Mulher mente por qualquer razão. E os homens, desde a mais tenra infância, aprendem a conviver com isso. “'Olha o aviãozinho!' A primeira mentira. Ela querendo nos convencer de que o que tinha na mão não era uma colher com papinha, mas um avião. Um avião!”
É dessa maneira que Luis Fernando Verissimo dá a partida para sua nova coletânea de crônicas. Nas livrarias a partir desta quarta-feira, As mentiras que as mulheres contam (Editora Objetiva), é uma resposta ao best-seller de 15 anos atrás, As mentiras que os homens contam (500 mil exemplares vendidos). As 48 crônicas que recheiam o livro foram garimpadas pela editora do extenso material publicado na imprensa. Somente o texto introdutório (o do aviãozinho), que amarra o livro, é inédito.
Aos 79 anos, o marido de Lúcia (a primeira namorada séria) há 52, pai de Fernanda, Mariana e Pedro e avô de Lucinda, é um dos escritores mais populares do país. Também cartunista, tradutor, roteirista, dramaturgo, saxofonista, romancista bissexto (com seis títulos publicados), fez da crônica seu principal ofício.
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É o orgasmo fingido, o presente passado para a frente, a mentira para ganhar um afago do marido, aquela desculpa esfarrapada que não faz mal a ninguém. Na entrevista a seguir, concedida ao Estado de Minas por e-mail, Verissimo mantém nas respostas o estilo de suas crônicas: curtas, certeiras e inspiradas.
‘‘Prefiro escrever, com tempo para pensar e não dizer bobagens’’
Em que situação uma mulher não mente?
Dormindo.
Acho que é o homem, mas mulher é mais criativa.
O senhor está casado há mais de 50 anos. Um casamento só funciona com mentiras?
Eu nunca menti para a minha mulher, só omiti a verdade algumas vezes.
Qual foi a última mentira que o senhor disse?
Eu não minto. Esta é a primeira vez.
No Brasil de hoje ainda há motivos para rir?
O Brasil às vezes é desanimador, mas nunca deixa de ser engraçado. Muitas vezes no mau sentido.
Escrever hoje, para o senhor, é algo mais complicado do que há 20 anos?
Escrever fica cada vez mais difícil. Exigimos cada vez mais de nós mesmos e a autocrítica aumenta. Eu escrevia mais, antigamente. Não sei se fiquei mais conciso ou mais preguiçoso.
Dos seus livros, de qual o senhor mais gosta?
O analista de Bagé (1981). Não por ser diferente dos outros, mas por ser o primeiro que chamou a atenção.
Tem ideia de quantas crônicas o senhor já escreveu?
Já perdi a conta. Mesmo. A crônica sai com facilidade ou custa a sair, depende do assunto e da abordagem. Na minha experiência, as que dão mais trabalho são as que têm menos repercussão.
O que uma boa crônica deve trazer?
Antes de mais nada, deve ser atraente. É literatura de consumo rápido, ou pega o leitor ou ele escapa.
O senhor escreve muito e fala pouco. Escrever é melhor do que falar?
Prefiro escrever, com tempo para pensar e não dizer bobagens. Ou menos bobagens. Mas, na verdade, eu não falo pouco. São os outros que falam muito.
O que o senhor ainda espera da vida?
Eu sonhava em ser eterno, mas já me convenci de que não vai dar.
Citações e textos atribuídos ao senhor existem a perder de vista na internet. Isso, de alguma maneira, o incomoda?
Não há o que fazer para evitar os textos apócrifos. Alguns são até bons, e aí eu agradeço os elogios. Frequento pouco a internet. Acho que as redes sociais, muitas vezes, revelam o que há de pior nas pessoas. E o ódio é sempre triste.
O que é pior: fazer uma palestra ou dar uma entrevista ao vivo?
Empatam.
As mentiras que as mulheres contam
De Luis Fernando Verissimo.
Objetiva, 184 páginas, R$ 34,90 (livro) e R$ 23,90 (e-book).
Crônica
E por falar em festa...
“– Minha filha, você me deu sua palavra que a sua festa ia acabar às duas horas.
– E acabou, papai.
– Sim, mas às duas da tarde! Nós estávamos almoçando, hoje, e ainda estava chegando gente pra festa de ontem!
– É que a turma se excedeu um pouco, papai, qualé?
– Outra coisa, você jurou que seus amigos iam ficar na sala e não invadiriam os outros aposentos.
– E então?
– Então que eu fui acordado no meio da noite por um cabeludo me perguntando se não tinha vodca em casa.
– Ele se perdeu, só isso.
– Tudo bem. Mas ele precisava me chamar de 'sô do pijama'?
– Papai...
– E mais. Eles quis tirar sua mãe da cama para dançar.
– Qual é o problema?
– E ela foi.”