Uma doença misteriosa, confinamento em ambiente nada confortável e sufocamento decorrente de episódios políticos: com todos estes temas, filmes em pré-estreia como A febre, Dora e Gabriel e Liberté demonstram o alinhamento do cinema com os tempos atuais.
Num circuito online, que reunirá quase 20 filmes, entre os quais 11 títulos nacionais e outros, estrangeiros, o Espaço Itaú de Cinema ressurge com a programação diferenciada; mas agora em plataforma de streaming, dispondo filmes com exibições alternadas, ao longo de 10 dias.
O acesso a cada longa-metragem (por 48 horas), sairá por R$ 10, no projeto Espaço Itaú Play, que terá lançamento hoje, dia do cinema brasileiro. Na iniciativa de estímulo, haverá 20% de redirecionamento de lucros a serem injetados na Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais.
Até mesmo para os cinéfilos mais aficionados há gosto de descoberta, com a oportunidade de conferir longas como Alice Guy-Blaché, documentário que desvenda a conjuntura que trouxe ostracismo para um talento do século 19: uma das pioneiras cineastas no mundo.
A condição de invisibilidade para o potencial de mulheres também está estampada em O conto das três irmãs, filme turco que revela o destino de trio de moças pobres impedidas de maiores voos, numa atmosfera restritiva de pobreza e de rotina doméstica.
Também limitado é o personagem de outro longa do Espaço Itaú Play: Aos olhos de Ernesto – assinado por Ana Luíza Azevedo. Idoso, Ernesto, que enfrenta a cegueira e a viuvez, se mantém num cotidiano previamente estipulado, até deparar com a jovem Bia, uma presença transformadora.
Dois filmes chineses selecionados para o projeto merecem atenção: Suk Suk e Viver para cantar. O primeiro (dirigido por Ray Yeung) examina a vida de dois velhos homossexuais motivados a assumir sentimentos escondidos, enquanto Viver para cantar trata, sob a perspectiva exemplar artística do cineasta Johnny Mo, do esfacelamento da tradição operística de uma companhia teatral tida como desinteressante e defasada.
Entre outros filmes, estarão disponíveis (em www.itaucinemas.com.br) O orfanato (projetado, no ano passado, em Cannes); Três verões (com Regina Casé), Pacarrete (premiada produção cearense, com Marcélia Cartaxo), Piedade (de Cláudio Assis, que abre a programação, em exceção, em caráter gratuito) e Música para morrer de amor, com Denise Fraga no elenco.
Entrevista // Adhemar Oliveira, exibidor
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O acesso a cada longa-metragem (por 48 horas), sairá por R$ 10, no projeto Espaço Itaú Play, que terá lançamento hoje, dia do cinema brasileiro. Na iniciativa de estímulo, haverá 20% de redirecionamento de lucros a serem injetados na Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais.
Até mesmo para os cinéfilos mais aficionados há gosto de descoberta, com a oportunidade de conferir longas como Alice Guy-Blaché, documentário que desvenda a conjuntura que trouxe ostracismo para um talento do século 19: uma das pioneiras cineastas no mundo.
A condição de invisibilidade para o potencial de mulheres também está estampada em O conto das três irmãs, filme turco que revela o destino de trio de moças pobres impedidas de maiores voos, numa atmosfera restritiva de pobreza e de rotina doméstica.
Também limitado é o personagem de outro longa do Espaço Itaú Play: Aos olhos de Ernesto – assinado por Ana Luíza Azevedo. Idoso, Ernesto, que enfrenta a cegueira e a viuvez, se mantém num cotidiano previamente estipulado, até deparar com a jovem Bia, uma presença transformadora.
Dois filmes chineses selecionados para o projeto merecem atenção: Suk Suk e Viver para cantar. O primeiro (dirigido por Ray Yeung) examina a vida de dois velhos homossexuais motivados a assumir sentimentos escondidos, enquanto Viver para cantar trata, sob a perspectiva exemplar artística do cineasta Johnny Mo, do esfacelamento da tradição operística de uma companhia teatral tida como desinteressante e defasada.
Entre outros filmes, estarão disponíveis (em www.itaucinemas.com.br) O orfanato (projetado, no ano passado, em Cannes); Três verões (com Regina Casé), Pacarrete (premiada produção cearense, com Marcélia Cartaxo), Piedade (de Cláudio Assis, que abre a programação, em exceção, em caráter gratuito) e Música para morrer de amor, com Denise Fraga no elenco.
Entrevista // Adhemar Oliveira, exibidor
Empreendedor do ramo da exibição de cinema, com a Espaço de Cinema (associada ao Itaú, e, no passado, aos bancos Nacional e Unibanco), o eterno cineclubista Adhemar Oliveira segue nutrindo a esperança nas projeções em salas de cinema.
A sede de promover entretenimento vem de família: o pai apostou na administração de um parque de diversões. “O gosto por bons filmes vem antes da questão dos negócios”, alerta, ele que, mantendo 57 salas no Brasil.
A sede de promover entretenimento vem de família: o pai apostou na administração de um parque de diversões. “O gosto por bons filmes vem antes da questão dos negócios”, alerta, ele que, mantendo 57 salas no Brasil.
Como a pandemia tem afetado o ramo da exibição?
Nós fomos os primeiros a parar e seremos os últimos a retomar as atividades. Há uma necessidade sim, de auxílio do governo: foram anunciados alguns programas, mas que ainda não foram implementados. Estamos esperando, ansiosamente, pela vez do mercado de exibição.
