De volta ao universo buarqueano depois de 'Ópera do malandro' e 'Suburbano coração', a fluminense Soraya Ravenle, de 51 anos, é a estrela do teatro cantado brasileiro. Desta vez ela interpreta a mulher do dono de uma companhia mambembe em 'Todos os musicais de Chico Buarque' em 90 minutos, de Cláudio Botelho e Charles Möeller, em cartaz no Rio de Janeiro.
“Minha personagem é uma mulher madura e vivida, um pouco amarga, que se sente ameaçada com a entrada de uma jovem atriz na trupe”, conta Soraya Ravenle, que se nega a aceitar o título de primeira-dama do musical brasileiro, dado a ela por Cláudio Botelho, entre outros. “Penso e ambiciono, sim, evoluir a cada trabalho. Abrir possibilidades, crescer como intérprete e me arriscar. Faço aulas de canto, de teatro e de corpo, nunca vou parar”, diz. Sua irmã é a talentosa Ithamara Koorax, dona de bela voz, que faz carreira no exterior.
As duas são filhas de uma cantora lírica polonesa amadora, que chegou ao Brasil fugindo da 2ª Guerra Mundial. Mesmo com sólida formação ela não seguiu carreira e acabou passando a “missão” para suas meninas. “Aprendemos a ler partitura enquanto aprendíamos a ler e escrever. A música está nas entranhas de nossa alma, assim como a dança”, orgulha-se Soraya. “Sem querer, ou por sorte, tive formação para o teatro musical. Minha mãe não poderia imaginar que fosse levar aquilo tão a sério”, conta.
Soraya Ravenle estreou como corista em 'A estrela Dalva', musical protagonizado por Marília Pêra. “Ela é uma referência para mim, assim como Bibi Ferreira e Sueli Franco. O ponto em que me sinto mais tocada, comovida e identificada com essas mulheres é a dedicação absoluta ao palco. Vejo-me nelas, são minhas mães artísticas”, revela.
A atriz cita também o apoio vindo do dramaturgo Douglas Dwight, de Lenita Lopes e de Ney Madeira, que a convidaram para estrelar Dolores, musical sobre a vida de Dolores Duran. Naquela época, Soraya não era um nome conhecido. “Cláudio Botelho e Charles Möeller também me proporcionaram maravilhas, como a Teresinha de 'Ópera do malandro' e a Golda de 'Um violinista no telhado', além de 'Todos os musicais de Chico Buarque'...”. Outro marco foi 'Sassaricando – E o Rio inventou a marchinha', de Sérgio Cabral e Rosa Maria Araújo. “Tenho a sorte de ter vivido vários fenômenos, trabalhos que ficam mais de ano em cartaz, com sucesso de crítica e público”, afirma.
Certa vez, Soraya ouviu de Claudio Botelho: “Ator de musical é um atleta”. Cedo, aprendeu que voz é músculo. “Bibi Ferreira canta lindamente até hoje porque se exercita”, diz a artista.
Broadway Adepta da escola do musical brasileiro, a atriz e cantora diz nada ter contra a importação de peças da Broadway como vem ocorrendo, principalmente em São Paulo. “Apesar de entender que deve haver lugar para tudo e precisamos respeitar gostos e opiniões diferentes, sinto profundamente que podemos realizar muito falando a partir do nosso país, usando nossas matérias-primas: autores, compositores e arranjadores”, observa. E defende a exportação dos espetáculos brasileiros: “Este ano, vamos a Portugal com 'Todos os musicais de Chico Buarque...', assim como fizemos com 'Ópera do malandro'”.
Soraya constata que o público se diversificou e não se limita a senhoras que desejam se divertir. “Isso é uma realidade, mas o musical não se restringe a essas plateias. Os jovens prestigiam espetáculos quando há qualidade e excelência. O boca a boca leva público eclético ao teatro. Com toda a minha experiência, posso garantir: o boca a boca é que segura uma peça em cartaz”, conclui.
MÚSICA
Ex-vocalista de shows da cantora Fernanda Abreu, Soraya Ravenle integrou o grupo Arranco de Varsóvia, com o qual gravou dois discos na década de 1990. A carreira solo como intérprete de MPB se concretizou em 2011, com o disco Arco do tempo, cujo repertório é dedicado ao letrista Paulo César Pinheiro e a seus parceiros.
