“Os moleque têm sede. De saber. Descobrir. Conhecer. De sorrir. Envolver. Intervir. Interver. Saber ir. Saber vir. Saber ler. E saber. Que pode contar com você. Mas… devagar! Escola!” Dessa forma, quase sem fôlego, num ritmo desenfreado, intenso e surpreendente, o mineiro João Paiva representou o Brasil com sua criação mais popular na competição internacional de poetry slam em Paris, no ano passado.
Muito popular nos Estados Unidos e ainda pouco conhecida no Brasil, a modalidade explora a arte da poesia falada. Cada participante tem três minutos para defender um poema autoral, fazendo uso apenas da própria voz. E sim, isso pode ser incrível!
João, que é professor de educação física e rapper no grupo IP420, é um dos convidados do II Rio Poetry Slam, uma das atrações da Festa Literária das Periferias (Flupp), que será realizada entre 3 e 8 de novembro, no Rio de Janeiro. Ele marcará presença também em mais uma etapa da disputa estadual dia 22, no Teatro Espanca!.
Competição
Desde 2013, João frequenta saraus na periferia de Belo Horizonte. Foi nesses espaços que ele conheceu Eduardo DW e Rogério Coelho, responsáveis pelo Coletivoz, no Barreiro. Juntos, por meio do diálogo com outros agentes culturais de São Paulo, eles descobriram a “batalha da poesia falada” e criaram o primeiro grupo de BH – o Slam Clube da Luta (https://goo.gl/btLBSc). A competição inaugural em BH foi realizada em setembro de 2014, no Teatro Espanca!. “A gente conheceu fazendo”, resume João.
Para João, criar suas próprias poesias é algo bem natural, não existe um ritual. “Eu já escrevia desde os 17. Tenho 25. Mas ensaio muito, me tranco no quarto e fico falando. Aos poucos, surgem as interpretações”, revela. Questões que o incomodam dão o tom de seus versos. Seu poema preferido se chama Torre de Babel e critica a onda de ostentação no rap.
João acredita que a grande diferença entre o sarau e o slam é que neste último há um silêncio absoluto. As atenções estão totalmente voltadas para o poeta. “Por mais que a competição seja um detalhe, o jogo dá uma adrenalina maior. Não tem como negar: influencia de alguma forma”, complementa.
Eduardo DW, um dos organizadores do Slam Clube da Luta, MC e poeta, resume de maneira divertida essa diferença: “O sarau é o dia a dia, e o slam é a festa”. Ele ressalta que é comum os slammers retratarem a periferia em suas letras por pertencerem a esse lugar tanto no aspecto da geografia quanto no do pensamento. “A academia não trabalha essa arte. É uma fala marginal, por não estar no mainstream”, explica.
Em Sarzedo
Fabricio Tadeu de Paula, arte-educador de 31 anos, conhecido como Bim Oyoko, participa das batalhas de slam em BH e resolveu levar a poesia falada para as salas de aula em Sarzedo, onde mora. Assim, na Escola Estadual José Pereira dos Santos, nasceu o segundo grupo de Minas Gerais: o Slam Zé Pereira.
A instituição estava de portas abertas para o sarau de poesia, e a ideia inicial de Bim era apresentar textos prontos nas oficinas. O primeiro foi A vida é loka, de Sérgio Vaz. Em conversa com as turmas, o tema “liberdade de expressão” surgiu como uma urgência. Dessa oportunidade, ele apresentou a proposta aos jovens de criarem suas poesias e apresentarem entre si numa competição entre as salas.
A experiência transformou a visão dos adolescentes ao apresentá-los à poesia marginal. “Cerca de 90% deles diziam que não gostavam de poesia”, lembra Bim. O arte-educador tem o ousado plano de criar um campeonato estadual de slam entre as escolas de Minas Gerais. “Tem muita joia rara escondida que a gente não vê e vai passando”, ressalta.
