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Assim que Cristina vai embora, a já frágil relação de Joaquim e Nina se deteriora. A menina se vê obrigada a amadurecer quando a morte de um colega de trabalho transtorna o pai. E, acreditando ter poderes sobrenaturais, Dalva faz de tudo para tentar reunir sua família.
“É um filme que fala sobre perdas. O homem tem pavor de perder o emprego; a criança, de perdê-lo, pois é a única coisa que ainda tem”, diz Gabriela, que, em sua carreira (ela dirigiu também sete curtas, além dos dois longas), vem trabalhando no cinema de gênero. “Comecei a assistir a filmes de horror e terror antes de aprender a ler, pois cresci nos anos 1980 e a exibição (desse tipo de produção) na TV aberta era extensa. Não sei dizer em que momento, mas eles acabaram compondo a minha sensibilidade. Se há uma história, preciso contá-la via elemento do medo, da tensão.”
A sombra do pai embrenha pelo caminho do sobrenatural por meio da história de Dalva, que parece se comunicar com forças da natureza. Há também um quê de zumbi no personagem Joaquim, um homem que vai se distanciando de tudo e de todos a tal ponto que se torna uma espécie de morto-vivo. Na parte final da narrativa, o filme ganha ares de Frankenstein. Mas a trama, a despeito das referências, se encaminha de forma bastante sutil, por vezes introvertida.
“Nunca conto minhas histórias começando pelo gênero. Histórias, para mim, são os personagens. Todos os filmes são de algum gênero. E isso envolve uma construção estratégica na qual as emoções dos personagens são ferramentas”, diz ela, que acredita que a influência do cinema fantástico na produção autoral brasileira contemporânea – em longas como As boas maneiras (2018), de Juliana Rojas e Marco Dutra, Quando eu era vivo (2014), de Dutra, e O segredo de Davi (2018), de Diego Freitas – é algo de geração.
“A gente já passou pelo manifesto do Cinema Novo, que negava o cinema norte-americano e o cinema de gênero, considerado alienante. Mas os cineastas de hoje já tiveram esse ‘problema’ terraplanado pelos anteriores. Hoje temos a liberdade de brincar com o gênero sem pudor, já que a ideia não é reproduzir o cinema americano, mas entender como fomos influenciados por ele”, afirma a diretora.
A sombra do pai seria o primeiro longa-metragem de Gabriela, que começou a trabalhar no projeto há oito anos. “Quando ganhei o Fundo Setorial do Audiovisual, uma verba da Ancine (Agência Nacional do Cinema) destinada a primeiros filmes, descobri que levaria um ano para que ela fosse liberada. Só que eu não queria ficar debruçada neste projeto durante aquele ano.”
O ano, no caso, era 2015, no período que antecedeu o impeachment da presidente Dilma Rousseff. “Havia no ar uma violência e uma revolta grandes. Do incômodo desse período surgiu O animal cordial, filme em que pude expressar o que estava sentindo naquele período.” Protagonizado por Murilo Benício, o longa de estreia de Gabriela mostra um banho de sangue depois que um restaurante de classe média de São Paulo é invadido por dois ladrões. A sombra do pai não tem nada do tom explícito que marcou o horror do filme de 2017.
TESTE “Vendo em retrospectiva, não teria sido legal filmar A sombra do pai naquele momento”, avalia Gabriela. Rodado pouco depois que ela terminou O animal cordial, o novo longa destaca a performance de Nina Medeiros. A atriz, que participou também de As boas maneiras, tinha 8 anos quando fez o papel. Foi selecionada em teste do qual participaram aproximadamente 300 crianças.
“A Nina, além de ser muito expressiva, era incansável. Para uma criança, é um negócio pesado esse de fazer um filme, pois o set é um lugar de muita concentração e longas esperas. Fizemos uma força-tarefa para que ela nunca ficasse sem ter o que fazer, mesmo quando fazíamos cenas que não eram com ela”, conta a diretora.
Mestre em literatura e cinema de horror pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), com especialização em roteiro pela Escuela Internacional de Cine y TV de San Antonio de los Baños, em Cuba, Gabriela já escreveu para outros diretores. Foi corroteirista do supracitado Quando eu era vivo. Também trabalhou recentemente com Walter Salles no roteiro do curta A terra treme (2017). O drama, que tem como mote o rompimento da barragem de Bento Rodrigues, integra uma antologia de pequenos filmes dirigidos por cineastas de diferentes países.
“Escrita, para mim, é igual. A história é gestada da mesma maneira caso seja filmada por mim ou por outros. Só que tendo a escrever menos (para terceiros), já que, para um escritor, é muito frustrante escrever e não ter afinidade com quem vai dirigir o projeto. Mas um diretor com quem com certeza vou voltar a trabalhar é o Walter Salles, pois ele expande a minha sensibilidade.”
Por ora, no entanto, Gabriela só tem olhos para um novo filme. O lançamento comercial de A sombra do pai está sendo feito em meio à produção de seu terceiro longa. Em setembro, terão início as filmagens de A cadeira escondida. Produzido por Rodrigo Teixeira, da RT Features, também a produtora de seus dois primeiros filmes, a narrativa vai tratar de exorcismo. No elenco estão Júlia Lemmertz e Camila Márdila. Mais a diretora não fala.
“Comecei a assistir a filmes de horror e terror antes de aprender a ler, pois cresci nos anos 1980 e a exibição (desse tipo de produção) na TV aberta era extensa. Não sei dizer em que momento, mas eles acabaram compondo a minha sensibilidade. Se há uma história, preciso contá-la via elemento do medo, da tensão”
“A gente já passou pelo manifesto do Cinema Novo, que negava o cinema norte-americano e o cinema de gênero, considerado alienante. Mas os cineastas de hoje já tiveram esse ‘problema’ terraplanado pelos anteriores. Hoje temos a liberdade de brincar com o gênero sem pudor, já que a ideia não é reproduzir o cinema americano, mas entender como fomos influenciados por ele”
Gabriela Amaral Almeida,
cineasta