Neste 2018, a banda Planet Hemp comemora seus 25 anos. Nessa longa trajetória não faltam histórias para ser lembradas. Algumas polêmicas, como a prisão do grupo em Brasília, em 1997, sob acusação de fazer apologia ao uso da maconha. Porém, não foram escândalos assim que chamaram a atenção do cineasta Johnny Araújo. Em Legalize já! – Amizade nunca morre, filme que estreia hoje nas salas do Brasil, o foco é na relação de Marcelo D2 com Skunk, que morreu de Aids sem ver o sucesso da banda que ajudou a criar. O início de tudo.
As primeiras ideias para o projeto surgiram na mesa de bar. Entre um e outro copo de cerveja, Marcelo falava da admiração e do respeito pelo amigo, morto em 1994. Sobretudo, chamava a atenção para a importância dele na criação do Planet Hemp.
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Antes de ser filmado, o roteiro passou pelas mãos de Nelson Motta, Patrícia Andrade e Luiz Bolognesi. Ganhou cerca de 15 tratamentos. Com o passar do tempo, Johnny passou a não se identificar mais com o que estava ali. Foi quando Felipe Braga entrou na equipe e se dedicou por dois anos ao roteiro definitivo.
As dificuldades de produção esbarraram no título do longa. “As pessoas o entendiam como apologia à maconha, complicando a captação de recursos”, conta. Outros dois títulos – Anjos da Lapa e Meu tempo é agora – chegaram a ser cogitados, mas não vingaram.
Johnny conta que D2 foi fundamental para o projeto. “Marcelo parou tudo o que estava fazendo – e olha que a agenda dele é uma loucura. Mergulhou de cabeça”, diz. A trilha sonora é assinada por D2, Mauro Berman e Lourenço Monteiro.
LOTERIA
No início dos anos 1990, Luis Antônio, o Skunk (Ícaro Silva), e Marcelo (Renato Góes) lutavam para sobreviver. O Skunk de verdade chegou a trabalhar em uma lotérica. No filme, o personagem vende fitas cassete com seleção de músicas para clientes que trabalham em escritórios no Centro do Rio de Janeiro. Por ali também ficava a banca de Marcelo, que vendia camisetas de bandas de rock.
Porém, não foi a paixão pela música que os aproximou. Para não entrar em cana, Skunk (suspeito de tráfico de drogas) e Marcelo (fugindo do rapa que perseguia camelôs) saíram em disparada pelas ruas cariocas até baterem de frente, literalmente.
Skunk vivia num quarto rodeado de equipamentos de som e fitas das bandas Beastie Boys, Joy Division, Ratos de Porão, House of Pain e Dead Kennedys. Marcelo enfrentava problemas com o pai, Dark (Stepan Nercessian), e a namorada, Sônia (Marina Provenzzano), em dúvida sobre abortar. A atmosfera dos anos 1990 dialoga com o atual momento político e social deste Brasil racista e violento. Johnny conta que teve liberdade para usar recursos da ficção: “Em uma cinebiografia, você não pode ser escravo da realidade. Não fica bom.”
Escalar o elenco não foi tão difícil quanto viabilizar o projeto. Ícaro Silva “passou” em um teste rápido e teve liberdade para improvisar o seu Skunk. O ator diz que a mensagem importante do filme é falar sobre afeto, “sentimento esquecido”, segundo ele.
Ícaro manda bem, mas Renato Góes é o destaque. O ator pernambucano foi escalado para viver D2 muito antes de fazer sucesso nas novelas Velho Chico (2016) e Os dias eram assim (2017), exibidas pela TV Globo. Por três meses, morou em Santo Cristo e no Catete, assim como o rapper. Chegou a vender camisetas no Largo do Machado, além de acompanhar turnês da banda.
Naqueles anos 1990, o Rio de Janeiro do Planet Hemp é a cidade do abandono. Para recriar esse clima, Johnny Araújo optou pela fotografia saturada, “para dar a cara de aridez daquele microuniverso abandonado, da boemia, das prostitutas, do lugar onde ninguém queria ir”, explica. Seis meses depois da morte de Skunk, o Planet lançou seu primeiro álbum, Usuário, que faturou o disco de ouro. Uma das faixas, aliás, é Legalize já. O resto é história.