NAS TELAS
A atriz Soraya Ravenle trabalhou na minissérie Dalva e Herivelto e nas novelas Paraíso (foto, com Reginaldo Faria) e Beleza pura. No cinema, fez Mulheres do Brasil, A partilha e Lost Zweig.
Soraya Ravenle entrou na minha vida como ídolo. Explico: somos da mesma geração de atores, diretores, músicos e demais malucos que se dedicaram a criar o que hoje se chama de retomada do teatro musical no Brasil. Um dia, fui ver o musical 'Dolores' – já naquela época, um exemplar do que hoje se tornou uma espécie de febre (amarela, com razão para febre alta, espasmos e dores no ouvido), um musical biográfico. O espetáculo era Soraya. Descobri-a ali e me tornei fã. Em 1999, no Rio de Janeiro, só se falava em Soraya Ravenle e sua extraordinária performance como Dolores Duran. O mais impressionante é que ela não fazia uma imitação – hoje em dia, há uma espécie de estilo “Raul Gil forever” no teatro musical carioca –, mas uma interpretação personalizada, adulta e refinada.
A vida nos colocou juntos logo depois, num show em homenagem a Lupicínio Rodrigues – então, já éramos um time. Soraya foi a Teresinha na montagem que eu e Charles Möeller fizemos da 'Ópera do malandro', de Chico Buarque; fez 'Suburbano coração' em substituição generosa da também talentosíssima Inez Vianna; fez par com José Mayer num trabalho impressionante de atriz (muito mais que de cantora) em 'Um violinista no telhado'. Agora ela é a primeira-dama de 'Todos os musicais de Chico Buarque em 90 minutos...' Ela é, sem dúvida, a primeira-dama do teatro musical que se vem fazendo no Brasil dos últimos 20 anos. Há dentro dela um rio correndo, um caldeirão de informações artísticas que vêm do tempo em que cantava samba com o grupo Arranco de Varsóvia; dos papéis em tantos musicais de sucesso; de uma ligação enorme com a MPB; e da propriedade de transformar a canção em texto teatral, tornar teatro o que poderia ser apenas música.
Quando Soraya está em cena, uma geração inteira de gente que se dedicou ao nosso ofício está ganhando voz. Ela é a nossa Bibi, a nossa Marília, alta representante de um teatro que cresceu e conquistou multidões sem precisar ter ‘gente de novela’ no elenco.
“Minha personagem é uma mulher madura e vivida, um pouco amarga, que se sente ameaçada com a entrada de uma jovem atriz na trupe”, conta Soraya Ravenle, que se nega a aceitar o título de primeira-dama do musical brasileiro, dado a ela por Cláudio Botelho, entre outros. “Penso e ambiciono, sim, evoluir a cada trabalho. Abrir possibilidades, crescer como intérprete e me arriscar. Faço aulas de canto, de teatro e de corpo, nunca vou parar”, diz. Sua irmã é a talentosa Ithamara Koorax, dona de bela voz, que faz carreira no exterior.
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Soraya Ravenle estreou como corista em 'A estrela Dalva', musical protagonizado por Marília Pêra. “Ela é uma referência para mim, assim como Bibi Ferreira e Sueli Franco. O ponto em que me sinto mais tocada, comovida e identificada com essas mulheres é a dedicação absoluta ao palco. Vejo-me nelas, são minhas mães artísticas”, revela.
A atriz cita também o apoio vindo do dramaturgo Douglas Dwight, de Lenita Lopes e de Ney Madeira, que a convidaram para estrelar Dolores, musical sobre a vida de Dolores Duran. Naquela época, Soraya não era um nome conhecido. “Cláudio Botelho e Charles Möeller também me proporcionaram maravilhas, como a Teresinha de 'Ópera do malandro' e a Golda de 'Um violinista no telhado', além de 'Todos os musicais de Chico Buarque'...”. Outro marco foi 'Sassaricando – E o Rio inventou a marchinha', de Sérgio Cabral e Rosa Maria Araújo. “Tenho a sorte de ter vivido vários fenômenos, trabalhos que ficam mais de ano em cartaz, com sucesso de crítica e público”, afirma.
