Três dias para conhecer e experimentar criações que escapam de rótulos. Reunido para compor painel de arte intermídia – nascida do cruzamento de música, artes visuais, cênicas e audiovisual –, o projeto surgiu nos circuitos alternativos e vem influenciando o mainstream. Assim será a edição de estreia do Conexões exploratórias em música & performance híbrida (Coma), em cartaz de hoje a sábado, no Espaço Cento e Quatro.
“Todos desregulam os territórios em que atuam. São mais que apenas grupos de música ou performance”, observa. Procedimento muito comum, além do trabalho com som, corpo e visual, é o uso da própria imagem. Está em cena uma arte estranha e sensorial, feita por pessoas que têm experiência de maior ou menor percurso (traduzida em shows, livros e discos, por exemplo), construída fora dos esquemas tradicionais.
Grupos de vanguarda? “De alguma maneira, sim”, responde Bruno Verner. “Os trabalhos são herdeiros de movimentos como dadaísmo, surrealismo e arte conceitual. Carregam um pouco dessa vibração da vanguarda”, admite. Mas o músico prefere promover o diálogo dos grupos “com coisas interessantes do início dos anos 1980, quando zero de dinheiro acabava gerando trabalhos muito interessantes e singulares”. Verner lembra: naquela época, a indústria cultural ainda não havia acuado undergrounds e alternativos.
O projeto Coma ressalta investigações estéticas praticadas internacionalmente, sempre à margem. “Quando se segue o caminho que escapa a rótulos fáceis, o prazer é poder fazer o que se quer, sem amarras da indústria e da censura. Isso tira os cacoetes, traz espontaneidade para a criação”, afirma Bruno Verner. A dificuldade é encontrar espaço para exibir o realizado. “Como você não se enquadra, muita gente vira a cara. Mas tudo é um modo de operar. O essencial é ter personalidade, acreditar no que você está fazendo. E sem medo de levar um não – aliás, o que mais se ouve”, recomenda Verner.
O festival surgiu da sensação de deslocamento em relação às cenas artísticas experimentadas por Bruno e Eliete com o Tetine. Assim surgiu a ideia de um evento que reunisse todos os “estrangeiros” em relação a conceitos e categorias já estabelecidos. A primeira tentativa nesse sentido foi o projeto Babel, realizado em São Paulo, que reuniu de drag queens ao bailarino japonês Kazuo Ono.
Oficinas
Hoje, no Espaço Cento e Quatro, serão promovidas oficinas gratuitas. Às 10h, com a theremista, cantora e instrumentista austríaca Dorit Chrysler, radicada nos Estados Unidos. Às 14h, Joana Seguro, produtora portuguesa e curadora de música eletrônica e novas tecnologias, faz palestra. Às 15h, o público poderá conhecer o trabalho do DJ e músico Paul B. Davis, norte-americano que trabalha em Londres e é professor no Departamento de Artes Plásticas do Goldsmith College.
Sábado, às 15h, Andrew Horn, diretor do filme The Nomi song, participa de sessão comentada do documentário sobre o artista Klaus Nomi.
De Sampa a Londres
A atriz paulista Eliete Mejorado e o músico belo-horizontino Bruno Verner, curadores do Coma, integram o Tetine, respeitado duo experimental. Radicados em Londres, gravaram 11 discos. A dupla se conheceu durante trabalho com o grupo Oficina, em São Paulo. Uma cena de improvisação aproximou os dois, que, intrigados com o bom resultado, resolveram estender a pesquisa.
Em 1995, surgiu a pequena apresentação daquilo que o duo chamava de música eletrônica sensorial e corporal. No fim de 1999, os dois ganharam bolsa para residência em Londres para desenvolver essa proposta. Mudaram-se para lá.
Tetine começou circulando por galerias de arte e museus graças à trilha para um filme da artista plástica Sophie Calle. “Descobrimos ali uma cena que nos permitia veicular o que fazíamos”, recorda Bruno.
Além de seus 11 discos, o duo produziu a primeira coletânea do funk carioca que chegou à Inglaterra. Outra coletânea reúne “um apanhado de coisas estranhas do Brasil da década de 1980”, informa Bruno. A nova atividade da dupla é a performance com a atriz Helena Ignez, em São Paulo, para recriar a trilha sonora do filme O bandido da luz vermelha, de Rogério Sganzerla, clássico do cinema underground brasileiro.
COMA
Espaço Cento e Quatro, Praça Ruy Barbosa, 104, Centro.
. Hoje, às 21h – Planningtorock, projeto da alemã Janine Rostron, musicista, performer, programadora e videoartista, um dos nomes da chamada “nova música eletrônica de invenção”.
. Amanhã, às 21h – Dorit Chrysler e Carla Bozulich.
. Sábado, às 21h – Zilche e Tetine. A partir das 23h, Coma Club, com Paul B. Davis, Frederico Pessoa, Astronauta Pinguin, Karine Alexandrino e Bruno Verner.
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia). Informações: www.comanet.br ou (31) 8219-9739.