Quando criança, Leda Selmidei Gontijo transformava miolos de pão que seu pai molhava no vinho durante as refeições em bichos de um zoológico imaginário. Mais tarde, ela se deu conta de que recebera “de Deus um dom de fazer do nada alguma coisa”.
Foi nos anos 1940, já casada e com quatro filhos, que Leda decidiu estudar escultura, “quando (Alberto da Veiga) Guignard (1896-1962) abriu uma escola no Parque (Municipal)”. “Queriam que eu desenhasse, mas eu queria era escultura”, recorda-se.
Hoje, aos 100 anos, a escultora trabalha em pedra-sabão, sua preferida, mas também com madeira ou “qualquer material que cair nas mãos”. “Fico em dúvida se sou artesã-escultora ou escultora-artesã.”
Quando adolescente, Paulo Laender “era extremado, temperamental” e percebeu que “teria que ter equilíbrio”. Passou a praticar ioga. “Fui acalmando a minha loucura, mas não perdendo a loucura. Era para ela se adaptar a um processo que me permitisse desenvolver o lado artístico.” Esse lado estava presente desde a infância. “Aos seis, sete anos, ganhei do meu pai um canivete e me coloquei a esculpir cabos de vassoura.” Hoje, Paulo Laender, que nasceu em 1945 e se considera “um neto de Guignard”, está convicto de que “o artista nasce fruto de uma carência, que ele tenta surprir com os objetos que cria. E esses objetos se tornam uma ponte, uma passagem, um portal entre dois mundos”.
Quando adulto, Mário Zavagli se interrogou sobre o que gostaria de ser se tivesse a chance de uma nova encarnação. “Pintor de novo, sem dúvida”, concluiu. “Você não está pintor. Você é pintor – ou não é. O prazer (que a arte proporciona) é o do fazer permanente. Eu me sinto em êxtase trabalhando. Há um prazer e uma satisfação, independentemente do resultado do trabalho. Esse prazer é o que me move. Não guardo trabalho meu quase nenhum comigo. Não tenho prazer em tê-los. Sempre quero o próximo. O processo catártico parece ser muito sofrimento, mas não é.”
Leda, Laender e Zavagli dividiram essas e muitas outras memórias e reflexões com o público do seminário Arte É Preciso, realizado pelo Estado de Minas na noite de anteontem, em seu Espaço Cultural. O encontro foi o segundo de uma série de quatro que objetiva discutir aspectos da produção artística e seu consumo no Brasil. O ciclo antecede o leilão de arte da Jornada Solidária, previsto para 10 de novembro.
Mediador do debate, o artista e professor Carlos Wolney leu o texto Sobre o meu desenho. “O desenho salta de um sonho. Nos sonhos, os desejos habitam figuras e fundos que se desocultam de um mundo invisível, emergem de um mundo interior, onírico”, disse.
A noite teve também divertida sinceridade. “Às vezes, minhas alunas erram e dizem que fizeram daquela forma porque estavam fazendo arte moderna. Não é. É erro mesmo”, comendou Leda Gontijo.
Teve imprevisto. Convidada para a mesa, a grafiteira Tainá Lima, que assina Criola, não apareceu. A coordenadora da Jornada Solidária, Isabela Teixeira da Costa, se desculpou com o público e afirmou que não sabia esclarecer o motivo da ausência, já que não conseguira contato com a artista “nos últimos dois dias”.
Teve alerta. “Vivemos num mundo barbarizado, banalizado e imediatista, em que a questão principal é criar um fato-espetáculo, e não um fato que tenha valor de permanência”, disse Laender. “A arte se tornou espetáculo, espetaculosa, voltada para eventos com custo tão alto que as próprias galerias fazem apenas dois ou três exposições por ano. Os jovens artistas não conseguem espaço. Isso me preocupa muito, porque arte se faz com renovação. A sociedade tem que dar uma resposta a isso”, afirmou Zavagli.
Teve emoção. Nazareth Teixeira da Costa, presidente da Jornada Solidária, programa de responsabilidade social do Estado de Minas que neste 2015 beneficia 11 creches e um abrigo de crianças em situação de risco, agradeceu o apoio à iniciativa dos seminários e à organização do leilão que arrecadará recursos para a ação social. “O segredo e a chave do sucesso são a transparência com que a gente faz a Jornada Solidária e a ajuda de vocês.” Antes de concluir, fez pausa para recompor a voz, embargada: “É muito bom saber que a gente ainda consegue fazer algumas crianças felizes num país tão desgovernado quanto o nosso”.
