona Nena e as filhas fazem doces deliciosos, como o brigadeiro (ver a receita). Há embalagens charmosas em caixinhas de papelão, com as barras embrulhadas na folha do cacaueiro. Como há colmeias na propriedade, a família pensa numa linha de chocolate e mel, bem natural.

Comercialmente, compensa? Vem a pergunta, que é respondida na hora por Patrícia, a filha mais velha de dona Nena. “O cacau é bom”, faz uma brincadeira com o antigo apelido de dinheiro. Para quem quiser conhecer a propriedade na Ilha do Combu, há pacote no valor de R$ 70, incluindo café da manhã e barco. Se o passeio for à tarde, é preciso negociar o preço. O telefone de contato é (91) 99616-0648.

POSIÇÃO O Pará é o segundo maior produtor de cacau do país – o primeiro é a Bahia (60%) –, com mais de 100 mil toneladas por ano, que representam quase 31% de toda safra nacional. A maior parte da produção (80%) no estado é proveniente de agricultores familiares, que contam com assistência técnica da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac). A área cultivada no Pará cresce 13% ao ano.

(*) O repórter viajou a convite da organização do Festival Internacional do Chocolate e Cacau Amazônia e Flor Pará 2015

Brigadeiros da dona Nena
(Para 20 unidades)

Ingredientes

2 latas de leite condensado 14 colheres de chocolate em pó Nibs (amêndoa de cacau seca e triturada) para cobrir

Modo de fazer

Levar ao fogo o leite condensado e o chocolate em pó. Mexer até dar o ponto. Deixar esfriar e enrolar na palma da mão, dando o formato de bolas. Passar no nibs e colocar nas forminhas.