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Cicarelli é colecionador de selos e foi graças ao hobby que descobriu a correspondência de Drummond, há mais de 20 anos. Na verdade, foi por intermédio de um amigo, o advogado Anísio Cader, que conseguiu comprar o lote de documentos de parentes do poeta. Somente anos mais tarde soube que pertenciam a Ita, a cunhada de Drummond, que, por sua vez, herdou as cartas da sogra, Julieta Augusta, mãe do poeta.
Do Rio de Janeiro, o jornalista e empresário levou o material para Lavras com o intuito de fazer uma exposição no Instituto Brasil Estados Unidos da cidade. A mostra não vingou e ele guardou o material por 20 anos. “Se você detém essa informação e não repassa, é preferível nem ter. Chega uma hora que não dá mais para ficar atendendo jornalistas e pesquisadores”, afirma Eduardo. Quando tornou público seu desejo de vender o material, recebeu propostas de um site inglês e também de pesquisadores franceses.
“Imediatamente, fiquei alvoroçado. Não é todo dia que se encontra um lote de documentos tão preciosos, que dizem respeito sobretudo à intimidade do poeta”, conta Marconi Drummond Lage, primo do escritor e atual superintendente da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade. Pelo lote de valor inestimável entregue ontem durante cerimônia realizada em Lavras, a instituição pagou R$ 21 mil.
“São cartas endereçadas à mãe e conhecemos pouco da relação dele com ela. Com o pai, a obra traz alguns apontamentos. As cartas guardam muito sobre rotinas familiares, a saúde, o nascimento da filha, a notícia do noivado. É um manancial riquíssimo que ainda está por ser desvendado”, completa Marconi.
O lote tem 212 itens, entre cartas, fotografias, bilhetes, postais, escrituras e telegramas. O que mais chama a atenção são as trocas de afetos com a mãe, Julieta. Para se ter uma ideia da delicadeza com que se tratavam, sempre iniciava as correspondências com “Querida mamãe” e terminava com pedidos de bênçãos, uma curiosidade para o poeta de conhecido ateísmo. “Aqui, todos bem. Abençoe a netinha e o filho e receba as lembranças de Dolores”, escreveu em 1948.
TIMBRADO Em geral, as correspondências foram escritas em papéis timbrados do Ministério da Educação e Saúde, onde o poeta trabalhava na época como chefe de gabinete de Gustavo Capanema. O envelope era timbrado com o nome dele. Algumas das cartas ficaram incompletas. As peças mais antigas datam de 1892 e são escrituras da família Drummond.
Com a letra do poeta, bem pequena, o que há de mais antigo é uma folha de cheque do Banco da Amizade, entregue a Ita, a cunhada. O valor em questão era 365 dias de felicidade. Em uma clara brincadeira de criança, ele assina como Carlito o documento trocado em 28 de dezembro de 1915, quando tinha 13 anos. Nos cartões de visita endereçados à família, riscava o sobrenome, uma forma de ressaltar intimidade. Uma carta para Naná, de dezembro de 1986, é o último documento assinado por ele.
Em meio a tanta raridade, há uma carta enviada ao irmão Flaviano em 1925, informando o desejo de se casar com Dolores, o que ocorreu em 30 de maio daquele ano. “Comunicado isso, faço um convite, muito sincero e muito amistoso, tanto a ti como a Ita e crianças para que venham assistir o meu casamento”, redigiu. O lote tem também o cartão que comunica o nascimento da filha, Maria Julieta, em março de 1928, assim como a foto oficial da formatura em farmácia, em 1925. Na dedicatória: “Ao meu bom pai, lembrança de um amor filial”.
FONTE PARA PESQUISA
Assim que chegar a Itabira, o material fará parte do acervo do Memorial Carlos Drummond de Andrade. Antes de estar disponível para o público, os documentos serão higienizados e acondicionados corretamente. “Nesse processo vamos fazer a digitalização. É uma forma de salvaguardar o acervo e permitir que ele seja consultado a distância. A ideia é fazer um banco de dados”, informa Marconi Drummond. Segundo ele, com a aquisição deste lote Itabira se insere no mapa de instituições que guardam a memória do poeta, junto à Fundação Casa de Rui Barbosa e o Instituto Moreira Salles, ambos no Rio de Janeiro.
