Tem novidades no mundo editorial: a multiplicação de microeditoras que vêm oferecendo ao público todo tipo de material gráfico, de pôsteres até ímãs de geladeira, passando por gravuras, fanzines etc. E ainda um produto precioso: livros de artista ou artesanais. São publicações experimentais, do ponto de vista de forma, conteúdo, materiais e processos de realização. Pura celebração de liberdade irrestrita de criação e respeito pelo livro. Os preços, no geral entre R$ 15 e R$ 150, democratizam o acesso à arte sofisticada, que começa a ganhar acervos em bibliotecas de colecionadores.
A gráfica contemporânea vai ser vista nesta sexta-feira, das 10h às 15h, no ateliê Espai, com o lançamento do livro Trivial, dos artistas Bruno Rios, Narowe e Ricardo Reis, projeto que contou com apoio, inclusive, da extinta Cosac Naify. No sábado, das 13h às 20h, em pequena feira na Casa Ateliê, mostram trabalhos as editoras Pipoca Press (RJ), A Bolha (RJ), Feira Plana (SP), Entrecampo (BH), A Zica (BH), Prumo (BH), Criatura (RJ), Quartoamado (BH), Pequod (BH), Edições Andante, Julia Panadés, Tipografia do Zé, revista Nuvem entre outras.
Quem, desde 2009, vem formando coleção de livros de artistas é a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Está no quarto andar da Biblioteca Central o acervo com cerca de 400 livros de artista. O curador é Amir Brito Cador, editor, professor de artes gráficas, colecionador e autor de livros de artista. O objetivo da empreitada, como ele explica, é reunir material que, normalmente, fica disperso em vários setores das bibliotecas, até pela falta de uma categoria para catalogá-los, oferecendo ao público e estudiosos acesso a publicações que instigam a pensar o livro e as transformações dele.Cador conta que o nome para definir os trabalhos e em que contexto situar as obras ainda oscila. Estudiosos franceses chamam esse tipo de trabalho de livros ilustrados e veem nas peças face contemporânea de antigas tradições do livro ou da história dele.
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“O livro de artista é um gênero da produção contemporânea de artes visuais que surge a partir dos anos 1960, apesar de ter tido vários precursores”, explica Cador.
Entre eles, destaca um brasileiro ilustre: o poeta cuiabano Wladinir Dias Pino. É dele o livro Ave, lançado em 1956, criado com pranchas transparentes, furadas, gráficos, textos etc.
É só uma das criações do que o escritor chamaria, em 1967, de poema-processo, movimento que argumentava a favor da criação de poemas com todos os tipos de signos, sistemas e códigos (e não só com palavras).
A consideração pelo livro na cena contemporânea tem motivos. “Valorizando o livro, processos artesanais, combate-se suposto desinteresse pelo livro tradicional. E, no caso dos artistas jovens, as publicações têm sido uma forma de colocar o trabalho para circular sem depender de museus, galerias, críticos ou intermediários”, explica. A distribuição dos trabalhos é feita nas chamadas feiras gráficas. A mais famosa delas é a Plana (SP). Na capital mineira existe, entre outras, a Feira Gráfica de Belo Horizonte e a Faísca – Mercado Gráfico, no BDMG Cultural.
Já existem galerias (como a Vermelho, de São Paulo) que têm banca permanente e feira dedicada aos livros de artista. O endereço mais famoso da área é a livraria nova-iorquina Printted Matter, criada em 1976 por grupo de artistas, que tem acervo com cerca de 20 mil obras. A primeira reunião das publicações numa coleção foi feita pelo Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York nos anos 1970.
VERSÕES
Trivial, dos artistas Bruno Rios, Narowe e Ricardo Reis, tem duas versões: uma especial, com 150 números, com inserção de várias peças gráficas (cartaz, minirrevista etc.), que vai custar
R$ 50. Outra, só o livro, com 500 exemplares, que custa R$ 30. Trata-se, explica Bruno Rios, de livro de imagens, realizado em conjunto pelo trio de autores, “olhando para a rua”, observa. “É trabalho que registra convivência com o contexto urbano, o trânsito, a publicidade, a movimentação da cidade”, conta. “É mais trabalho de arte do que meio de comunicação, experiência em si descomprometida com mensagem”, explica.
De acordo com Bruno Rios, Trivial não conta uma história. Volta-se, de fato, para exploração de ritmo de leitura construído com a diagramação, diferentes papéis, enfatizando a materialidade do livro. “Livro é democrático. Por não ser peça única, como quadro, está sempre rodando”, acrescenta, justificando a escolha do meio para realizar o trabalho, produto de residência artística em São Paulo.
GRÁFICA
O designer Flávio Vignoli lança, na Feira Gráfica de Belo Horizonte, Esquecimentos. Vai mostrar ainda Pareidolia tipográfica, parceria com Roberto Marques. O primeiro trabalho traz experimentos gráficos; o segundo, “gravuras tipográficas”. Ambos são edições da Tipografia do Zé, que ele criou em 2008, para desenvolver livros artesanais. “Feiras são hoje os locais de inovação e invenção da cultura gráfica”, afirma, explicando que nelas se vê grande variedade de produtos, formas e conteúdos.
Flávio Vignoli aponta o aspecto positivo das feiras por serem espaços de divulgação para o trabalho independente, ‘‘já que livrarias não têm interesse nem entendem o que fazemos”. “Falta calendário mais organizado. Às vezes, tem várias e, em outros momentos, nenhuma”, avisa. Também defende feira “nem tão pequena nem tão grande”, de forma a permitir maior fruição dos trabalhos. “São livros para se ver com tempo”, recomenda.
• Lançamento do livro Trivial, dos artistas Bruno Rios, Narowe e Ricardo Reis.
Hoje, das 10h às 15h. Espai, Rua Tenente Anastácio de Moura, 683, Santa Efigênia.
• Feira Gráfica de BH (Flagra), publicações independentes (livros de artista e artesanais, fanzines, pôsteres, gravuras, revistas etc.).
Amanhã, das 13h às 20h. Casa Ateliê, Rua Gonçalves Dias, 3.182, Barro Preto. Entrada franca.