Clichês, incompreensão e uma multiplicidade de questões complexas fizeram com que as artistas ouvidas nesta reportagem tivessem prudência na hora de responder a uma pergunta: o que há para comemorar no Dia Internacional da Mulher?.
Mas, passada a desconfiança, todas responderam que há, sim, motivos para celebrar a data.
ANNA MUYLAERT
cineasta
O ano de 2015 foi produtivo no sentido de uma maior consciência do papel e da posição das mulheres na sociedade. Movimentos como Meu amigo secreto, Primeiro assédio, Agora é que são elas, entre outros, deram visibilidade à discussão sobre os mecanismos sutis, invisíveis do machismo, o que é importante para desarmá-los. A mulher, e não só no Brasil, já não está suportando mais o sexismo.
Ter experiência, capacidade e não ganhar um cargo de chefia por ser mulher é humilhante. Discute-se o fato de a maioria dos protagonistas dos filmes e dos diretores ser homens. Não queremos só acesso ao mercado, mas o crédito, o reconhecimento pelo que fazemos.
NOEMI JAFFE
escritora
Nada revolucionário, mas pequenas mudanças no bom sentido, vários avanços. As propostas de Eduardo Cunha no sentido de proibir as mulheres estupradas de recorrer ao SUS e contra o aborto fizeram com que se criasse coalizão de mulheres com vários perfis.
LAERTE COUTINHO
chargista
Nem toda comemoração é festa e triunfos. Às vezes, é só um dia que celebra a força, a consciência, a luta. Na minha modesta opinião, o Dia Internacional da Mulher não é um tesouro só das mulheres, mas da humanidade. A luta feminista, que é pela libertação de uma cultura que é opressiva também para os homens, produziu muitos resultados e conquistas para a humanidade inteira.Acho, inclusive, que os homens deveriam pensar sobre isso, colher frutos disso. O dia 8 de março é festa da consciência crítica, de reflexão sobre vitórias, derrotas, dificuldades para avançar. Para mim, tem sentido amplo.
ALINE CALIXTO
cantora
Temos muita coisa para comemorar, sim. Uma delas é a força que tem tomado a voz das mulheres. O coro engrossou e não está passando mais despercebido, mais mulheres estão tendo consciência do seu papel na sociedade. Estamos conseguindo colocar nossas pautas.
ANA MARTINS MARQUES
poetisa e doutora em literatura
As conquistas históricas, como o direito ao voto, à igualdade jurídica, à educação, ao divórcio, à licença-maternidade, não foram obtidas sem luta. O sucesso do Bolsa-Família, que elege as mulheres como responsáveis preferenciais do benefício, e do Minha casa, minha vida, em que a titularidade dos imóveis é dada preferencialmente às mulheres, contribuem para promover a emancipação, a dignidade e a cidadania das mulheres.
Acho importante a resposta rápida, assertiva e alegre de mulheres, organizadas ou não em entidades e movimentos sociais, às tentativas capitaneadas pelo deputado Eduardo Cunha de tornar ainda mais restritiva, cruel e ofensiva à autonomia das mulheres a já incrivelmente ultrapassada legislação nacional sobre o aborto. Cada vez mais meninas se reconhecem como feministas a partir de encontros, conversas e a possibilidade de organização aberta pelas redes sociais.
No meio literário, há preocupação com o modo como questões de gênero interferem na visibilidade conferida a um livro ou autor e tentativas de resgatar e promover a literatura escrita por mulheres por movimentos como o Leia Mulheres.
TALITA BRAGA
atriz e fundadora do Cia. Zula de Teatro
Estamos ganhando espaços de expressão para falar da nossa falta de espaço para falar como mulher, profissional, para poder pensar se o nosso destino é mesmo só casar e ser mãe. No cinema, há uma explosão de filmes sobre essas questões. As questões de gênero são muito trabalhadas no teatro, blogueiras ativistas estão formando redes e fazendo a informação circular mais rápido.
Estão se fortalecendo espaços de voz da mulher.
CLARA LIMA
rapper
A facilidade de ir e vir, poder escolher o que fazer, falar como eu quiser, ir aonde quero ir. Para conseguir isso, para ter acesso a essas coisas, lugares e posições, muitas meninas passaram perrengue, passaram apertado. Unindo, nos fortificamos. Acho importante lembrar que qualquer causa que junta pessoas em torno da ideia do certo pelo certo, como é a luta das mulheres, tem resultados muito positivos. Não podemos dizer que atualmente não há obstáculos, preconceitos, limites, mas hoje as coisas estão mais fáceis. Ou melhor, menos difíceis..