O Memorial Carlos Drummond de Andrade recebe anualmente média de 11 mil visitantes. O espaço mantém exposição permanente de livros e documentos. Entre as raridades do acervo, obras traduzidas para o alemão, inglês, italiano, espanhol e holandês. Outra recente aquisição é um exemplar de Alguma poesia, o primeiro publicado por Drummond, em 1930. “Acho que o que estamos levando para Itabira é um baú de prendas, como ele mesmo fala em sua obra”, resume Marconi.
Assim que chegar a Itabira, o material fará parte do acervo do Memorial Carlos Drummond de Andrade. Antes de estar disponível para o público, os documentos serão higienizados e acondicionados corretamente. “Nesse processo vamos fazer a digitalização. É uma forma de salvaguardar o acervo e permitir que ele seja consultado a distância. A ideia é fazer um banco de dados”, informa Marconi Drummond. Segundo ele, com a aquisição deste lote Itabira se insere no mapa de instituições que guardam a memória do poeta, junto à Fundação Casa de Rui Barbosa e o Instituto Moreira Salles, ambos no Rio de Janeiro.
O Memorial Carlos Drummond de Andrade recebe anualmente média de 11 mil visitantes. O espaço mantém exposição permanente de livros e documentos. Entre as raridades do acervo, obras traduzidas para o alemão, inglês, italiano, espanhol e holandês. Outra recente aquisição é um exemplar de 'Alguma poesia', o primeiro publicado por Drummond, em 1930. “Acho que o que estamos levando para Itabira é um baú de prendas, como ele mesmo fala em sua obra”, resume Marconi.
Leia trechos de cartas escritas por Drummond e familiares
3 de maio 1925
“Flaviano, abraço a todos Vou dar-te uma notícia: pretendo casar-me no dia 30 de maio próximo futuro com a srta. Dolores Morais. Comunicado isso, faço um convite, muito sincero e muito amistoso, tanto a ti como a Ita e crianças para que venham assistir o meu casamento.”
4 de maio 1943
“Querida mamãe, Aqui esta de novo seu filho depois de alguns dias de silencio, motivado pela trabalheira no ministério. De saúde vamos todos bem aqui nesta casa. A vida é normal, apesar da carestia de gêneros que a guerra tem determinado. Como deve saber, falta municipalmente açúcar e o governo resolveu racionar esse produto, para evitar mal maior. A quantidade de que dispomos, entretanto, é suficiente para o gasto normal. Espero que também aí a senhora não esteja privada do necessário. Se houver falta de alguma coisa, talvez eu possa ajudá-la, remetendo, por portador. Não tenha, pois, constrangimento em escrever.”
De Maria Julieta para Julieta
Rio, 5 de agosto de 1943
“Dindinha, Papai ganhou de um admirador incógnito uma rede colorida. Instalamo-la na pérgola e atualmente, o maior encanto da família consiste em munir-se de enorme provisão de biscoitos e – um livro debaixo do braço, Puck saltando atrás – deitar-se na rede. (...) Muito obrigada por tudo, Dindinha. A senhora é um amor. E eu serei sempre a neta dedicada. Maria Julieta”
Rio, 27 de fevereiro 1948
“Querida mamãe, Hoje resolvi fazer-lhe uma surpresa: mandar-lhe estas fotografias, para despertar na senhora algumas saudades. Lembra-se desse lugar? Certamente que sim. É o seu antigo Colégio de Macaúbas, onde a senhora passou algumas horas de sua vida.
Continuo naturalmente sem notícias suas, mas fico desejando que elas não sejam más. Como eu desejaria fazer alguma coisa para confortá-la em sua doença! Só me resta, porém, pensar afetuosamente na senhora e desejar-lhe dias tranquilos no seu cantinho do São Lucas.
Aqui, todos bem. Abençoe a netinha e o filho e receba as lembranças de Dolores. Todo carinho e saudades do Carlos”