O Brasil não seria o que é se não fosse a presença africana. A constatação é do historiador, escritor, cantor e compositor Nei Lopes, um especialista do assunto que vai abordar hoje à noite, no Museu de Artes e Ofício, como convidado do projeto Ofício da Palavra.
Em plena Primavera de Museus, que tem a cultura afro-brasileira por tema, Nei lembra que a presença africana no país é verificada, principalmente, na língua. “De uma forma tão intensa e impregnada que muitas vezes falamos palavras africanas em estado quase puro, sem que nos demos conta disso”, exemplifica Nei Lopes, lembrando que são milhares de palavras, entre as quais ele cita bunda, cachaça, cafuné, carimbo, fofoca, fubá, maconha, moleque, umbanda e zombar, entre outras.
“Muitas técnicas agrícolas, de criação de gado e de mineração, até hoje praticadas, são de origem africana”, ressalta o historiador. “Também técnicas de tecelagem e ourivesaria, além de usos culinários. Sem falar na música de todo o Brasil, nas várias formas de samba, nos diversos instrumentos usados na música popular fora de mercado, na capoeira, hoje uma prática desportiva mundializada”, acrescenta Nei Lopes.
Segundo ele, a religiosidade de matriz africana também é muito importante, principalmente pelos aportes que trouxe ao catolicismo. “E nessa religiosidade há toda uma fundamentação filosófica e moral. Sem o africano, o Brasil seria muito diferente, talvez nem tivesse uma identidade definida”, adverte o historiador. De acordo com ele, apesar da Lei 10.639/2003, que obriga o ensino de história e cultura africana e afro-rasileira nas escolas, a reação a ela tem sido muito grande.
“E isto principalmente nos redutos menos favorecidos, onde a força das chamadas Igrejas eletrônicas, neopentecostais, sataniza a cultura negra”, denuncia. Na opinião do historiador, é preciso divulgar cada vez mais conteúdos das culturas afro-originadas, para elevar a autoestima dos afrodescendentes, sempre muito baixa no país.
Nei Lopes faz questão de lembrar que, apesar das políticas públicas que menosprezam a presença negra no Brasil, até os anos 1930, desde a década de 1970 as entidades civis de defesa e promoção do povo afrodescendente vêm ganhando força por aqui. “Ainda assim, elas tinham de atuar como entidades meramente culturais, pois a repressão era grande”, recorda.
Como afirma Nei Lopes, foi a militância que fez com que os governos começassem a voltar seus olhos para a questão no Brasil. “Foi assim que chegamos ao Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010), que embora bastante esvaziado em relação ao projeto original, é um texto importante. A própria Constituição federal, promulgada em 1988, já contém dispositivos inovadores, provocados por reivindicações do movimento negro”, defende.
Letra e música
Nei Lopes, que está finalizando o 'Dicionário da história social do samba', em parceria com Luiz Antônio Simas, lamenta o fato de a presença negra no Brasil só ter visibilidade forte na música e nos esportes. “Mas se a gente levar em conta que, por exemplo, Machado de Assis, Cruz e Souza, Lima Barreto, Mário de Andrade, Gonçalves Dias, Irineu Marinho, Theodoro Sampaio, André Rebouças, João do Rio e Milton Santos eram afrodescendentes, já vai dar vontade de saber onde estão os outros”, conclui.
No momento, ele ainda aguarda o lançamento do CD 'Samba a rigor', gravado com a Orquestra Coisa Fina, de São Paulo, sob a direção do músico Guga Stroeter. Nei, que acaba de entregar a Íris Amâncio, da Nandyala Editora & Livraria, de Belo Horizonte, um volume de artigos, muitos dos quais publicados em jornais, atualmente mantém também o blog Meu lote, em seu site oficial.
NEI LOPES – OFÍCIO DA PALAVRA
Terça-feira, 19h30, no Museu de Artes e Ofícios, Praça da Estação, s/nº, Centro. Entrada franca. Informações: (31) 3248-8600.
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“Muitas técnicas agrícolas, de criação de gado e de mineração, até hoje praticadas, são de origem africana”, ressalta o historiador. “Também técnicas de tecelagem e ourivesaria, além de usos culinários. Sem falar na música de todo o Brasil, nas várias formas de samba, nos diversos instrumentos usados na música popular fora de mercado, na capoeira, hoje uma prática desportiva mundializada”, acrescenta Nei Lopes.
Segundo ele, a religiosidade de matriz africana também é muito importante, principalmente pelos aportes que trouxe ao catolicismo. “E nessa religiosidade há toda uma fundamentação filosófica e moral. Sem o africano, o Brasil seria muito diferente, talvez nem tivesse uma identidade definida”, adverte o historiador. De acordo com ele, apesar da Lei 10.639/2003, que obriga o ensino de história e cultura africana e afro-rasileira nas escolas, a reação a ela tem sido muito grande.
“E isto principalmente nos redutos menos favorecidos, onde a força das chamadas Igrejas eletrônicas, neopentecostais, sataniza a cultura negra”, denuncia. Na opinião do historiador, é preciso divulgar cada vez mais conteúdos das culturas afro-originadas, para elevar a autoestima dos afrodescendentes, sempre muito baixa no país.
Nei Lopes faz questão de lembrar que, apesar das políticas públicas que menosprezam a presença negra no Brasil, até os anos 1930, desde a década de 1970 as entidades civis de defesa e promoção do povo afrodescendente vêm ganhando força por aqui. “Ainda assim, elas tinham de atuar como entidades meramente culturais, pois a repressão era grande”, recorda.
Como afirma Nei Lopes, foi a militância que fez com que os governos começassem a voltar seus olhos para a questão no Brasil. “Foi assim que chegamos ao Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010), que embora bastante esvaziado em relação ao projeto original, é um texto importante. A própria Constituição federal, promulgada em 1988, já contém dispositivos inovadores, provocados por reivindicações do movimento negro”, defende.
Letra e música
Nei Lopes, que está finalizando o 'Dicionário da história social do samba', em parceria com Luiz Antônio Simas, lamenta o fato de a presença negra no Brasil só ter visibilidade forte na música e nos esportes. “Mas se a gente levar em conta que, por exemplo, Machado de Assis, Cruz e Souza, Lima Barreto, Mário de Andrade, Gonçalves Dias, Irineu Marinho, Theodoro Sampaio, André Rebouças, João do Rio e Milton Santos eram afrodescendentes, já vai dar vontade de saber onde estão os outros”, conclui.
No momento, ele ainda aguarda o lançamento do CD 'Samba a rigor', gravado com a Orquestra Coisa Fina, de São Paulo, sob a direção do músico Guga Stroeter. Nei, que acaba de entregar a Íris Amâncio, da Nandyala Editora & Livraria, de Belo Horizonte, um volume de artigos, muitos dos quais publicados em jornais, atualmente mantém também o blog Meu lote, em seu site oficial.
NEI LOPES – OFÍCIO DA PALAVRA
Terça-feira, 19h30, no Museu de Artes e Ofícios, Praça da Estação, s/nº, Centro. Entrada franca. Informações: (31) 3248-8600.