“Farejo vergonha, culpa, raiva. Sinto essas coisas e ligo os pontos.” É assim que a policial Tina (Eva Melander) explica para sua superiora hierárquica como ela consegue, apenas observando os passageiros que circulam pela área de controle aeroportuário, encontrar o que eles tentam esconder, desde garrafas de bebida alcoólica até um pen drive com imagens de pedofilia.
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Quando se depara com Vore (Eero Milonoff), que ela julga ser portador da mesma anomalia cromossômica, Tina experimenta o embaralhamento dos sentidos. A policial fareja algo errado com ele, a mulher quer tê-lo cada vez mais perto.
Abbasi conta essa história – que ele escreveu em parceria com John Ajvide Lindqvist, autor do conto no qual o filme se baseia, e Isabela Eklof – no tom do suspense. Há uma permanente tensão assinalada pelo diretor com seus enquadramentos e cores, com a trilha sonora e também com a incômoda posição dada ao espectador de nunca saber exatamente o que Tina vê (nos outros) ou o que ela deixa de perceber (em Vore).
Durante o Festival de Cannes, Abbasi atribuiu, não sem razão, a maior parte do sucesso do filme ao desempenho de Eva Melander. “Mesmo atuando com uma máscara de silicone, ela consegue ser mais expressiva do que muita gente sem máscara”, afirmou. Mas são evidentes também os méritos do cineasta na direção dos demais atores e na coesão que consegue dar a uma narrativa em que elementos fantásticos são tratados pelo prisma do realismo.
É também muito habilidoso o uso que Abbasi faz de elementos da natureza (larvas, insetos, alces, um lago, um bosque, uma tempestade) na trama, sublinhando o aspecto da animalidade, subjacente à “anomalia” de Tina e Vore, em contraste com a “normalidade” dos demais personagens, incluindo o pai de Tina, que ela visita frequentemente numa instituição hospitalar para idosos.
Na discussão definitiva entre o casal de protagonistas, Tina questiona Vore se “é humano não querer prejudicar ninguém”, deixando claro que Border é um conto muito bem contado sobre a origem do mal..