Sem a possibilidade de delivery (a exemplo de muitos ramos de comida), estamos numa das piores situações. Temos conseguido manter os funcionários, mas não há vendas de entradas de cinema. Temos mantido ajuste para a sobrevivência, com a dispensa de contratos. Sabemos de mecanismos a serem colocados em prática pelo BNDES e Ancine, e que, saídos da burocracia, poderão atender parte das salas brasileiras.
O Pronampe, voltado para as pequenas empresas, também atenderá à parcela de pequenos exibidores. A dificuldade está grande e, quanto mais tempo passa, maior fica o problema.
Sem a possibilidade de delivery (a exemplo de muitos ramos de comida), estamos numa das piores situações. Temos conseguido manter os funcionários, mas não há vendas de entradas de cinema. Temos mantido ajuste para a sobrevivência, com a dispensa de contratos. Sabemos de mecanismos a serem colocados em prática pelo BNDES e Ancine, e que, saídos da burocracia, poderão atender parte das salas brasileiras.
O Pronampe, voltado para as pequenas empresas, também atenderá à parcela de pequenos exibidores. A dificuldade está grande e, quanto mais tempo passa, maior fica o problema.
Como vê a dinâmica da distribuição de filmes, em meio ao novo coronavírus?
A desorganização do circuito exibidor é até natural: tendemos a otimizar o alinhamento entre exibidores e distribuidores. Os distribuidores ficam algo perdidos em onde alocar seus filmes. Há o problema das datas e ainda os protocolos futuros da reabertura das salas. Isso está em discussão, enquanto ansiamos pela reabertura.
Há soluções momentâneas como a dos cinemas em moldes drive-in, há ainda quem tenha apostado em lançar diretamente o filme em streaming. O esquema drive-in tem servido mais a retrospectivas do que aos lançamentos. Somos pela manutenção da janela dos filmes para exibição nas salas de cinema. Nosso streaming (pelo Espaço Itaú) favorecerá isso: faremos apenas pré-estreias.
Há soluções momentâneas como a dos cinemas em moldes drive-in, há ainda quem tenha apostado em lançar diretamente o filme em streaming. O esquema drive-in tem servido mais a retrospectivas do que aos lançamentos. Somos pela manutenção da janela dos filmes para exibição nas salas de cinema. Nosso streaming (pelo Espaço Itaú) favorecerá isso: faremos apenas pré-estreias.
O cinema vai acabar?
Vejo da perspectiva histórica: num dia de chuva, por experiência empírica, num primeiro momento, ninguém vai aos cinemas. No segundo, o público aumenta; no terceiro, explode. Além dos quesitos arte, gosto e diversão, o cinema é fora de casa, fora do ciclo primário, traz um mundo para o espectador.
A vida do cinema está ancorada nisso tudo. Num futuro, a não ser que haja naves espaciais, com possíveis encontros em Marte e Saturno; o ponto de encontro, o ponto de união, a vocação gregária leva aos cinemas. Mas, só o futuro definirá o que virá.
A vida do cinema está ancorada nisso tudo. Num futuro, a não ser que haja naves espaciais, com possíveis encontros em Marte e Saturno; o ponto de encontro, o ponto de união, a vocação gregária leva aos cinemas. Mas, só o futuro definirá o que virá.
O escurinho do cinema segue imbatível?
A primazia dada para a sala de cinema, no caminho de um filme, em trajetória inicial como produto, é respondido com um star system. Há a glória perceptível, fisicamente, com a presença do ator ou do diretor junto ao público. O artista vê a reunião das pessoas para usufruir de sua obra: coisa que o streaming não traz para o cineasta. Vivemos um grande momento de transição. Joga favoravelmente às salas de cinema a percepção real do artista de que ele é querido.
É a mesma diferença entre um festival virtual e um de presença. O cinema ainda repercute com números favoráveis. Exemplo é o Pantera Negra que, na primeira janela (do cinema), mais do que se pagou pela arrecadação de US$ 1 bilhão. Há "n" janelas futuras de lucro, inclusive o streaming. Nem todo mundo tem em casa um tamanho de tela, uma potência de som adequados a alguns filmes. O cinema tem muito tempo pela frente.
É a mesma diferença entre um festival virtual e um de presença. O cinema ainda repercute com números favoráveis. Exemplo é o Pantera Negra que, na primeira janela (do cinema), mais do que se pagou pela arrecadação de US$ 1 bilhão. Há "n" janelas futuras de lucro, inclusive o streaming. Nem todo mundo tem em casa um tamanho de tela, uma potência de som adequados a alguns filmes. O cinema tem muito tempo pela frente.
Que filmes destaca das pré-estreias em andamento a partir de hoje, no streaming?
Há filmes para todos os gostos. Ugo Giorgetti, em Dora e Gabriel, desponta com o lado cáustico dele, neste momento da pandemia. Vem na linha dos filmes anteriores como Boleiros e Sábado, mas mimetiza um pouco a evolução dos tempos no país. Já o Mangueira em 2 tempos é um belo documentário. Ana Maria Magalhães filmou, há 20 anos, crianças em Mangueira do amanhã, e retornou para constatar o futuro daquelas pessoas.
É muito bonito: mostra as perspectivas que pode ter um cidadão das comunidades no Brasil. É quase um retrato do país, né?
É muito bonito: mostra as perspectivas que pode ter um cidadão das comunidades no Brasil. É quase um retrato do país, né?