"Por alguns anos, eu precisei fazer alguns planos B para levantar dinheiro ao plano A, que são as coisas que desejo fazer para viver, meus projetos de vida. Faz parte e construíram meu caminho até aqui", conta Thomás, sobre experiências anteriores.
Em Bacurau, Pacote é um sujeito famoso na região em busca de redenção diante do seu histórico de violências e transgressões televisionadas. Com a ameaça estrangeira, o personagem lidera um plano de resistência junto a Lunga e demais membros do povoado.
“Eu tremo na base para escolher essas palavras quando falo de Bacurau. Pacote foi muito importante para mim e, desde que recebi o convite, soube que precisava abraçar esse filme com todas as minhas forças. A projeção que ele tem e a temática que ele traz estão sendo superimportantes para a minha carreira e me dão uma visibilidade grande. É muito bom ver que as pessoas estão conhecendo o meu trabalho.”
"Minha primeira experiência com atuação foi no teatro, aos 20 anos, com O grande circo místico. Era 2006, eu vi o anúncio no jornal e resolvi arriscar”, conta o ator de 33 anos. As primeiras apresentações renderam críticas negativas à sua atuação.
“Eu ouvi coisas bem ruins, a maioria dizendo que a peça não estava indo bem e que a culpa era da minha atuação.
A carreira no teatro reúne ainda os espetáculos Ópera do malandro, Gonzagão - A lenda e Gabriela, dirigidos por João Falcão. Em 2011, Thomás enveredou pelo audiovisual, com papel de figurante em Febre do rato, de Cláudio Assis, e participações em Tatuagem, de Hilton Lacerda, e Praia do futuro, do cearense Karim Aïnouz.
“Estou gostando muito de trabalhar com filme e séries. São estilos diferentes, mas desafiadores”, disse o ator, que também reúne atuação na segunda temporada da série 3%. Os filmes Serial Kelly, de René Guerra, e Todos os mortos, de Marcos Dutra e Caetano Gotardo, são seus próximos lançamentos, aguardados para este ano.
Thomás acabou de terminar as gravações da série Boca a boca, nova produção brasileira da Netflix em parceria com a produtora paulista Gullane e dirigida por Esmir Filho. Por questões contratuais, o ator não pode falar muito sobre o seu personagem.
O enredo explora a dinâmica das relações de uma juventude hiperconectada de uma sociedade pacata que é afetada por uma doença contagiosa espalhada pelo beijo. Na agenda do artista, estão previstos mais dois filmes, que serão gravados ainda neste ano na Bahia.
Confira a entrevista:
Como recebeu o convite para atuar em Bacurau?
Estava na casa do meu irmão em Curitiba, era uma segunda-feira, e recebi ligação de Leo Lacca, o preparador de elenco de Bacurau, me convidando para participar. Ele me conhecia do filme Paterno, de Marcelo Lordello, que ainda será lançado. Tinha gostado do meu trabalho e sugeriu meu nome num brainstorm. No dia seguinte, já fiz teste e no outro me deram resposta positiva. Quando eu vi, já estava em um jantar com Kleber e Juliano e na outra semana em Parelhas. Foi tudo muito rápido. Depois de três meses de filmagem, eu chorei igual a uma criança.
Quem é Pacote e quem é Acacio? Como você encara essa dualidade do personagem?
Pacote e Acácio são um só, mas têm uma complexidade de pensamentos. O que é bonito nele é que é um típico herói do western, que fez coisas erradas em um passado sombrio e busca redenção quando vê que a violência não é o caminho. Nesse momento, ele quer ser Acácio e se libertar do passado como Pacote. Mas, quando o caminhão de água chega furado de bala e os forasteiros aparecem em Bacurau, ele percebe que precisa voltar a ser Pacote.
Ele revisita o passado, mas vai buscar a ajuda de Lunga para que ele não precise ser quem ele era antes. Foi um desafio para mim, precisei me preparar para o personagem. Juliano Dornelles me indicou o filme Os imperdoáveis, de Clint Eastwood, clássico western. Também vi alguns documentários de presidiários e peguei algumas referências.
O que Bacurau diz sobre o Brasil de hoje?
O filme fala tanta coisa boa, tem clareza e cunho social e político muito forte. Bacurau tem várias camadas e representa muito daquilo que você pode ver e ouvir. Os corpos nus em cena questionam preconceito com os corpos, a marginalização das mulheres prostitutas e a superioridade que povos do Sul do país acham que têm sobre o Nordeste.
Uma das cenas mais marcantes de Bacurau evidenciam um olhar estereotipado em relação ao Nordeste. Como é ser um pernambucano morando em São Paulo?
Eu acho que o Nordeste é massacrado no Brasil. A palavra é forte, mas eu quero dizer que somos um povo muito discriminado. A migração dos nordestinos para a região ajudou a construir cidades como São Pau lo, por exemplo, mas até hoje ainda não há esse reconhecimento. Não quero dizer que somos melhores, mas depois de tudo que já fizemos pelo país, ainda somos os que passam fome e sede.
Estou há dois anos morando em São Paulo, já sofri preconceito de várias formas. Em trabalhos, me pediam para neutralizar o sotaque. Cheguei a ouvir “na Bahia, vocês não conseguem fazer um sotaque melhor?” Cara, eu sou pernambucano. Parece que, para muitos, Pernambuco, Bahia e Paraíba são a mesma coisa. E tenho certeza que não peguei trabalhos por conta disso.
Qual espaço Pernambuco ocupa na sua vida?
Eu amo Pernambuco. Eu moraria no Recife, mas infelizmente precisei sair devido à escassez de investimento, principalmente no teatro.
O que falta para Pernambuco viver de arte?
Um olhar do governo. O Cinema São Luiz está resistindo e é um cinema de rua, muito bem equipado, mas muita gente acha perigoso, tem muito preconceito envolvido. O Teatro do Parque, que foi tão importante para a cidade, está abandonado. O governo precisa olhar as relíquias da cidade com cuidado. Estou sentindo que Recife está virando uma cidade empresarial, mas está esquecendo da arte. É preciso fomentar os artistas locais e promover espetáculos e sessões a preços populares..