Pioneira no Brasil
Roberta Estrela D’Alva, de 37 anos, atriz, MC e slammer, será mais uma vez a curadora e slam master do II Rio Poetry Slam. Considerada o nome mais importante da cena de slam no Brasil, ela foi responsável pelo convite ao mineiro João Paiva para participar do evento. “A performance dele em São Paulo foi arrebatadora”, justifica.
O evento, para ela, tem uma proposta ousada e já revolucionária em si por ser um contraponto à Flip, a Festa Literária Internacional de Paraty. “É sempre no seio de comunidades e traz autores de alto nível do mundo inteiro. Não deixa nada a desejar”, diz.
O último poema escrito por Roberta foi feito para a música Afoxé do mangue, do disco da cantora Ellen Oléria, e fala do levante da consciência negra. “Hoje em dia, as coisas não passam batidas. Embora não tenha uma política de reparação eficiente, há um posicionamento assertivo da comunidade negra.”
Roberta estima que existam atualmente no Brasil cerca de 20 slams, sendo ao menos 11 em São Paulo, entre eles, o da Guilhermina e do 13. “A perspectiva é expandir. Não paga copyright”, brinca. Para a MC, a modalidade tem tudo a ver com o Brasil, com uma tradição oral muito forte: “Um país que teve ditadura, escravidão e precisa passar muita coisa a limpo. As pessoas precisam ser ouvidas. Exercer política sem ser da forma tradicional, de forma dinâmica e poética, é maravilhoso”.
Saiba mais
As regras
Também conhecido como spoken word, o poetry slam nasceu em 1984 em uma escola de Chicaco (EUA) com Marc Smith. Pelas regras do circuito mundial, o poema deve ser de autoria própria. O tema é livre. O participante não pode usar acessórios, figurino ou acompanhamento musical. Cada poesia deve ter no máximo 3 minutos. A cada 10 segundos excedidos, são descontados alguns décimos da nota. O júri é formado por cinco pessoas escolhidas na hora. As notas vão de 0 a 10. A mais alta e a mais baixa são descartadas. Nos EUA, é comum a venda de livros de “autoajuda do slam”, ensinando as técnicas de sucesso. Em São Paulo, existe o menor slam do mundo: de apenas 10 segundos.
Muito popular nos Estados Unidos e ainda pouco conhecida no Brasil, a modalidade explora a arte da poesia falada. Cada participante tem três minutos para defender um poema autoral, fazendo uso apenas da própria voz. E sim, isso pode ser incrível!
João, que é professor de educação física e rapper no grupo IP420, é um dos convidados do II Rio Poetry Slam, uma das atrações da Festa Literária das Periferias (Flupp), que será realizada entre 3 e 8 de novembro, no Rio de Janeiro. Ele marcará presença também em mais uma etapa da disputa estadual dia 22, no Teatro Espanca!.
Competição
Desde 2013, João frequenta saraus na periferia de Belo Horizonte. Foi nesses espaços que ele conheceu Eduardo DW e Rogério Coelho, responsáveis pelo Coletivoz, no Barreiro. Juntos, por meio do diálogo com outros agentes culturais de São Paulo, eles descobriram a “batalha da poesia falada” e criaram o primeiro grupo de BH – o Slam Clube da Luta (https://goo.gl/btLBSc). A competição inaugural em BH foi realizada em setembro de 2014, no Teatro Espanca!. “A gente conheceu fazendo”, resume João.
Para João, criar suas próprias poesias é algo bem natural, não existe um ritual. “Eu já escrevia desde os 17. Tenho 25. Mas ensaio muito, me tranco no quarto e fico falando. Aos poucos, surgem as interpretações”, revela. Questões que o incomodam dão o tom de seus versos. Seu poema preferido se chama Torre de Babel e critica a onda de ostentação no rap.
João acredita que a grande diferença entre o sarau e o slam é que neste último há um silêncio absoluto. As atenções estão totalmente voltadas para o poeta. “Por mais que a competição seja um detalhe, o jogo dá uma adrenalina maior. Não tem como negar: influencia de alguma forma”, complementa.
