Se o destaque no momento é o que vai no prato, o que ocorre em torno da mesa continua sendo elemento fundamental para a formação da chamada cultura de bar. As conversas que rolam ali podem até não ter status de alta cultura, mas não há como desprezar o quanto há de filosofia cotidiana, psicologia amiga e até poetas bissextos que surgem em conversas de botequim. O Estado de Minas ouviu profissionais do ramo para saber o que aprenderam botecando.
“Já teve um chá de fraldas em que a futura mamãe ficou aqui até 10 da noite e, duas horas depois, a criança nasceu”, conta. Pedidos de casamento também foram vários e, claro, inúmeras dores de cotovelo derramadas.
OUVIDO A cantora Kênya Cantuária que o diga. Aos 43 anos de idade, são 22 como cantora de bar. Com a prática, aprendeu que o comportamento humano é repetitivo. Na pausa da música, por exemplo, é aquela hora que a figura chega para conversar. “Puxa conversa sobre o repertório e começa a contar a vida dela. Você fica sabendo de tudo. Acaba sendo um ouvinte. A vida no bar é muito interessante”, diz.
Kênya fez trilha para comemorações diversas e despertou muitas lembranças. “Tinha um cliente de Piedade do Paraopeba que não podia me escutar cantar que morria de chorar. Falava que se lembrava do pai, da mãe”, conta. Para ela, o que há de mais rico nos bares são as formas de encontro que ele proporciona. “As pessoas estão ali para curtir a música numa boa, ter proximidade com os outros. Estamos na cidade dos botecos. Essa é a nossa cultura”, avalia.
O administrador Cláudio Marques, mais conhecido como Cláudio Vovó, tem a mesa de bar como espécie de lugar sagrado. Toda segunda-feira, por exemplo, é santa num dos tradicionais botecos da cidade, para ele e os amigos que se conheceram no Colégio Arnaldo, na década de 1970.
“Essa filosofia de boteco vai moldando a gente. Nós nos encontramos para casos tristes, alegres. Acabamos nos tornando confidentes de alguma coisa que vai mudando a vida. Às vezes, tem gente que chega desanimado e se abre ali”, conta. A turma, com média de 12 pessoas, já experimentou outros botequins, mas há quatro anos fixou os encontros num só. “Toda segunda. Faça chuva ou faça sol.”
CARAVANA A turma do especialista em logística Leonardo Ferreira não é adepta a estabelecimento único e tem por hábito frequentar regionais diferentes. Durante esta temporada dos festivais, pelo quinto ano consecutivo, Leonardo organiza a Caravana Etílica. O projeto começou como uma brincadeira de amigos e hoje é aberto a quem quiser se aventurar em conhecer o cardápio de 12 bares diferentes por sábado.
“Acho que o bar é lugar de encontros. Às vezes, tem muito tempo que não nos encontramos e é a oportunidade para conversar, colocar o papo em dia e dar um pique a mais na amizade”, afirma. Claro que é momento de brincadeiras também. Ano passado, a galera anunciava a chegada nos botecos pelo microfone e já entrava fazendo festa. “Bar tem que ter astral. Tudo junto e misturado”, sintetiza Olívio Cardoso Filho.
RAIO X FESTIVAIS
Botecar
Belo Horizonte
Desde 2014
De hoje a 9 de maio
55 bares
Comida di Buteco
20 cidades
Desde 1999
De sexta a 10 de maio
45 bares