'Roma' tinha 10 indicações e era considerado favorito. Mas 'Green book - O guia' roubou a cena e conquistou o Oscar de melhor filme, na 91ª cerimônia do Oscar, neste domingo (24). O filme mostra um motorista branco de origem italiana conduzindo um pianista negro pelo Sul segregacionaista dos Estados Unidos nos anos 1960 e foi alvo de polêmicas (leia aqui).
A distribuição dos prêmios foi equilibrada, com o maior número de estatuetas (quatro) indo para "Bohemian Rhapsody". "Roma", "Green book" e 'Pantera Negra" ganharam três cada um; enquanto "Infiltrado na Klan", "A favorita", "Nasce uma estrela", "Vice" e "Se a Rua Beale falasse" tiveram um.
Confira como foi:
A noite era do cinema, mas começou com música. Mais precisamente, com rock'n'roll. O Queen abriu a 91ª cerimônia de entrega do Oscar com We will rock you, que emendou com We are the champions.
A banda foi escalada para se apresentar depois que Kendrick Lamar anunciou, nesta semana, que não teria condições técnicas para cantar durante o Oscar All the stars, a canção indicada por Pantera Negra. Esse foi apenas mais um dos muitos tropeços enfrentados pela organização, que, desde 2017, anunciou e recuou de diversas decisões – como a inclusão de uma categoria de melhor filme popular, a apresentação de apenas duas das canções originais e a entrega de alguns dos principais prêmios durante o intervalo comercial.
Todas as medidas tinham o objetivo de reduzir a duração da cerimônia de três horas e meia para três horas e reverter a queda de audiência que se observa nos últimos anos e atingiu o pior índice da história da premiação no ano passado.
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Logo em seguida à apresentação do Queen, um trio de comediantes (Maya Rudolph, Tina Fey e Amy Poehler) tomou o palco para anunciar a vencedora do primeiro prêmio da noite (melhor atriz coadjuvante). As atrizes fizeram ironia com as polêmicas que envolveram o Oscar e deram uma pitada política à sua introdução.
A primeira vitória da noite foi de Regina King, pelo papel da mãe da protagonista de Se a Rua Beale falasse. Em seu discurso de agradecimento, Regina fez um emocionado agradecimento à própria mãe e não se esqueceu de mencionar as concorrentes, numa disputa que foi especialmente forte _Rachel Weisz e Emma Stone, por A favorita, e Marina De Tavira, por Roma.
Na sequência, o documentário Free solo, sobre um escalador radical, venceu em sua categoria. E Vice levou seu primeiro (e único) prêmio da noite, por maquiagem. Pantera Negra levantou o auditório ao vencer, na sequência, com o figurino de Ruth Carter, que se tornou a primeira mulher negra a vencer nessa categoria e, do palco, fez uma saudação ao diretor Spike Lee, indicado por Infiltrado na Klan.
“Pantera Negra” ganhou também o Oscar seguinte, de direção de arte.
“Roma”, considerado favorito em quase todas as 10 categorias que disputa, confirmou o favoritismo na primeira a ser anunciada. Alfonso Cuarón receber o troféu de melhor fotografia e agradeceu em especial ao fotógrafo de seus filmes anteriores –Emmanuel Lubezki. “Billy Wilder tinha uma placa em seu escritório que dizia: 'O que Lubitsch faria?'. Eu me pergunto: O que Emmanuel Lubezki faria?”.
Para contar a história do ano de sua infância no qual seus pais se separaram e seu país esteve às bordas da convulsão social, Cuarón assumiu pessoalmente quase todas as funções do longa _além da direção e da fotografia, ele assina o roteiro e a edição de “Roma”.
Com uma divisão equilibrada de prêmios durante o primeiro bloco, “Bohemian rhapsody” desequilibrou no segmento seguinte, levando dois prêmios na sequência – melhor edição de som e melhor mixagem de som.
O ator Javier Bardem, ao lado de Angela Basset, falou espanhol para anunciar o melhor filme estrangeiro, “celebrando línguas e culturas diferentes”. E, juntos, Bardem e Basset leram no envelope o nome de “Roma”, o que deu a Alfonso Cuarón a chance de fazer seu segundo discurso da noite.
Ele afirmou que cresceu vendo filmes estrangeiros e disse que “os indicados de hoje provam que somos parte do mesmo oceano”. Agradeceu à sua família e ao México por serem “a praia de onde vem esse filme”.
O ator mexicano Gael García Bernal, cujo primeiro grande sucesso internacional foi "E sua mãe também" (2001), de Cuarón, lançado um ano depois de "Amores brutos", de Alejandro González Iñárritu, comemorou no Twitter a vitória do compatriota.
