Feminista, comunista, militante antiapartheid, anticolonialista. Essas foram algumas das definições que sempre apareceram próximas do nome de Doris Lessing. A escritora britânica, que morreu ontem aos 94 anos, em Londres, recusaria todas as definições em nome da liberdade pessoal. Lutou contra todas as formas de opressão, mas quis ser, sempre, uma mulher independente. Ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura de 2007, Doris Lessing teve sua morte anunciada ontem pelo amigo e agente literário, Jonathan Clowes. “Ela se foi em paz, em sua casa em Londres, nesta manhã. Ela era uma romancista magnífica, com um pensamento fascinante e original. Foi um privilégio trabalhar com ela”, declarou.
Nascida em 22 de outubro de 1919, em Kermanshah, na Pérsia (hoje Irã), Doris Lessing escreveu mais de 50 livros em vários gêneros, entre poemas, contos, romances, ensaios e ficção científica. Filha de um oficial do Exército britânico, a escritora iria com a família ainda criança para a Rodésia, atual Zimbábue. A infância africana a marcou profundamente e está presente em sua formação política libertária, nas primeiras obras literárias e na autobiografia de maturidade que começou a publicar nos anos 1990.
Em 1939, com 19 anos, casou-se com Frank Charles Wisdom, com quem teve um filho, John, e uma filha, Jean. Ela se divorciou em 1943. Dois anos depois, uniu-se a Gottfried Lessing, um exilado judeu-alemão a quem tinha conhecido em um grupo literário marxista, e com quem teve outro filho, Peter. Depois de divorciar-se de Lessing, em 1949, a escritora se transfere para o Reino Unido com seu filho mais novo, Peter, deixando na África do Sul dois ex-maridos e os outros dois filhos.
Lessing militou no Partido Comunista britânico entre 1952 e 1956 (abandonou o partido por discordâncias com o stalinismo) e participou de campanhas contra as armas nucleares. Sua crítica ao regime sul-africano lhe custou o veto de sua entrada ao país entre 1956 e 1995. Durante as últimas décadas de vida, Lessing viveu na mesma rua do Bairro de West Hampstead, em Londres, cuidando de seu filho inválido, Peter, e sem abandonar sua atividade literária.
Contradições
A obra de Doris Lessing é um retrato do século 20, em suas contradições, conflitos e combates contra diversas formas de opressão. A escritora levou para suas narrativas as questões políticas e existenciais de seu tempo e, descrente do poder do realismo, chegou a escrever uma longa série de ficção científica entre 1979 e 1983, 'Canopus em Argos'. Mas foi com o romance 'Carnê dourado', de 1962, que se tornaria conhecida mundialmente. O livro, mesmo com os protestos da autora, se tornou um marco na luta feminista.
De forte cunho autobiográfico, 'Carnê dourado' conta a história de uma escritora bem-sucedida que tem quatro diários: um negro, para a sua obra literária; um vermelho para suas atividades políticas; um azul, no qual tenta encontrar a verdade por meio da psicanálise; e um amarelo para sua vida particular. No quinto, um caderno dourado, ela busca uma síntese impossível de sua vida.
Os livros mais recentes de Doris Lessing retomam sua preocupação com a política, sobretudo com relação aos jovens; e com a condição feminina, agora centrado nos temas da maturidade e da terceira idade. São livros como 'A boa terrorista', 'As avós', 'Amor de novo' e 'O sonho mais doce'. Com Debaixo da minha pele, de 1997, Doris Lessing começa a escrever suas memórias. O livro trata dos primeiros 30 anos da vida da escritora e de sua luta para romper com as convenções. O segundo volume, 'Andando na sombra', se passa em 1949 e começa com a chegada de Doris Lessing a Londres, com o filho e seu primeiro livro inédito. Em clima de pós-guerra, a escritora fala dos momentos marcantes de sua formação como artista, mulher e militante.
