Um bom número de pessoas nem chega a olhar duas vezes. Já os que param fazem um primeiro contato meio desconfiado, até decidir qual levar. Uma vez com o livro em mãos, esperam seu ônibus chegar e embarcam com o volume debaixo do braço. Há 10 dias, os usuários de transporte público que frequentam o ponto da Praça da Liberdade em frente ao Centro Cultural Banco do Brasil têm como companhia obras de autores clássicos como Camus e Pirandello, brasileiros como Jorge Amado e outros de leitura mais ligeira, como Colleen McCullough, conhecida pelo açucarado romance Pássaros feridos. Ao menos 30 livros estão disponíveis, de graça e sem qualquer burocracia, para quem quiser. É pegar e levar. E, uma vez lido, o livro deve ser devolvido no mesmo local.
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REFERÊNCIA
Também uma iniciativa nascida da vontade de partilhar conhecimento, foi criada por Marcos Túlio Damascena há 11 anos, na borracharia do pai, em Sabará. Despretensioso, o projeto da Borrachalioteca virou referência. Hoje, Marcos Túlio, formado em letras, dedica-se exclusivamente a ele, já que além da sede (com acervo de 10 mil volumes), conta com outras três bibliotecas, uma inclusive no presídio de Sabará, que leva o nome de Libertação pela leitura. “Sobrevivemos aos trancos e barrancos e a maior parte vem de doação”, diz ele, que na sede empresta em média 320 livros por mês. “Os campeões são os infantis, como Diário de um banana e os livros do Ziraldo.”
Projetos de incentivo à leitura, de uma maneira geral, são movidos por doações. Em Contagem, o Trilhas da leitura, que distribui livros em praças, tornou-se parceiro do Borrachalioteca. “Colocamos nas ruas uma vez por mês de 4 mil a 8 mil livros. Tem de tudo o que você puder imaginar: didático, literário, até apostila de concurso público. Falam que brasileiro não lê. Não é isso, o livro é que é muito caro: R$ 30, R$ 40, R$ 50. As pessoas ficam encantadas de poder levar livro de graça e nossa ideia é fazer o livro circular, não deixá-lo parado”, afirma Ricardo Carvalho, um dos três voluntários que atua no projeto, que já teve 20 edições. Trabalhando somente com apoio, ele sente dificuldade para o recolhimento de livros. “É uma luta para buscar, tanto que temos utilizado a viatura da polícia para pegar as doações.”
Com 10 anos de atuação, o Livro de graça na praça doou, em sua edição de 2013, 25 mil livros novos. Nascida em Belo Horizonte, a iniciativa prevê a seleção de obras inéditas para sua posterior edição, publicação e distribuição. Desde 2003, já distribuiu 200 mil exemplares de 23 obras. E ganhou versões em outras cidades. Neste ano, vai ocorrer, além de BH, no Recife e em Montes Claros.
PARA CRIANÇAS
Cada projeto, por sinal, tem sua própria maneira de atuação. Iniciativa de Estella Cruzmel – que começou a emprestar livros há quatro anos, com uma pequena banca em sua loja de roupas no Bairro Ipiranga –, o Santa leitura, na Praça Duque de Caixas, em Santa Tereza, no primeiro e terceiro domingos de cada mês é voltado para a leitura somente no local. “Cresci sem livros numa fazenda. Tenho 63 anos e antigamente não havia tanto acesso. Quando comecei a trabalhar com livro, vi que tinha necessidade de levá-los para os outros”, afirma Estella, que ampliou o projeto para outros espaços da cidade. Na Praça Salvador Morici, no Bairro Floresta, deixa diariamente 10 volumes para quem quiser pegar emprestado. E já a comunidade Sagrada Família, no Taquaril, desenvolve projeto de leitura somente para crianças.
Os livros ficam guardados num pequeno espaço que Estella alugou na praça, em Santa Tereza. “Vem tudo do meu bolso, estou procurando apoio, pois o pessoal exige alguns livros da gente. As doações que recebo são até legais, mas tem muita gente que doa livro só para limpar a casa. E quando preciso de bons livros, tenho que comprá-los”. Estella pensa em entrar com o projeto na Lei Municipal de Incentivo à Cultura.
Outra iniciativa, SeuMeuNosso, de troca de livros, está em busca de patrocínio (conseguiu aprovação para captação via Lei Rouanet) para começar com suas edições este ano. Nascido em abril, o projeto é destinado à troca. “Tem gente que troca a mesma quantidade de livros que levou, tem gente que deixa alguns a mais”, afirma Maristela Rodrigues. O SeuMeuNosso foi realizado aos longo de 2013 nas praças JK, no Sion, e República do Líbano, na Barragem Santa Lúcia. “São locais que têm realidades socioeconômicas distintas”, continua ela, que firmou parcerias com projetos nas duas regiões (Querubins, da Vila Acaba Mundo; Casa do Beco e Muquifo, ambos no Aglomerado Santa Lúcia).
Principais projetos
» Borrachalioteca: empréstimo de livros
Praça Paulo de Souza Lima, 22, Sabará, (31) 3674-4170.
Contato: borrachalioteca.blogspot.com.br.
Além de BH, haverá este ano edições em Montes Claros e no Recife.
Contato: www.lgpbrasil.com.
» Ponto do livro: empréstimo de livros
Ponto de ônibus em frente ao CCBB, na Praça da Liberdade.
Contato: Facebook: Ponto do Livro BH.
» Santa leitura: empréstimo de livros
A próxima edição será neste domingo, na Praça Duque de Caxias, em Santa Tereza
Contato: Facebook: Leitura na Praça.
» SeuMeuNosso: troca de livros
Ainda sem edição marcada, procura patrocínio.
Contato: Facebook: Projeto SeuMeuNosso.
» Trilhas da leitura: distribuição de livros
A próxima edição será em 8 de março, na Praça Íria Diniz, Eldorado
Contato: www.trilhasdaleitura.com.br.
Livros roubados
Para escapar dos horrores da guerra, uma garota se refugia nos livros. Esse é o mote do best-seller A menina que roubava livros, do escritor australiano Markus Zusak, cuja adaptação chega hoje aos cinemas brasileiros. Dirigido por Brian Percival (que assinou vários episódios da série Downton Abbey), o filme, que concorre ao Oscar de trilha sonora, traz como narradora a Morte, que, a distância, acompanha quatro anos na vida de Liesel Meminger (interpretada pela canadense Sophie Nélisse). Filha de comunista perseguida pelo nazismo, a menina é enviada, junto com o irmão, a um subúrbio de Munique para viver com um casal que se dispõe a adotá-los por dinheiro. Liesel aprende a ler nessa nova casa e aprende também a dividir os livros com os vizinhos, entre eles um judeu que vive na clandestinidade. Aproveitando o lançamento do filme, a Intrínseca – que já vendeu 2 milhões de exemplares do livro no país – está lançando nova edição com a imagem do filme.