Diego Luna, o companheiro de elenco de García Bernal em "E sua mãe também", que atua em "Se a Rua Beale falasse" e foi escalado como um dos apresentadores da noite, não esperou para entrar no clima de comemoração.
Com o troféu de melhor montagem, “Bohemian rhapsody” ganhou sua terceira estatueta. “A gente sobe aqui e dá um branco”, disse o editor John Ottman. “Acho que Freddie Mercury nos reuniu. Então tenho que agradecê-lo. Estou vendo (o ator) Rami (Malek, intérprete do vocalista) bem aqui na minha frente. Tenho que agradecê-lo. Como Freddie dizia: 'Boas palavras e bons pensamentos'.”
Daniel Craig e Charlize Theron anunciaram o prêmio de melhor coadjuvante, que foi para Mahershala Ali, pelo personagem de Don Shirley em “Green book – O guia”. É o segundo Oscar do ator, que venceu também em 2017 por “Moonlight”. Antes de subir ao palco, ele abraçou Viggo Mortensen, que interpreta o protagonista do filme.
Ele, por fim, dedicou o prêmio à sua avó, "que está no meu ouvido o tempo inteiro, dizendo que, se não der certo da primeira vez, para eu continuar tentando".
“Homem-Aranha no Aranhaverso” confirmou seu favoritismo e levou o troféu de melhor longa de animação. Nessa categoria, o brasileiro “Tito e os pássaros” chegou a estar entre os nove pré-selecionados, mas não ficou entre os cinco finalistas. De toda forma, “Homem-Aranha no Aranhaverso” era considerado imbatível desde sua estreia.
"Bao" levou o Oscar de melhor curta de animação. E o melhor curta documental foi "Absorvendo o tabu", de Melissa Berton e Rayka Zehtabich, sobre o tabu da menstruação numa região da Índia.
Muito emocionada, Rayka disse: "Estou chorando porque não acredito que um filme sobre menstruação acabou de ganhar um Oscar". Ela agradeceu expressamente à Netflix por produzir o curta, fazendo a primeira referência direta ao papel da gigante do streaming no cenário do audiovisual. O assunto é motivo de uma grande polêmica.
“O primeiro homem”, sobre o astronauta Neil Armstrong (Ryan Gosling), levou o Oscar de efeitos visuais, o que é praticamente um prêmio de consolação para o longa sucessor do tão festejado “La la land”, de Damien Chazelle.
E o primeiro aplauso de pé da noite foi para o dueto de Lady Gaga e Bradley Cooper em "Shallow". Considerado por muitos críticos como injustiçado por não ter sido indicado a melhor diretor, Cooper cantou bem e foi, junto com Gaga, responsável por um dos bons momentos da noite.
O melhor curta foi "Skin", do casal Guy Nattiv e Jaime Ray Newman, que dedicou o prêmio ao filho de cinco meses, desejando que ele viva num mundo com menos preconceito. Nessa categoria havia o polêmico competidor "Detainment", sobre o assassinado de um garoto britânico por dois meninos.
"Green book - O Guia" levou sua segunda estatueta pelo roteiro original (Nick Vallelonga, Peter Farelly, Bryan Currie). Nick é filho do personagem interpretado por Viggo Mortensen, o motorista branco de origem italiana que conduz o pianista negro pelo Sul segregacionista dos EUA nos anos 1960. A família do pianista Doctor Shirley contesta a história, dizendo que as memórias são fantasiosas e que a amizade retratada no longa jamais existiu _apenas uma rápida relação de trabalho entre os dois.
O auditório se levantou uma segunda vez para aplaudir, quando foi anunciado o primeiro prêmio para “Infiltrado na Klan”, de Spike Lee, por roteiro adaptado.Veja como ele subiu animado ao palco:
“Não desliguem esse microfone!”, disse Lee, antes de fazer o discurso de tom mais abertamente político da noite, em sintonia com seu filme, que é um petardo anti-Trump, baseado na história real do policial negro que se infiltra na Klu Klux Klan com a ajuda de um parceiro branco.
Com notas num papel, Lee contou a história de sua família, citou os ancestrais “trazidos escravizados da África” e o esforço das gerações anteriores para contornar a pobreza e permitir que ele acabasse estudando cinema.
“Quero exaltar os ancestrais que construíram este país. Estamos quase chegando à próxima eleição. Vamos nos mobilizar. Vamos fazer a escolha moral entre o ódio e o amor. Vamos fazer a coisa certa!, disse, referindo-se ao grande sucesso do início de sua carreira (“Do the right thing). Vocês sabem que eu tinha que dizer isso”, afirmou, para um auditório que o aplaudia novamente de pé.