O terceiro seminário do ciclo Arte É Preciso ocorre às 19h30 da próxima quinta. O encontro é aberto ao público, mediante inscrição prévia, via e-mail jornada@uai.com.br.
Foi nos anos 1940, já casada e com quatro filhos, que Leda decidiu estudar escultura, “quando (Alberto da Veiga) Guignard (1896-1962) abriu uma escola no Parque (Municipal)”. “Queriam que eu desenhasse, mas eu queria era escultura”, recorda-se.
Hoje, aos 100 anos, a escultora trabalha em pedra-sabão, sua preferida, mas também com madeira ou “qualquer material que cair nas mãos”. “Fico em dúvida se sou artesã-escultora ou escultora-artesã.”
Quando adolescente, Paulo Laender “era extremado, temperamental” e percebeu que “teria que ter equilíbrio”. Passou a praticar ioga. “Fui acalmando a minha loucura, mas não perdendo a loucura. Era para ela se adaptar a um processo que me permitisse desenvolver o lado artístico.” Esse lado estava presente desde a infância. “Aos seis, sete anos, ganhei do meu pai um canivete e me coloquei a esculpir cabos de vassoura.” Hoje, Paulo Laender, que nasceu em 1945 e se considera “um neto de Guignard”, está convicto de que “o artista nasce fruto de uma carência, que ele tenta surprir com os objetos que cria. E esses objetos se tornam uma ponte, uma passagem, um portal entre dois mundos”.
Quando adulto, Mário Zavagli se interrogou sobre o que gostaria de ser se tivesse a chance de uma nova encarnação. “Pintor de novo, sem dúvida”, concluiu. “Você não está pintor. Você é pintor – ou não é. O prazer (que a arte proporciona) é o do fazer permanente. Eu me sinto em êxtase trabalhando. Há um prazer e uma satisfação, independentemente do resultado do trabalho. Esse prazer é o que me move. Não guardo trabalho meu quase nenhum comigo. Não tenho prazer em tê-los. Sempre quero o próximo. O processo catártico parece ser muito sofrimento, mas não é.”
Leda, Laender e Zavagli dividiram essas e muitas outras memórias e reflexões com o público do seminário Arte É Preciso, realizado pelo Estado de Minas na noite de anteontem, em seu Espaço Cultural. O encontro foi o segundo de uma série de quatro que objetiva discutir aspectos da produção artística e seu consumo no Brasil. O ciclo antecede o leilão de arte da Jornada Solidária, previsto para 10 de novembro.
Mediador do debate, o artista e professor Carlos Wolney leu o texto Sobre o meu desenho. “O desenho salta de um sonho. Nos sonhos, os desejos habitam figuras e fundos que se desocultam de um mundo invisível, emergem de um mundo interior, onírico”, disse.
A noite teve também divertida sinceridade. “Às vezes, minhas alunas erram e dizem que fizeram daquela forma porque estavam fazendo arte moderna. Não é. É erro mesmo”, comendou Leda Gontijo.
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Teve alerta. “Vivemos num mundo barbarizado, banalizado e imediatista, em que a questão principal é criar um fato-espetáculo, e não um fato que tenha valor de permanência”, disse Laender. “A arte se tornou espetáculo, espetaculosa, voltada para eventos com custo tão alto que as próprias galerias fazem apenas dois ou três exposições por ano. Os jovens artistas não conseguem espaço. Isso me preocupa muito, porque arte se faz com renovação. A sociedade tem que dar uma resposta a isso”, afirmou Zavagli.
Teve emoção. Nazareth Teixeira da Costa, presidente da Jornada Solidária, programa de responsabilidade social do Estado de Minas que neste 2015 beneficia 11 creches e um abrigo de crianças em situação de risco, agradeceu o apoio à iniciativa dos seminários e à organização do leilão que arrecadará recursos para a ação social. “O segredo e a chave do sucesso são a transparência com que a gente faz a Jornada Solidária e a ajuda de vocês.” Antes de concluir, fez pausa para recompor a voz, embargada: “É muito bom saber que a gente ainda consegue fazer algumas crianças felizes num país tão desgovernado quanto o nosso”.
O terceiro seminário do ciclo Arte É Preciso ocorre às 19h30 da próxima quinta. O encontro é aberto ao público, mediante inscrição prévia, via e-mail jornada@uai.com.br.