Duas famílias com a mesma configuração – pai, mãe e um casal de filhos – estão no centro do filme sul-coreano Parasita, sétimo longa de Bong Joon-ho (O hospedeiro e Okja). Vencedora, por unanimidade, da Palma de Ouro deste ano em Cannes (não há como duvidar de que é um dos favoritos ao Oscar de melhor filme internacional), a produção estreia nesta quinta (7), no cine Belas Artes.
Ainda que sejam semelhantes na formação, um abismo divide os Kim e os Park. Os Kim se amontoam num apartamento do subsolo. O que se vê da janela abaixo do nível da rua são pessoas urinando em lixeiras.
“Não fechem a janela. Assim teremos dedetização de graça”, afirma o pai, Ki-taek (Song Kang-ho, ator preferido de Bong Joon-ho, em seu quarto longa com o cineasta), em meio à nuvem de inseticida que infesta a casa depois de um homem dedetizar a rua.
Sem emprego e sem possibilidade de fazer com que os filhos cheguem à universidade, eles passam o dia tentando conseguir wi-fi gratuito para ter acesso ao WhatsApp – daí poderão entrar em contato com a funcionária da pizzaria que lhes garante alguns trocados para dobrar caixas de papelão.
O jovem casal Park vive em um outro extremo. Com os filhos – uma adolescente e um garoto, criança, hiperativo – ocupam a casa que pertenceu a um grande arquiteto, um dos maiores da Coreia do Sul. Dos metros quadrados de vidro daquela residência eles têm a vista inigualável de um jardim e uma floresta.
O jovem casal Park vive em um outro extremo. Com os filhos – uma adolescente e um garoto, criança, hiperativo – ocupam a casa que pertenceu a um grande arquiteto, um dos maiores da Coreia do Sul. Dos metros quadrados de vidro daquela residência eles têm a vista inigualável de um jardim e uma floresta.
Quando o jovem Kim ascende socialmente ao se tornar professor de inglês da adolescente Park, o início da ocupação se dá. Cada um dos Kim, de forma criativa, vai se introduzindo na mansão. Mentem, forjam documentos, criam situações adversas para os antigos empregados de forma maquiavélica. Os novos patrões, no momento inicial, estão encantados com os novos funcionários.
“Eles são ricos, mas ainda assim legais”, diz Chung-sook (Jang Hye-jin) ao marido. Ki-taek logo a corrige: “Eles são legais porque são ricos.” Mais tarde, a mulher, observando o mundo dos Park, afirma: “Se tivesse isso tudo, eu seria uma pessoa mais gentil.”
Além da narrativa absolutamente original, Parasita prende o espectador pelos detalhes. Bong Joon-ho explora seus temas não apenas por meio de falas e ações dos personagens. Cada detalhe visual dialoga com a história. A partir de certo momento, os personagens se movem sorrateiramente, como insetos. A casa dos Park é perfeita apenas na superfície – há, naquela residência monumental, todo um universo subterrâneo, sujo, solitário, à margem.
Ao explicar a escolha unânime em premiar a produção sul-coreana, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu, presidente do júri de Cannes, afirmou: “Este filme nos levou a diferentes gêneros, falando de maneira engraçada, divertida e sem julgamento de algo tão relevante e urgente.”
A primeira parte de Parasita é narrada em tom de humor negro. Os Park, ensimesmados em sua vida de comercial de margarina, beiram a boçalidade. Os Kim, cientes da própria necessidade de sobrevivência, ao contrário. Com astúcia, enredam a próspera família, fazendo com que os Park dependam deles.
Ainda que o grande tema de Parasita seja a desigualdade social, a proteção da família é o que move os personagens. Ameaçados, cada um deles – ricos e pobres – faz de tudo para salvar os seus. E Parasita explode na segunda parte, ganhando lances dramáticos com elementos de horror, principalmente na sequência final.
A colisão desses dois mundos nos leva a perguntar, mais de uma vez: afinal, quem são os parasitas?