Até 14 de setembro, Juiz de Fora exibe exposição que apresenta um artista importante: Victor Brecheret (1884 –1955). O conjunto ressalta aspecto emblemático da obra dele: o resgate do imaginário indígena como fonte da linguagem artística moderna. Realizados a partir de 1944, 25 esculturas e 25 desenhos revelam como o primitivismo – buscado por artistas modernos do início do século 20 como modo de renovar a arte – ganhou encaminhamento específico no contexto latino-americano. Ali se veem alusões à cerâmica marajoara, a estéticas astecas e maias e a mitos populares.
A curadora Maria Izabel Branco Ribeiro explica que a onda nacionalista pós-Primeira Guerra Mundial animou essa vertente, presente na obra de vários criadores. Tais motivo e questão estética vêm dos anos 1920, defendidos pelo escritor Mário de Andrade, por exemplo. Maria Izabel lembra que Victor Brecheret absorveu essas ideias ao voltar da Europa, nos anos 1940.
“Ele era apaixonado pela Amazônia, apesar de não conhecer a região. Colocou em suas obras uma visão romântica da mitologia amazônica”, explica a curadora, citando a presença nas peças do escultor de búfalos, índios e onças. Na exposição, Maria Izabel abriu espaço para o desenho, aspecto que ela admira. “Eles são uma beleza em sua precisão, na exatidão quase cirúrgica. Brecheret é o escultor modernista, campo que tem obras magistrais, mas é também um desenhista magnífico. Para nossa sorte, ele deixou muitos desenhos”, conta.
Victor Brecheret nasceu na Itália. Em 1912, iniciou sua formação artística no Liceu de Artes e Ofícios, em São Paulo. Estudou em Roma e foi aluno de Arturo Dazzi. Ao lado dos colegas Anita Malfatti e Lasar Segall teve papel importante no período que antecedeu a Semana de Arte Moderna de 1922. O trio difundiu novas propostas estéticas.
A obra de Brecheret inspirou personagens de romances de Oswald de Andrade e de Menotti del Picchia. Atribui-se à sua escultura 'Cristo de trancinhas' influência dos versos iniciais de 'Pauliceia desvairada', de Mário de Andrade. A obra em terracota 'O índio e a suassuapara' lhe deu o prêmio de escultura na 1ª Bienal de São Paulo, em 1951. É dele o 'Monumento aos bandeirantes', um dos cartões-postais da cidade de São Paulo.
Música
Maria Izabel Branco Ribeiro chama a atenção para a linha, o ritmo e a proporção dos trabalhos do artista. São tão harmoniosos que dão às formas aspecto musical, diz. “Elas têm uma melodia”, enfatiza. A arte indígena de Victor Brecheret está circulando por várias cidades brasileiras. “Precisamos levar essa exposição para Belo Horizonte”, afirma a curadora.
De acordo com ela, o contato direto do brasileiro com as obras de Brecheret poderia ser maior – e melhor. “Os trabalhos dele ainda são conhecidos, basicamente, por meio de reproduções”, lembra.
Diretora do Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), cujo acervo tem cerca de 3 mil peças, Maria Izabel está em lua de mel com o público, como a maioria dos colegas.
“A grande visitação que atraímos é uma alegria. Hoje, ninguém mais pensa em museu como um lugar vazio e empoeirado. Ele se transformou em programa atraente, todos os dias recebemos estudantes”, comemora. “O que nos falta é o mesmo que falta a todo mundo: dinheiro e patrocínio”, conclui.
A ARTE INDÍGENA DE VICTOR BRECHERET
Escultura e desenho. Espaço Cultural Correios, Rua Marechal Deodoro, 470, Centro, Juiz de Fora, (32) 3690-5715 e
3690-5713. De segunda a sexta-feira, das 10h às 18h; sábado, das 10h às 14h. Até 14 de setembro. Entrada franca.
• Modernismo: dois tempos
• O beijo, uma das peças expostas em Juiz de Fora, não está ligada ao motivo da exposição, mas é considerada ícone da escultura moderna brasileira.
• O flerte dos modernistas com o imaginário indígena está presente em obras, livros e arquitetura encontrados em todo o país. Em Belo Horizonte, dois ícones desse momento estético ficam bem no Centro: a calçada da Praça Raul Soares, de Érico de Paula, evoca padrões marajoaras; e a grande face de um índio chama a atenção na fachada do Edifício Acaiaca, na Avenida Afonso Pena.