Certa vez, Soraya ouviu de Claudio Botelho: “Ator de musical é um atleta”. Cedo, aprendeu que voz é músculo. “Bibi Ferreira canta lindamente até hoje porque se exercita”, diz a artista.
Broadway Adepta da escola do musical brasileiro, a atriz e cantora diz nada ter contra a importação de peças da Broadway como vem ocorrendo, principalmente em São Paulo. “Apesar de entender que deve haver lugar para tudo e precisamos respeitar gostos e opiniões diferentes, sinto profundamente que podemos realizar muito falando a partir do nosso país, usando nossas matérias-primas: autores, compositores e arranjadores”, observa. E defende a exportação dos espetáculos brasileiros: “Este ano, vamos a Portugal com 'Todos os musicais de Chico Buarque...', assim como fizemos com 'Ópera do malandro'”.
Soraya constata que o público se diversificou e não se limita a senhoras que desejam se divertir. “Isso é uma realidade, mas o musical não se restringe a essas plateias. Os jovens prestigiam espetáculos quando há qualidade e excelência. O boca a boca leva público eclético ao teatro. Com toda a minha experiência, posso garantir: o boca a boca é que segura uma peça em cartaz”, conclui.
MÚSICA
Ex-vocalista de shows da cantora Fernanda Abreu, Soraya Ravenle integrou o grupo Arranco de Varsóvia, com o qual gravou dois discos na década de 1990. A carreira solo como intérprete de MPB se concretizou em 2011, com o disco Arco do tempo, cujo repertório é dedicado ao letrista Paulo César Pinheiro e a seus parceiros.
NAS TELAS
A atriz Soraya Ravenle trabalhou na minissérie Dalva e Herivelto e nas novelas Paraíso (foto, com Reginaldo Faria) e Beleza pura. No cinema, fez Mulheres do Brasil, A partilha e Lost Zweig.
A voz do ofício
Cáudio Botelho
Soraya Ravenle entrou na minha vida como ídolo. Explico: somos da mesma geração de atores, diretores, músicos e demais malucos que se dedicaram a criar o que hoje se chama de retomada do teatro musical no Brasil. Um dia, fui ver o musical 'Dolores' – já naquela época, um exemplar do que hoje se tornou uma espécie de febre (amarela, com razão para febre alta, espasmos e dores no ouvido), um musical biográfico. O espetáculo era Soraya. Descobri-a ali e me tornei fã. Em 1999, no Rio de Janeiro, só se falava em Soraya Ravenle e sua extraordinária performance como Dolores Duran. O mais impressionante é que ela não fazia uma imitação – hoje em dia, há uma espécie de estilo “Raul Gil forever” no teatro musical carioca –, mas uma interpretação personalizada, adulta e refinada.
A vida nos colocou juntos logo depois, num show em homenagem a Lupicínio Rodrigues – então, já éramos um time. Soraya foi a Teresinha na montagem que eu e Charles Möeller fizemos da 'Ópera do malandro', de Chico Buarque; fez 'Suburbano coração' em substituição generosa da também talentosíssima Inez Vianna; fez par com José Mayer num trabalho impressionante de atriz (muito mais que de cantora) em 'Um violinista no telhado'. Agora ela é a primeira-dama de 'Todos os musicais de Chico Buarque em 90 minutos...' Ela é, sem dúvida, a primeira-dama do teatro musical que se vem fazendo no Brasil dos últimos 20 anos. Há dentro dela um rio correndo, um caldeirão de informações artísticas que vêm do tempo em que cantava samba com o grupo Arranco de Varsóvia; dos papéis em tantos musicais de sucesso; de uma ligação enorme com a MPB; e da propriedade de transformar a canção em texto teatral, tornar teatro o que poderia ser apenas música.
Quando Soraya está em cena, uma geração inteira de gente que se dedicou ao nosso ofício está ganhando voz. Ela é a nossa Bibi, a nossa Marília, alta representante de um teatro que cresceu e conquistou multidões sem precisar ter ‘gente de novela’ no elenco.