Trata-se de uma exposição monumental - e isso não se refere apenas ao tamanho da mostra 'África Africans', que o Museu Afro Brasil abre na segunda-feira, 25, em homenagem ao Dia Internacional da África. É monumental porque, além de reunir 100 obras, entre pinturas, esculturas e instalações, ela traz 20 dos mais renomados artistas do continente africano, entre eles o veterano El Anatsui, nascido em Gana há 71 anos, que recebeu no início do mês o Leão de Ouro da Bienal de Veneza pelo conjunto da obra.
El Anatsui está presente nas principais coleções públicas do mundo (Metropolitan, MoMA) e é considerado pelo curador da mostra italiana, o nigeriano Okwui Enzewor, "o artista africano mais importante e ativo do continente". Com mais de quatro décadas de carreira, é também o mais influente, referência máxima de muitos artistas que participam da mostra, organizada pelo diretor do museu, Emanoel Araújo, que cedeu parte de sua coleção particular para apresentar ao público um completo panorama da arte africana, de suas origens aos dias atuais.
Entre os discípulos de El Anatsui, o que assume o mestre como responsável por sua carreira, está o nigeriano Bright Ugochukwu Eke, de 39 anos. Não é difícil entender a razão depois de ver sua instalação 'Cloud Earth Twist', obra de caráter autobiográfico que adota como tema as consequências nefastas da chuva ácida. Ele diz que experimentou literalmente na pele os seus efeitos.
Sua instalação consiste de pequenos sacos plásticos com água limpa e carvão em pó, obra que reflete sua experiência com a chuva ácida em regiões poluídas da Nigéria, em especial as que produzem petróleo. Seu trabalho, sobre as relações do homem com o meio ambiente, utiliza basicamente material reciclado, como o de El Anatsui.
"Essa talvez seja a característica mais marcante entre os artistas contemporâneos africanos", observa o curador Emanoel Araujo. "É uma arte voltada para sua circunstância, que fala da natureza e da necessidade de usar sempre que possível o reciclável."
Na obra da El Anatsui exposta na mostra, 'Skylines' (2008), pequenas peças de alumínio e cobre prensado formam um manto muito parecido com o Manto da Anunciação de Bispo do Rosário - só que maior, com oito metros de comprimento e três de altura. No entanto, o de El Anatsui dispensa a carga subjetiva do manto do brasileiro.
Aponta para os efeitos da coletiva ânsia consumista que cria um muro entre o homem e a natureza - e, nesse aspecto, sua obra 'Skylines' está mais próxima de Anthony Gormley, artista com o qual admite ter afinidade. Suas "roupas" de metal (chamadas "gawk") traçam uma correspondência histórica com as vestimentas "kente" dos reis de Gana, que gostavam de ostentar luxo, como provam as fotografias do alemão Alfred Weidinger, contemplado com uma sala especial na mostra.
São fotos impressionantes dos últimos reis africanos, expostas na sala que dá acesso aos artistas convidados, bem ao lado das imagens do fotógrafo brasileiro Christian Cravo que mostram regiões desérticas de um continente com 54 países repletos de savanas e vales. É uma introdução bela para uma realidade nem tanto.
Grande parte das obras é formada por instalações e pinturas que condenam o olhar eurocêntrico e o colonialismo. Duas delas chamam a atenção, em particular, a instalação 'Egg Fight' (2009) do nigeriano (que nasceu em Londres e mudou-se para Lagos) Yinka Shonibare, e a pintura 'Mundo dos Espíritos', de Julien Sinzogan, nascido no Benin, pequeno país no Oeste da África entre o Togo e a Nigéria. O curador Emanoel Araujo não esconde sua predileção por essa pintura sobre o mercado transatlântico de escravos, que, impedidos de retornar à terra natal, ressurgem como espíritos nesse navio fantasma de Sinzogan.
