Não é de hoje que o cinema nacional joga suas lentes para a música popular brasileira e para a vida dos seus cantores e instrumentistas. O dueto entre cinema e música já gerou filmes como Cazuza - O tempo não para, de Sandra Werneck e Walter Carvalho, Dois filhos de Francisco, de Breno Silveira, e os documentários Uma noite em 67, de Renato Terra e Ricardo Calil, e Tropicália, de Marcelo Machado, para ficar em alguns títulos bem-sucedidos.
saiba mais
Confira as razões de quem ama ou odeia o filme sobre o Queen e Freddie Mercury
Filme 'Todas as canções de amor' aposta no roteiro romântico
Filme A prece acompanha um jovem que 'atravessa a morte em vida'
'Entrevista com Deus' discute a fé e a fragilidade humana em encontro de repórter com o Criador
Mostra Cinema e Direitos Humanos começa nesta sexta-feira em BH com entrada franca
Uma das composições do compositor, cantor e baterista Wilson das Neves (1903-2017), O samba é meu dom intitula o documentário do mineiro Cristiano Abud, que acompanhou junto com sua equipe a rotina de Neves em seus últimos anos. Além desse material captado por Abud, o filme traz depoimentos de artistas que trabalharam com o sambista, como Chico Buarque e Elza Soares, e imagens de arquivo.
Com uma narrativa semelhante, Inezita, de Helio Goldsztejn, reconstrói a trajetória de Inezita Barroso (1925-2015), conhecida do grande público pelo programa Viola, minha viola, que ela apresentou durante 35 anos, na TV Cultura. O documentário, no entanto, mostra outras facetas da cantora, apresentadora e atriz – ela está no elenco de sete filmes. Inezita, que foi uma incansável divulgadora da música caipira, chegou a viajar pelo país coletando material sobre manifestações culturais populares, assim como fizera Mário de Andrade.
Duas diretoras, Ana Rieper e Susanna Lira, fazem dois belos retratos dos seus personagens documentados. Em Clementina, Ana Rieper vai atrás das origens de Clementina de Jesus (1901-1987), em Valência, no Rio de Janeiro, para traçar um painel antropológico da sambista carioca, que começou a cantar com 63 anos e até então passara grande parte deles trabalhando como empregada doméstica.
CACILDIS Em Mussum, um filme do cacildis, Susanna Lira equilibra bem as histórias do comediante de Os Trapalhões com o seu trabalho como músico do grupo Os Originais do Samba e a maneira como Antônio Carlos Bernardo Gomes, o Mussum, educava seus filhos e lidava com o preconceito racial.
No documentário Adoniran - Meu nome é João Rubinato, Pedro Serrano recupera a vida do autor de clássicos como Trem das onze e Saudosa maloca, que perambulava pelos bairros populares e pelo Centro de São Paulo, à procura das histórias do povo simples, fonte da poesia de suas composições.
Em Com a palavra, Arnaldo Antunes, Marcelo Machado coloca o ex-integrante do Titãs para assistir a imagens de sua carreira. Dessa relação, o diretor revela um artista coerente e sem medo de se arriscar. Numa São Paulo com violência crescente e quase sem poesia, Linn da Quebrada, personagem retratada no corajoso e transgressor Bixa travesty, de Claudia Priscilla e Kiko Goifman, faz do seu corpo e da sua voz ecos de uma sobrevivência marginalizada.
Na ficção, Todas as canções de amor, de Joana Mariani, em cartaz em Belo Horizonte desde quinta-feira passada, utiliza criativamente clássicos da MPB e quatro canções internacionais para narrar a história de dois casais, em tempos distintos, entre cotidianos, brigas e reconciliações.
De Pernambuco vem Azougue Nazaré, de Tiago Melo, que fica na fronteira entre o documentário e a ficção. A história se passa em Nazaré da Mata, numa zona canavieira, quando um grupo de maracatus entra em confronto com um pastor de uma igreja neopentecostal da região, que enxerga naquela manifestação popular de raízes africanas uma adoração ao demônio. Trata-se de um filme que discute a intolerância religiosa para com as tradições culturais afro-brasileiras. O longa foi premiado no Festival de Roterdã nesde ano. (Estadão Conteúdo)