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Suas filmagens deveriam ter começado em 2012, mas, um pouco antes, 70% da estação brasileira foi destruída pelo fogo. Dois anos depois, o projeto foi retomado, mas os imprevistos continuaram. Na primeira viagem, Julia embarcou num navio da Marinha do Brasil com um diretor de fotografia e um técnico de som, na expectativa de passar 20 dias na base, então instalada em módulos emergenciais. Acabaram ficando só cinco. Uma anomalia meteorológica fez campos de gelo se formarem antes do previsto e obrigou a equipe a passar 15 dias esperando em Puerto Williams, Chile.
Na segunda viagem, o trio voou até a Antártida de Hércules da FAB, mas, por um problema técnico, o avião não conseguiu pousar e teve de retornar. No segundo voo, o pouso finalmente ocorreu na base antártica chilena, mas, como já não havia mais condições meteorológicas de navegar até a estação brasileira, a solução foi pegar o navio de volta para a América do Sul. Só na terceira viagem, sete meses depois, é que a meteorologia ajudou e as filmagens na Antártida saíram conforme o planejado. "Lá é um lugar muito difícil para se fazer planos porque as coisas podem mudar de uma hora para outra", resume Julia. "É desgastante para o trabalho, mas ao mesmo tempo faz parte do projeto."
Para os militares do Endurance, o tempo parado no Chile significou um período menor de adaptação antes de todos irem embora e eles ficarem sozinhos para "invernar" na base. O documentário mostra os 14 homens e uma mulher se despedindo das famílias no Rio de Janeiro e depois, já na estação antártica, suas primeiras impressões sobre a região e as formas que foram adotando para lidar com a distância da família.
Um militar conta no documentário sobre o silêncio e "vazio tremendo" que sentiu quando apenas o grupo ficou na estação. A médica Fátima Oladejo - única mulher do grupo - lembra do impacto ao ver a Baía do Almirantado congelada.
Os dois navios polares da Marinha que dão apoio à estação - o Ary Rongel e o Almirante Maximiano - só navegam pela área entre outubro e março, no chamado verão antártico. Depois, cabe ao grupo-base manter a estação funcionando até que chegue nova equipe para substituí-lo. Nos meses de isolamento, o contato com o exterior se reduz principalmente a rádio e internet - que hoje tem conexão 4G, mas na época da gravação era bem ruim.
Julia conta que no inverno ainda falava com integrantes do Endurance por telefone. E deixou uma câmera para que filmassem sua rotina. No final, muitos acabaram lhe entregando imagens, mas feitas no celular. Juntos, esses registros amadores constituem uma das partes mais curiosas do documentário. O espectador pode ver, por exemplo, os 4 oficiais e 11 praças jogando futebol e fazendo churrasco no gelo. E se surpreender com a fartura do cardápio do "Arraiá do Endurance". Também tem a chance de acompanhar o Hércules atirando de paraquedas pacotes com produtos pessoais enviados aos militares pelas famílias e alimentos perecíveis, como frutas e legumes.
Outro ponto interessante são as reações pós-isolamento. Embora haja grande expectativa no grupo sobre o retorno dos navios e dos visitantes, quando eles finalmente chegam, a sensação muitas vezes é inversa, de invasão do espaço. A última cena mostra os militares sendo recebidos de volta pelas famílias. Amanhã, muitos deles devem se reencontrar no Rio, para ver a pré-estreia do documentário.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.