“Gosto de escultura e de trabalhar com coisas que vou achando na rua. O que faço é garimpo urbano”, afirma Xerel. Processo tão natural que o recolhido no ateliê acaba se encaixando sem esforço em construções feitas ao sabor da sedução por texturas, detalhes e fragmentos. O artista não esconde encanto por visualidade “mais rude”, preservando o estado em que o material foi encontrado. “A grande metrópole é contexto estimulante. Uso a cidade do mesmo modo que ela me usa”, acrescenta. Ele vê as cidades em mundo organizado e caótico, atravessado por contrastes sociais. Até acha que as periferias devem ter a mesma infraestrutura dos bairros nobres. “Mas sou urbano e, apesar das diferenças, que são evidentes, gosto muita da vida na cidade.”
Xerel Alcântara também está mostrando o que chama de 'Molduras'. São pinturas sobre tela dos “cabeças quadradas”, nome que deu ao personagem que espalhou peças pelas ruas de Belo Horizonte. São trabalhos com látex e spray que, cultivando visualidade de todas as obras, carregam uma certa harmonia, “busca de comunicação com poucos recursos visuais”, no modo como conjuga cor e traço. “É trabalho mais pensado do que os objetos”, observa. O artista até olhava com desconfiança as produções, já que são trabalhos extremamente sintéticos, mas o galerista Alberto Hermany gostou do feito, “o que me deu segurança para realizar as telas”.
O artista é belo-horizontino criado no Bairro Floresta. Mas quem levou Xerel para o mundo da arte foram amigos de Santa Tereza, que gostavam de cultura de rua e tinham estampado em skates, camisetas e bicicletas os motivos visuais cultivados pelo hip-hop. Precisando trabalhar, o artista passou por várias atividades, chegando até um escritório de engenharia, onde fazia cópias de plantas. Ele suspeita que vem daí a sedução por geometrias simples, fundamento de várias obras. Atuando com pesquisa de opinião pública, se desloca por várias cidades, entre elas São Paulo, onde vive efervescentes manifestações de arte de rua. O primeiro impulso, recorda, foi criar fanzine documentando tudo que via. E realizou registro, fotos de garatujas, escritas e objetos descartados na cidade. Exercício que coloca na origem do que faz hoje.
Artur Bispo do Rosário é uma fonte e referência. “É criação poética”, elogia Xerel Alcântara. O artista considera o ambiente das artes visuais de Belo Horizonte fechado, com poucas oportunidades e poucos compradores de arte. “É caminho de pedra”, garante. “O Sepultura, com quem convivi por algum tempo, teve de sair de Belo Horizonte para ser reconhecido. Não é o único caso”, afirma. Um aspecto positivo da cidade é ser local tranquilo, o que permite concentração para trabalhar.
Arte para refletir
A Galeria Chimera Cultural, onde está sendo realizada a exposição de Xerel Alcântara, foi criada em abril pelo colecionador Alberto Hermany Filho, de 54 anos. O projeto é ser espaço dedicado à arte alternativa. O galerista destaca artistas vindos da arte de rua, que mais tarde fizeram cursos de arte, mas não deixaram de atuar no espaço público. “É arte que tem linguagem mais objetiva, que consegue refletir o nosso tempo melhor do que o artista acadêmico ou tradicional”, afirma Hermany. Trata-se de movimento que vem da década de 1990, movido por proposta de ocupação de lugares e mídia. “É parte da proposta deles levar a população a refletir.” Vem deste aspecto o farto uso de textos e palavras nas obras. A Chimera já realizou até agora exposições de Alexandre Rato e Antônio Cláudio Carvalho.
Xerel Alcântara
Objetos e pinturas. Chimera Cultural, Avenida Cristóvão Colombo, 631, Funcionários, (31) 9525-8080. De segunda a sábado, das 14h às 20h. Até 11 de novembro. Entrada franca.