“Tem gente que não aceita que a massa venha al dente, acha que está crua. Sempre a experimentamos quando o cliente devolve e quase sempre ela está al dente, não crua, mas não adianta falar”
Henrique Passini, proprietário do Est! Est!! Est!!!
“Sair para comer é uma experiência – sentar, ser atendido de forma gentil por quem está ali para servir, ter uma oferta de produtos à disposição. Implorar para conseguir consumir é frustrante”
Adrina Poubel Lemos, advogada
“Procuramos trabalhar com ingredientes da nossa tradição. Fazemos uma alcatra serenada cujo processo de produção dobra o preço da carne. Aí a pessoa chega querendo churrasco”
Fernando Urbano, proprietário do Faz de Conta
“Como gosto de cozinha, na maioria das vezes como algo que eu consigo fazer em casa. Os preços estão exorbitantes e eu entendo que os custos dos restaurantes são altos, mas isso precisa ser revisto. Não existe nada excepcional na cidade”
Leonardo Augusto de Andrade, administrador
saiba mais
Resenha Botecar 2015 reúne bares e atrações musicais no Parque das Mangabeiras
Bolos de casamento bonitos, mas acima de tudo deliciosos, são marca de confeiteira
Festival Comida di Buteco divulga os bares vencedores deste ano
'Harmonize' propõe experiências inusitadas no Mercado do Cruzeiro
Edifício Maletta atrai pela diversidade: lojas, sebos e noite agitada
Algumas vezes, o embate se deve a uma questão de ponto de vista – o que torna tudo mais difícil. Como resolver o impasse que Henrique Passini costuma enfrentar no seu restaurante italiano, o Est! Est!! Est!!!, no Funcionários, em relação ao ponto de cozimento da massa, por exemplo? “Tem gente que não aceita que ela venha al dente, acha que está crua. Sempre a experimentamos quando o cliente devolve e quase sempre ela está al dente, não crua, mas não adianta falar. Explicamos que a massa perde a qualidade. Já cedemos algumas vezes, como para idosos, mas não faz sentido. Normalmente, não cedemos. Somos radicais”, defende ele.
Para Passini, o cliente nem sempre tem razão. Na defesa do cânone italiano, já se envolveu em discussões acaloradas nas redes sociais. “Não misturamos massa com carne. Tem gente que fala que está pagando e por isso quer comer desse jeito. Algumas vezes, as pessoas enganam a gente ao pedir pratos extras para dividir na mesa. Quando percebemos, tentamos evitar”, relata. Isso para não falar dos fregueses que chegam depois do horário marcado na reserva ou mesmo dos que se irritam com a fila de espera sem ter reservado mesa.
Numa situação mais ou menos parecida, o advogado Marcelo Brandão, de 42 anos, que frequenta bares e restaurantes da cidade nada menos que quatro vezes por semana, se irritou bastante. Sem ter ligado para garantir lugar, chegou bem cedo a um dos mais badalados restaurantes de BH. Na verdade, ficou esperando a casa abrir e foi o primeiro a entrar, mas, para sua surpresa, foi difícil arranjar mesa. “Disseram que não havia nenhuma mesa livre, que só trabalhavam com reserva. Não havia evento lá e só a partir das 20h30 é que o salão encheu.”
Ele acredita que parte das mesas deveria ser mantida livre para quem chega sem reserva e considera o atendimento o ponto fraco das casas da cidade. “O garçom daqui não tem a cortesia habitual de uma cidade turística, como no Rio de Janeiro”, critica. Semana passada, num restaurante especializado em carnes, pagou R$ 93 por 300g de contrafilé e não ficou feliz por isso. “Perguntei a procedência da carne, e o garçom disse apenas que era argentina, sem mencionar que era da raça angus, mais cara. Por ser uma carne específica, deveria ter me avisado antes. Reclamei, e ele disse que não fala os preços porque acha deselegante”, conta.
SUSHI O preço, sempre ele. Amedronta a freguesia e é o responsável por tornar a operação de um restaurante cara e arriscada. Além disso, cria situações delicadas. “Outro dia, uma pessoa me disse que minha comida é muito simples e deveria custar mais barato. Meu escondidinho dá mais trabalho que o suflê do Taste-Vin. As pessoas acham que a comida mineira é barata e fácil de fazer. Reclamar que é caro é justo, mas o freguês desconhecer o que é servido no restaurante que vai comer é muito desagadável”, afirma Fernando Urbano, proprietário do restaurante mineiro Faz de Conta, em Nova Lima.
