Cleonice Berardinelli foi apresentada a Maria Bethânia pelo professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Júlio Diniz quando ele a levou ao Canecão, em 1995, para assistir ao show da cantora, 'Imitação da vida'. O que as aproximou foi a paixão de ambas pela obra de Fernando Pessoa, poeta português do século 19 com forte presença na obra de ambas.
Confira teaser do documentário 'O vento lá fora':
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Na gravação, o clima de intimidade e humor foi determinante para a interação entre a professora carioca e a artista baiana, e contribuiu para pontuar o ritmo e a fluidez do roteiro. Houve, ainda, a apropriação de trechos da carta na qual o próprio Pessoa explica a gênese de seus heterônimos ao também poeta Adolfo Casais Monteiro.
Sob o título 'O vento lá fora', o documentário filmado em preto e branco tem duração de 64 minutos, com trilha sonora que traz o pianista Nelson Freire interpretando trechos de obras de Liszt e Schumann e composições de Egberto Gismonti, executadas em flauta e violino, além de uma pequena participação de Bethânia ao piano.
Os heterônimos de Fernando Pessoa
Por meio de heterônimos, Fernando Pessoa mostrava um vasto projeto artístico: eles tinham biografia, estilo e ideais próprios, além de serem bem diferentes uns dos outros. Foram mais de 70 heterônimos criados, alguns desenvolvidos completamente, outros não. Os mais marcantes foram Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, eixos do documentário de Bethânia e Dona Cléo.
Alberto Caeiro
Alberto Caeiro era o mestre de todos os outros heterônimos, além de ser mestre do próprio Fernando Pessoa. Nascido em 16 de abril de 1889, Caeiro era órfão de pai e mãe e viveu a vida inteira no campo com sua tia. Fruto de um local bucólico, Caeiro defende a simplicidade da vida e seus pensamentos são extraídos do contato com a natureza e a vida simples. Ele procurava ver o real e como a realidade se configura de maneira simples.
Os pensamentos e as sensações do poeta eram obtidos por meio dos sentidos do ser humano, sem a interferência do pensamento humano. Para ele, as coisas “eram como eram”, não havia necessidade de pensar. Tudo era objetivo. Caeiro faleceu em 1915, tuberculoso.
Sendo o mais intelectualizado entre as personalidades pessoanas, Caeiro foi o que menos se preocupou com o trabalho formal do poema. Daí o comentário crítico do seu discípulo Ricardo Reis: “Falta nos poemas de Caeiro aquilo que deveria completá-los a disciplina exterior. Não subordinou a expressão à uma disciplina comparável àquela a que subordinou, quase sempre, a emoção e sempre, a idéia.”
Ricardo Reis
Nascido em 19 de novembro de 1887, no Porto, Ricardo Reis tinha formação em medicina. Exilou-se no Brasil porque não concordava com a Proclamação da República Portuguesa. É uma face de Fernando Pessoa ligada ao clássico, à cultura greco-latina.
Ricardo Reis valorizava a vida campestre e a simplicidade das coisas, mas ao contrário de Caeiro, ele não se sente feliz e integrado à natureza, sentindo-se fruto de uma sociedade decadente, que caminha para a destruição. Para Reis, o destino de todos já havia sido traçado e só restava aproveitar a vida ao máximo.
Álvaro de Campos
Era a face mais ligada ao modernismo e ao futurismo. Nascido em 15 de outubro de 1890, em Távira, Álvaro é engenheiro formado em Glasgow, mas não exerceu a profissão por não gostar de sentir-se preso em escritório. De tipo vagamente judeu português, com a pele entre branca e morena, cabelo liso e normalmente apartado ao lado, usa monóculo, Álvaro é um homem voltado para o presente e sua poesia busca transmitir o espírito do mundo moderno.
Teve três fases: decadentista, futurista e pessoal. Na fase decadentista há uma ligação com o simbolismo, um descontentamento, o tédio em relação ao mundo presente; na fase futurista vemos a ligação com o moderno e o tempo presente, que passava por modernização; na fase pessoal, vemos questionamentos sobre si próprio, descontentamentos e certo abatimento.