Na sequência do poderoso discurso de Spike Lee, "Pantera Negra" levou sua terceira estatueta, por trilha original.
E o anúncio de melhor canção original conduziu Lady Gaga de volta ao palco. Muito emocionada e chorando, ela agradeceu: "Não se trata de ganhar. Trata-se de não desistir!". O Oscar de "Shallow" foi o primeiro (e único) Oscar de "Nasce uma estrela".
O maestro venezuelano Gustavo Dudamel regeu a Orquestra Filarmônica de Los Angeles durante a homenagem aos artistas mortos no último ano. O cineasta brasileiro Nelson Pereira dos Santos (1928-2018) foi incluído na lista das despedidas.
Não houve tempo para que a Academia incorposse aos homenageados o diretor Stanley Donen ("Cantando na chuva"), cuja morte foi anunciada no sábado (23). O anúncio do falecimento de Donen fez com que muitos prestassem tributo à sua brilhante carreira e citassem seu discurso de agradecimento do Oscar honorário como exemplo de uma época em que o a cerimônia do Oscar era bem mais interessante.
Veja:
O prêmio de melhor ator foi para Rami Malek, que já havia vencido o Globo de Ouro, assim como Christian Bale (o Globo de Ouro tem duas categorias de melhor ator). A disputa parecia acirrada entre os dois.
“Oh, meu Deus!”, disse Malek ao tomar o microfone. “Minha mãe está aqui em algum lugar.” Ele citou que o pai, já falecido, também o estava observando nesse “momento monumental”. “Talvez eu não tenha sido uma escolha óbvia (para interpretar Freddie Mercury), mas acho que funcionou no fim. Obrigado ao Queen por ter me deixado ser uma pequena parte do fenomenal legado de vocês. Sempre terei essa dívida com vocês."
O ator continuou seu discurso adotando um tom moderadamente político num momento em que Trump põe em marcha políticas anti-imigração. "Penso no que seria falar com o pequeno Rami que um dia isso iria acontecer com ele. Acho que aquela criança que tinha problemas de identidade (o ator é de origem estrangeira) ficaria impressionada. Sou também filho de imigrantes do Egito. Sou um americano de primeira geração. Parte da minha história está sendo escrita agora. Não poderia estar mais grato a todos vocês e aos que acreditaram em mim por esse momento. Por fim, ele se dirigiu à namorada, Lucy Boynton, com quem contracenou no filme, elogiou o talento dela e disse: Você faturou meu coração!”.
Embora Glenn Close, em sua sétima indicação ao Oscar, fosse apontada como favorita na categoria de melhor atriz, o Oscar foi para a britânica Olivia Colman (“A favorita”), que subiu ao palco emocionada e lutando para encontrar as palavras.
“Yorgos (Lanthimos), meu melhor diretor. Emma e Rachel, as melhores mulheres por quem eu poderia me apaixonar. Glenn Close, você foi meu ídolo por tanto tempo”.
Colman interpreta a rainha Anne envolvida num triângulo amoroso e em intrigas palacianas. O Oscar de Olivia Colman foi o primeiro (e único) da noite para "A favorita", líder em indicações (10 no total), ao lado de "Roma". Com a premiação bastante equilibrada, "Roma" tinha, até esse momento, apenas duas estatuetas. O filme mais premiado é "Bohemian Rhapsody" (quatro estatuetas).
Mas logo em seguida "Roma" aumentou seu placar, com o Oscar de melhor diretor dado a Alfonso Cuarón.
“Muito obrigado. Nunca me canso de subir ao palco. Quero agradecer a muitas pessoas, obviamente a Yalitza Aparicio e Marina De Taviro (atrizes), que são o filme”, disse o diretor. Depois de citar produtores e mencionar o CEO da Netflix, Ted Sarandos, se referiu também aos outros dois diretores mexicanos de sucesso em Hollywood, Guillermo Del Toro, de quem recebeu o prêmio, e Alejandro González Iñarritu.
Cuarón disse ainda que seu filme é sobre "uma das 17 milhões de empregadas domésticas do mundo, sem direitos. Uma personagem que historicamente é deixada no pano de fundo do cinema. Muchas gracias a mi família; muchas gracias, México".
Julia Roberts encerrou a noite, anunciando o melhor filme: "Green book - O guia", que desbancou "Roma". "A história fala de amor, de amar um ao outro, apesar das diferenças e de descobrir quem somos e que somos todos iguais", afirmou o diretor Peter Farrelly. Ele disse ainda que o filme existe por causa do ator Viggo Mortensen.
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