Casado, pai de dois filhos e com uma depressão que o derruba todas as manhãs no sofá da sala, Bertrand (Mathieu Amalric) acha que a vida é “redonda” apenas na infância – quando tudo desliza facilmente – e quadrada depois dela, quando os horizontes (e as alegrias) vão se fechando num espaço apertado e de difícil manejo. É nesse ponto de desesperança que o protagonista de Um banho de vida se apresenta ao espectador – e começa a conquistá-lo.
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Sem rumo e sem saber exatamente por que, Bertrand se candidata a integrar uma equipe de nado sincronizado. Os treinos na piscina e a sauna depois deles passam a arrancá-lo com frequência do sofá e, mais do que isso, colocá-lo em contato com uma treinadora que sofre por amor e um grupo de homens que sofre pela falta dele – nem sempre no papel de marido, mas também no de pai ou filho. O insucesso nos negócios, a insegurança financeira e o medo da velhice são outros temas nas conversas do time, tidas sob o (impraticável) compromisso de que não julguem uns aos outros, apenas se ouçam.
O roteiro de Um banho de vida é cheio de méritos e tem a esperteza de narrar uma história sobre homens que tira partido do ambiente feminista desta segunda década do século 21, evitando demonstrações da “masculinidade tóxica”. Bertrand e seus companheiros têm crises de insegurança, tremem (literalmente) de medo, intimidam-se diante de mulheres determinadas, escolhem praticar um esporte associado ao universo feminino e aos requisitos da “graça e elegância”, como pontua uma das treinadoras, e sofrem nas mãos da outra, que age como um impiedoso carrasco.
IRONIA
Além de tratar dos homens como o sexo frágil, o longa se permite ser brincalhão e autoirônico, como na sequência em que imita 8 homens e um segredo. Referências oitentistas – como nas cenas de treinamento em compasso com a rotina de trabalho, à la Flashdance, embaladas por Physical, o hit de Olivia Newton-John – são usadas como um recurso para deixar o espectador com um sorriso nos lábios.
A ideia do grupo de amadores de se inscrever numa disputa internacional de nado sincronizado é o mote para o filme não desacelerar depois da apresentação de cada um dos personagens e seus principais conflitos. Na discussão que precede a decisão de competir, o mais amargo dos integrantes do time se opõe, deixando claro que acha ridículo e enganoso o objetivo de perseguir uma medalha. “Todos nós precisamos de uma medalha”, decreta a técnica.
A partir dali, não há mais dúvidas de que a medalha é o símbolo do reconhecimento de algum valor que esse grupo de pessoas fracassadas necessita, mesmo que não queira admiti-lo. E o “campeonato mundial” de nado sincronizado é seu equivalente do sonho olímpico. O filme se encaminha inequivocamente para mostrar como os patinhos feios exibirão sua plumagem de cisne na piscina.
Fiel à fórmula das comédias dramáticas, Um banho de vida tem, portanto, momentos feitos para comover e Lellouche nem sempre faz questão de esconder a mensagem positiva que seu filme carrega – nesse caso, um elogio da força e da capacidade transformadora da amizade. Pois, ao final, o antes irremediavelmente depressivo Bertrand já não está tão certo de que a felicidade na vida adulta é algo tão impossível quanto a quadratura do círculo.