Sua missão atual chama-se Sátira, bar na Savassi que terá cardápio dele e cervejas de fabricação própria. Recentemente, fez degustação das receitas para os proprietários e, pelo visto, os embates já começaram. “Existia demanda deles por hambúrgueres hipergourmets, o que derrubei pela demanda não ser tão grande e pelo custo. Gosto muito da ideia de um hambúrguer de pato, mas não sei se será possível”, conta. Entre suas sugestões, estão pratos com cervejas da casa no preparo, como o boeuf bourguignon com cerveja escura (em vez de vinho).
“É mais fácil abrir 10 salões de beleza do que um restaurante”, explica Castanheira. “Principalmente pela mão de obra. É ela que tenho de treinar para executar o cardápio. Essas pessoas ganham menos do que gostariam e ficam pouco tempo no restaurante. Entregar a ficha técnica para outro cozinheiro não significa que o padrão será o mesmo. Isso gera um problema gigante e a gente tem de voltar para dar novo treinamento aos novos funcionários.” O perfil de cliente mais difícil de lidar, continua, é o vaidoso, e um erro comum, cardápio grande.
Simplicidade O chef André Laborne, consultor dos mais conhecidos na cidade, concorda: “O pior cliente é o que acha que sabe tudo, que o melhor prato é o que não está no cardápio. Ele sempre acha que tem de ter dobradinha, carne de panela, sei lá. Cliente criterioso é outra coisa.” Às vezes, a solução está em medidas simples, como o nome do prato. Hoje, muitas casas servem panturrilha de porco (também chamada de jarret e stinco): ele resolveu chamar de cambito num dos bares a que atendeu (o Dorival) e, três anos depois, as vendas quadruplicaram.
Quase todos que o contratam nunca tiveram um restaurante. “Isso faz com que a gente chegue a dar sugestões de decoração. Chef acaba sendo um pouco psicólogo nessa atividade”, compara Laborne. Ansiosos, os clientes querem alardear a inauguração com faixas, panfletos e festa. A estratégia de Laborne é sempre oposta: “Falo para não fazer nada, apenas abrir. Aí, vamos ver o que precisa ser melhorado. Só depois chamamos imprensa, formadores de opinião”. Ele tem ajudado a abrir duas ou três casas por ano.
Bacalhau Um dos restaurantes portugueses mais tradicionais da cidade, o Verde Gaio foi fechado em 2013 e será reaberto em breve no Mercado Distrital do Cruzeiro. A família por trás do empreendimento é a mesma e contratou o chef Renato Quintino para auxiliar nessa nova fase. Ele já atuou nas casas Bodega 361, CCCP, Pizza Sur e no restaurante do Minas Tênis Clube 2, além de elaborar cartas de vinho para outros clientes. Na opinião dele, muitas casas deveriam ter um consultor.
“Tem muita gente que ainda acha que restaurante precisa só de projeto de arquitetura. Não dá para brincar. Num momento de crise como esse, o diletantismo acaba e só fica quem faz bom trabalho. Não é só comida, é preciso gestão. Mão de ferro para manter a qualidade da comida, serviço e tudo mais. BH evoluiu demais nos últimos 10 anos e o público acompanhou isso em termos de gastronomia”, resume Quintino.
Mesmo propondo apenas o que avalia estar em sintonia com a proposta da casa, às vezes é preciso recuar, e reconhecer isso pode ser um tanto desapontador. “A consultoria parte do que o cliente quer, não do que eu gosto. Há sobremesas maravilhosas, como a inglesa stick toffee pudding, que incluí num cardápio que tinha tudo a ver, mas algumas pessoas não gostaram e acabou não entrando. Uma pena.” Por essas e outras, ele sabe que o trato com proprietários e equipe é delicado e requer sempre tom de parceria.
Parece impossível, mas a chef Rosilene Campolina conseguiu. Contratada para elaborar o cardápio da cervejaria Uaimií, aberta ano passado, ela convenceu os proprietários da casa a não incluir entre as sobremesas o petit gâteau, aparentemente a sobremesa mais vendida da cidade. “Como eles também queriam apostar em identidade regional, por causa das cervejas, que são feitas em Minas, propus uma taça de chocolate com caramelo de cerveja stout”, conta ela.
Formada em relações públicas, depois é que Rosilene foi estudar gastronomia. Esse histórico a ajudou a ter uma visão mais ampla do trabalho de consultoria, de maneira a enxergar a comida como um dos pilares de sucesso de uma casa. “Há negócios que foram abertos porque a pessoa tinha dinheiro. É preciso ter tino comercial, pois a atividade é muito complexa. Envolve legislação e administração, além da comida. Aliás, a última etapa é a comida. Se não entender disso tudo, a pessoa pode contratar um bom cozinheiro que não dá certo”, afirma.
Moradora de Lourdes, Rosilene está habituada a ver bares e restaurantes fracassarem por ali. A questão do preço, acredita, é gritante: “Há quem abra querendo cobrar o preço do Vecchio Sogno, Trindade, Glouton. Não dá. Não é possível cobrar caro só porque está em Lourdes”. E aproveita para dar um conselho que muitos colegas assinam embaixo, mas que o mercado parece ainda não ter absorvido: “Cardápio grosso feito livro não é bom. Ninguém é bom em tudo. É preciso ter foco, até para poder investir”.
NA TELINHA
A figura do consultor gastronômico também está presente nos programas de TV. O mais interessante deles é The restaurant inspector, cuja última temporada (2012) ainda é reprisada no Channel 5: Fernando Peire, que dirige um restaurante em Londres, visita casas que estão quebrando e, frente a frente com os proprietários, dá conselhos preciosos e não poupa críticas duras. Na linha mais truculenta, o chef inglês Gordon Ramsay encarna o consultor em Kitchen nightmares (exibido pelo Fox Life) e chega a constranger os donos das casas que visita na tentativa de reerguê-las. Impiedoso, descobre lagostas mortas no tanque de um restaurante que deveria mantê-las vivas, por exemplo. Outra atração do tipo é Inspeção secreta, estrelada por Willie Degel (com suas câmeras escondidas) no TLC.