Eduardo DW, um dos organizadores do Slam Clube da Luta, MC e poeta, resume de maneira divertida essa diferença: “O sarau é o dia a dia, e o slam é a festa”. Ele ressalta que é comum os slammers retratarem a periferia em suas letras por pertencerem a esse lugar tanto no aspecto da geografia quanto no do pensamento. “A academia não trabalha essa arte. É uma fala marginal, por não estar no mainstream”, explica.
Em Sarzedo
Fabricio Tadeu de Paula, arte-educador de 31 anos, conhecido como Bim Oyoko, participa das batalhas de slam em BH e resolveu levar a poesia falada para as salas de aula em Sarzedo, onde mora. Assim, na Escola Estadual José Pereira dos Santos, nasceu o segundo grupo de Minas Gerais: o Slam Zé Pereira.
A instituição estava de portas abertas para o sarau de poesia, e a ideia inicial de Bim era apresentar textos prontos nas oficinas. O primeiro foi A vida é loka, de Sérgio Vaz. Em conversa com as turmas, o tema “liberdade de expressão” surgiu como uma urgência. Dessa oportunidade, ele apresentou a proposta aos jovens de criarem suas poesias e apresentarem entre si numa competição entre as salas.
A experiência transformou a visão dos adolescentes ao apresentá-los à poesia marginal. “Cerca de 90% deles diziam que não gostavam de poesia”, lembra Bim. O arte-educador tem o ousado plano de criar um campeonato estadual de slam entre as escolas de Minas Gerais. “Tem muita joia rara escondida que a gente não vê e vai passando”, ressalta.
Pioneira no Brasil
Roberta Estrela D’Alva, de 37 anos, atriz, MC e slammer, será mais uma vez a curadora e slam master do II Rio Poetry Slam. Considerada o nome mais importante da cena de slam no Brasil, ela foi responsável pelo convite ao mineiro João Paiva para participar do evento. “A performance dele em São Paulo foi arrebatadora”, justifica.
O evento, para ela, tem uma proposta ousada e já revolucionária em si por ser um contraponto à Flip, a Festa Literária Internacional de Paraty. “É sempre no seio de comunidades e traz autores de alto nível do mundo inteiro. Não deixa nada a desejar”, diz.
O último poema escrito por Roberta foi feito para a música Afoxé do mangue, do disco da cantora Ellen Oléria, e fala do levante da consciência negra. “Hoje em dia, as coisas não passam batidas. Embora não tenha uma política de reparação eficiente, há um posicionamento assertivo da comunidade negra.”
Roberta estima que existam atualmente no Brasil cerca de 20 slams, sendo ao menos 11 em São Paulo, entre eles, o da Guilhermina e do 13. “A perspectiva é expandir. Não paga copyright”, brinca. Para a MC, a modalidade tem tudo a ver com o Brasil, com uma tradição oral muito forte: “Um país que teve ditadura, escravidão e precisa passar muita coisa a limpo. As pessoas precisam ser ouvidas. Exercer política sem ser da forma tradicional, de forma dinâmica e poética, é maravilhoso”.
Saiba mais
As regras
Também conhecido como spoken word, o poetry slam nasceu em 1984 em uma escola de Chicaco (EUA) com Marc Smith. Pelas regras do circuito mundial, o poema deve ser de autoria própria. O tema é livre. O participante não pode usar acessórios, figurino ou acompanhamento musical. Cada poesia deve ter no máximo 3 minutos. A cada 10 segundos excedidos, são descontados alguns décimos da nota. O júri é formado por cinco pessoas escolhidas na hora. As notas vão de 0 a 10. A mais alta e a mais baixa são descartadas. Nos EUA, é comum a venda de livros de “autoajuda do slam”, ensinando as técnicas de sucesso. Em São Paulo, existe o menor slam do mundo: de apenas 10 segundos.