Do volante para o set de filmagens é, literalmente, um pulo. O motorista Marcos Antônio Vieira da Silva Júnior, de 40 anos, mais conhecido como Jamanta – por conta de seu porte físico – nem se lembra da primeira vez em que deixou os bastidores e foi convocado para fazer uma ponta em uma produção audiovisual. Aliás, já perdeu as contas de quantas foram. “Acredito que, pelo fato de eu estar nesse ramo há muito tempo, há mais de 20 anos, e por eu ser muito brincalhão e ter facilidade de me expressar, os diretores acabam me chamando e me encaixando em alguma cena”, diz.
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O elenco foi todo formado por atores mineiros, como Bárbara Colen – que despontou para o grande público em Aquarius (2016), de Kleber Mendonça Filho, e está em Bacurau, também do diretor pernambucano, cuja estreia será no Festival de Cannes neste mês – Germano Melo, que atuou em longas como Elon não acredita na morte (2016) e As boas maneiras (2017).
“Apesar de não ter nenhuma fala, eu aparecia à frente do grupo de Folia de Reis, segurando um estandarte de Nossa Senhora Aparecida. Eu dançava, comandava os festejos.
NETFLIX
Ele também já tem sentido a repercussão de outro trabalho, o filme Temporada, do diretor André Novais Oliveira, lançado no começo deste ano. No longa, Jamanta chegou a ter uma fala numa sequência rodada em um churrasco. “Pelo fato de o filme estar na Netflix, imagino que muita gente vai ver e comentar. Até de outros países.
Mas foi em Arabia, dos diretores Affonso Uchoa e João Dumans, que ele teve um de seus principais momentos na telona. O roteiro conta a história de um operário que, em uma fábrica de alumínio em Ouro Preto, encontra o diário de um trabalhador que sofreu um acidente. Jamanta foi chamado às pressas para a produção para fazer um caminhoneiro, pois o ator escalado não sabia dirigir.
“A produção sugeriu para os diretores: ‘Será que o Jamanta não pode ser um plano B?’. E eles responderam: ‘Ele é o plano A mesmo’ (risos). Meu personagem dava carona para o protagonista e eu cheguei a falar também na cena. Mesmo já tendo feito tantas pontas, ainda dá um frio na barriga. Enquanto me chamarem eu vou fazer. Quem sabe até não faço mais para a frente um curso de interpretação.”
COLABORAÇÃO
Marcos Antônio não é o único motorista que trabalha com produções audiovisuais e que tem se aventurado na sétima arte.
“Num set de filmagem, todo mundo fica muito próximo e todos querem colaborar da melhor forma possível. Por isso, acaba acontecendo de alguém ser deslocado de sua função original e fazer outra coisa”, diz o produtor.O sobrinho de Jamanta, Marcus Vinicius da Silva Pires, de 22, o Transa, por indicação do tio, começou a dirigir carros e vans que transportam a produção e os equipamentos de cinema há três anos. E também já está dando as caras na telona. A estreia no novo emprego foi em No coração do mundo, de Gabriel Martins Alves e Maurílio Martins, filme selecionado para o Festival Internacional de Cinema de Roterdã, na Holanda, no começo do ano e que deve chegar aos cinemas brasileiros no segundo semestre.
“Estava lá meio de bobeira, sem fazer nada e me perguntaram se eu poderia ser um segurança de um condomínio. Fiquei meio travado, mesmo sendo algo muito pequeno, mas depois a coisa fluiu”, conta. Já em Temporada ele admite que estava mais enturmado, sobretudo pelo fato de o longa contar com praticamente a mesma equipe do primeiro trabalho.
Em Temporada, Marcus teve não apenas uma cena, mas uma sequência com direito até a diálogo. O carro de seu personagem estraga no meio da estrada e ele o empurra, enquanto Juliana, papel de Grace Passô, tenta fazer o veículo funcionar. “Na história, a gente estava indo para uma cachoeira. Teve também uma festa e outras coisas.
EXTRA
Quem também ganhou um extra em Arabia foi o motorista Márcio Silveira, de 53. Assim como Marcus Vinícius, ele uniu os dois ofícios na produção de Affonso Uchôa e “atuou” como um caminhoneiro que está em um bordel frequentado pelo protagonista, interpretado por Aristides de Sousa. “Na cena, eu até converso com uma das atrizes. Fiz esse trabalho com o coração. O pessoal do filme é sensacional. Foi quase uma família, já que convivemos mais de 60 dias”, diz.
Márcio diz que é muito comum os motoristas quebrarem o galho quando falta alguém ou quando o ator não tem muita intimidade com carros.
“Ainda mais no nosso caso, em que a gente transporta as pessoas e fica ali no set, meio ocioso. Sempre acontece de fazer uma figuração ou até algo de mais destaque”, diz. Não só longas, mas curtas e documentários fazem parte de seu currículo. Mas, sobretudo, filmes institucionais e comerciais. “Não tenho preferência, mas faço mais publicidade. Filme é mais light e comercial é muito mais correria. Fiz muita coisa para governo, bancos, associação de município e até marcas grandes de eletrodomésticos. E, como os comerciais têm muita visibilidade, são exibidos várias vezes, a gente acaba sendo até reconhecido”, conta Tom, que, no momento, está na região de Pirapora, trabalhando no longa-metragem Saudade, uma coprodução Brasil–Guiné Bissau. “Por enquanto, só estou como motorista e fornecendo meus veículos. Mas, se pintar uma ponta, faço com certeza. Acho bem divertidas essas participações.”.