Outro que trata do tema é Aston, do Benin. Há 20 anos ele recolhe objetos abandonados nas praias e estradas para criar sua representação alegórica do drama de 12 milhões de africanos capturados no continente, transportados como gado e vendidos como mercadoria nos países americanos. Aston refaz esse percurso.
O resultado da instalação impressiona tanto quanto a colossal biblioteca de Shonibare, 'The British Library', formada por 6.225 livros encapados com tecidos de padrão africano fabricados na Holanda e que usam a milenar arte do batik indonesiano. Hibridismo cultural com matriz africana é isso.
El Anatsui está presente nas principais coleções públicas do mundo (Metropolitan, MoMA) e é considerado pelo curador da mostra italiana, o nigeriano Okwui Enzewor, "o artista africano mais importante e ativo do continente". Com mais de quatro décadas de carreira, é também o mais influente, referência máxima de muitos artistas que participam da mostra, organizada pelo diretor do museu, Emanoel Araújo, que cedeu parte de sua coleção particular para apresentar ao público um completo panorama da arte africana, de suas origens aos dias atuais.
Entre os discípulos de El Anatsui, o que assume o mestre como responsável por sua carreira, está o nigeriano Bright Ugochukwu Eke, de 39 anos. Não é difícil entender a razão depois de ver sua instalação 'Cloud Earth Twist', obra de caráter autobiográfico que adota como tema as consequências nefastas da chuva ácida. Ele diz que experimentou literalmente na pele os seus efeitos.
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"Essa talvez seja a característica mais marcante entre os artistas contemporâneos africanos", observa o curador Emanoel Araujo. "É uma arte voltada para sua circunstância, que fala da natureza e da necessidade de usar sempre que possível o reciclável."
Na obra da El Anatsui exposta na mostra, 'Skylines' (2008), pequenas peças de alumínio e cobre prensado formam um manto muito parecido com o Manto da Anunciação de Bispo do Rosário - só que maior, com oito metros de comprimento e três de altura. No entanto, o de El Anatsui dispensa a carga subjetiva do manto do brasileiro.
Aponta para os efeitos da coletiva ânsia consumista que cria um muro entre o homem e a natureza - e, nesse aspecto, sua obra 'Skylines' está mais próxima de Anthony Gormley, artista com o qual admite ter afinidade. Suas "roupas" de metal (chamadas "gawk") traçam uma correspondência histórica com as vestimentas "kente" dos reis de Gana, que gostavam de ostentar luxo, como provam as fotografias do alemão Alfred Weidinger, contemplado com uma sala especial na mostra.
São fotos impressionantes dos últimos reis africanos, expostas na sala que dá acesso aos artistas convidados, bem ao lado das imagens do fotógrafo brasileiro Christian Cravo que mostram regiões desérticas de um continente com 54 países repletos de savanas e vales. É uma introdução bela para uma realidade nem tanto.
Grande parte das obras é formada por instalações e pinturas que condenam o olhar eurocêntrico e o colonialismo. Duas delas chamam a atenção, em particular, a instalação 'Egg Fight' (2009) do nigeriano (que nasceu em Londres e mudou-se para Lagos) Yinka Shonibare, e a pintura 'Mundo dos Espíritos', de Julien Sinzogan, nascido no Benin, pequeno país no Oeste da África entre o Togo e a Nigéria. O curador Emanoel Araujo não esconde sua predileção por essa pintura sobre o mercado transatlântico de escravos, que, impedidos de retornar à terra natal, ressurgem como espíritos nesse navio fantasma de Sinzogan.
Outro que trata do tema é Aston, do Benin. Há 20 anos ele recolhe objetos abandonados nas praias e estradas para criar sua representação alegórica do drama de 12 milhões de africanos capturados no continente, transportados como gado e vendidos como mercadoria nos países americanos. Aston refaz esse percurso.
O resultado da instalação impressiona tanto quanto a colossal biblioteca de Shonibare, 'The British Library', formada por 6.225 livros encapados com tecidos de padrão africano fabricados na Holanda e que usam a milenar arte do batik indonesiano. Hibridismo cultural com matriz africana é isso.