A casa funciona com sistema de bufê livre (come-se à vontade por preço fixo) e, por isso, muitas pessoas a comparam com restaurantes self service, nos quais a oferta de comida costuma ir da feijoada ao sushi. Há quem entre ali, relata ele, querendo salmão, petit gâteau e se decepcionando por não encontrar comida japonesa no meio da salada. “Procuramos trabalhar com ingredientes da nossa tradição. Fazemos uma alcatra serenada cujo processo de produção dobra o preço da carne. Aí a pessoa chega querendo churrasco”, reclama ele.
Certos hábitos da clientela vão determinando mudanças no atendimento da casa. Reservas, por exemplo, já não são mais aceitas aos domingos (dia mais movimentado), pois, além de atrasos, verificou-se por lá que a clientela segurava mesas vazias por longos períodos até que todos os convidados chegassem. Paralelamente, Urbano ouve pedidos de descontos para pessoas que comeriam pouco por ter feito cirurgia bariátrica (há projeto de lei a respeito no Senado) e de isenção total para crianças (que comem, geram demandas extras na cozinha e são a razão da contratação de monitores infantis).
PREÇOS A alta dos preços tem contribuído para que a advogada Adrina Poubel Lemos, de 35, saia para comer menos que antes. Mesmo assim, o que mais a incomoda atualmente é o serviço. “Sair para comer é uma experiência – sentar, ser atendido de forma gentil por quem está ali para servir, ter uma oferta de produtos à disposição. Implorar para conseguir consumir é frustrante”, justifica. Recentemente, numa hamburgueria da cidade, chateou-se não por pagar R$ 20 num chope (“era bom”, conta), mas por não lhe terem oferecido o segundo.
“A falta de proatividade do garçom dá preguiça de ir a certos lugares”, afirma ela, que já se apressou para terminar de comer depois de os garçons de um restaurante terem sentado praticamente ao lado de sua mesa para bater papo e fumar. Em geral, avalia, os restaurantes da cidade dimensionam incorretamente (para menos) o tamanho das equipes de salão. O ideal, acrescenta, é que o serviço “não seja invasivo e não pareça um favor”.
No restaurante italiano Villa Roberti, no Belvedere, a pedra no sapato são as mudanças de ingrediente nos pratos. “Metade dos pedidos tem alguma alteração”, conta Daniel Roberti, um dos proprietários. “Para o cliente é muito fácil, pois sempre há uma justificativa. Só que ninguém pensa no que a gente precisa fazer para poder modificar uma receita. Como temos operações bem definidas, tenho de parar o restante dos pedidos todos para fazer o que sai do padrão. O cozinheiro para tudo para produzir só aquele prato”, completa.
EQUILÍBRIO Na opinião dele, esses pedidos comprometem o equilíbrio de sabores pensado pelo chef e, não raro, o cliente que solicitou a mudança não gosta do resultado final que ele mesmo pediu. Para se ter ideia, virou piada interna por lá o mais inusitado pedido recebido pela cozinha: uma omelete com presunto cru. “Falar não para os belo-horizontinos é complicado, ficam bem irritados”, desabafa ele.
Se é preciso confiar no trabalho do chef, então, como lidar com a expectativa? Isso ajudou a comprometer a experiência que o administrador Leonardo Augusto de Andrade, de 41, teve num conceituado restaurante da capital mineira. Ele costuma jantar fora duas vezes por mês e essa a que ele se refere não deixou saudades. “A carne era cozida em baixa temperatura por oito horas e tudo mais, mas estava dura e com sabor OK. Esperava algo desmanchando e tive de me esforçar para partir com a faca. Hoje, é difícil encontrar um restaurante que seja unânime”, diz ele, que frequenta cursos de culinária.
A qualidade da comida em relação ao preço cobrado é o que mais o incomoda atualmente. “Como gosto de cozinha, na maioria das vezes como algo que eu consigo fazer em casa. Os preços estão exorbitante e eu entendo que os custos dos restaurantes são altos, mas isso precisa ser revisto. Não existe nada excepcional na cidade. Aliás, excepcional se refere a boa comida e não está ligado a preço ou localização. Chef que põe a mão na massa faz a diferença, para além do requinte e do nome da casa. Ele garante qualidade e padrão”, opina.