Seu último livro, 'Alfred e Emily' explora a vida dos pais e como eles a influenciaram. Doris Lessing divide o livro em duas partes. Na primeira, imagina a vida dos pais sem o trauma da Primeira Guerra; em seguida, narra em tom realista a difícil existência do casal na Rodésia. Como em grande parte de sua obra, a ficção era apenas um instrumento para falar de suas verdades íntimas. Doris Lessing sempre foi a personagem central de seus livros.
A escritora, que em 1999 rejeitou o título de Dama do Império Britânico concedido pela rainha Elizabeth II, porque “já não há nenhum império”, trabalhou até o fim de sua vida escrevendo artigos, romances, relatos e poesia. Seu carnê dourado, a síntese impossível de uma vida atribulada e corajosa, finalmente está completo.
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Em 1939, com 19 anos, casou-se com Frank Charles Wisdom, com quem teve um filho, John, e uma filha, Jean. Ela se divorciou em 1943. Dois anos depois, uniu-se a Gottfried Lessing, um exilado judeu-alemão a quem tinha conhecido em um grupo literário marxista, e com quem teve outro filho, Peter. Depois de divorciar-se de Lessing, em 1949, a escritora se transfere para o Reino Unido com seu filho mais novo, Peter, deixando na África do Sul dois ex-maridos e os outros dois filhos.
Lessing militou no Partido Comunista britânico entre 1952 e 1956 (abandonou o partido por discordâncias com o stalinismo) e participou de campanhas contra as armas nucleares. Sua crítica ao regime sul-africano lhe custou o veto de sua entrada ao país entre 1956 e 1995. Durante as últimas décadas de vida, Lessing viveu na mesma rua do Bairro de West Hampstead, em Londres, cuidando de seu filho inválido, Peter, e sem abandonar sua atividade literária.
Contradições
A obra de Doris Lessing é um retrato do século 20, em suas contradições, conflitos e combates contra diversas formas de opressão. A escritora levou para suas narrativas as questões políticas e existenciais de seu tempo e, descrente do poder do realismo, chegou a escrever uma longa série de ficção científica entre 1979 e 1983, 'Canopus em Argos'. Mas foi com o romance 'Carnê dourado', de 1962, que se tornaria conhecida mundialmente. O livro, mesmo com os protestos da autora, se tornou um marco na luta feminista.
De forte cunho autobiográfico, 'Carnê dourado' conta a história de uma escritora bem-sucedida que tem quatro diários: um negro, para a sua obra literária; um vermelho para suas atividades políticas; um azul, no qual tenta encontrar a verdade por meio da psicanálise; e um amarelo para sua vida particular. No quinto, um caderno dourado, ela busca uma síntese impossível de sua vida.
Os livros mais recentes de Doris Lessing retomam sua preocupação com a política, sobretudo com relação aos jovens; e com a condição feminina, agora centrado nos temas da maturidade e da terceira idade. São livros como 'A boa terrorista', 'As avós', 'Amor de novo' e 'O sonho mais doce'. Com Debaixo da minha pele, de 1997, Doris Lessing começa a escrever suas memórias. O livro trata dos primeiros 30 anos da vida da escritora e de sua luta para romper com as convenções. O segundo volume, 'Andando na sombra', se passa em 1949 e começa com a chegada de Doris Lessing a Londres, com o filho e seu primeiro livro inédito. Em clima de pós-guerra, a escritora fala dos momentos marcantes de sua formação como artista, mulher e militante.
Seu último livro, 'Alfred e Emily' explora a vida dos pais e como eles a influenciaram. Doris Lessing divide o livro em duas partes. Na primeira, imagina a vida dos pais sem o trauma da Primeira Guerra; em seguida, narra em tom realista a difícil existência do casal na Rodésia. Como em grande parte de sua obra, a ficção era apenas um instrumento para falar de suas verdades íntimas. Doris Lessing sempre foi a personagem central de seus livros.
A escritora, que em 1999 rejeitou o título de Dama do Império Britânico concedido pela rainha Elizabeth II, porque “já não há nenhum império”, trabalhou até o fim de sua vida escrevendo artigos, romances, relatos e poesia. Seu carnê dourado, a síntese impossível de uma vida atribulada e corajosa, finalmente está completo.