Certos filmes não fascinam plateias por sua inventividade ou ineditismo, mas, ao contrário, por apresentar novas formas de desenvolver um enredo já conhecido de parte do público. A máxima talvez explique a reincidência do título Nasce uma estrela no cinema norte-americano. O conto de fadas moderno – sobre uma jovem simplória e talentosa, que alcança a fama – ganhou as telonas em 1937, com Janet Gaynor como a protagonista, e inspirou refilmagens: em 1954, com Judy Garland; em 1976, com Barbra Streisand.
A quarta versão chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (11), com Lady Gaga e Bradley Cooper nos papéis centrais. Além de atuar, Cooper também é responsável pela direção. O novo longa traz a trama para os dias atuais e reúne elementos contemporâneos, mas não se distancia por completo das outras três versões, exibindo releituras de cenas e referências diretas a essas produções.
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À medida que a nova artista ascende, o veterano do country entra em declínio. Jackson vê sua amada adentrar o showbiz, adequar seu visual aos conselhos dos empresários, mudar seu estilo musical e conquistar números expressivos no cenário musical. Os conflitos artísticos evoluem com o decorrer da trama e acentuam a barreira intransponível na relação do casal: a dependência química do galã.
DESAFIO Com o papel, Bradley Cooper revive no cinema um drama pessoal: o alcoolismo. Em entrevistas, o ator já assumiu a compulsão por bebidas, que quase pôs fim à sua carreira. O maior desafio dos atores de Nasce uma estrela talvez tenha sido desprender suas imagens das dos personagens, a fim de convencer os espectadores de que, em cena, não se vê Cooper e Gaga, mas Jackson e Ally.
A dupla principal constrói personagens convincentes e a aproximação dos enamorados transcorre de forma sutil e verossímil. Determinadas sequências asseguram a química entre eles, com destaque para a cena – nada piegas e inusitadamente sensual – em que Jackson acaricia o nariz de Ally, a maior insegurança da jovem.
Com um visual semelhante ao de Jeff Bridges em Coração louco (2009), Cooper emposta a voz e seu Jackson Maine chega a remeter ao ícone do country Johnny Cash (1932-2003) – não só pelo estilo musical, mas também pela trajetória de um amor ajudando a superar os vícios. O ator reafirma sua sensibilidade ao compor tipos controversos, já demonstrada em O lado bom da vida (2012) e Sniper americano (2014), que lhe renderam indicações ao Oscar.
Lady Gaga, por sua vez, se revela uma ótima atriz dramática. A célebre cantora já sinalizava essa outra faceta com o desempenho na quinta temporada de American horror story, que lhe garantiu, em 2016, o Globo de Ouro de melhor atriz em minissérie ou telefilme. Em Nasce uma estrela, ela cativa como uma mocinha forte, porém insegura. Não à toa, seus melhores momentos acontecem no palco, quando a inexperiente Ally encara plateias superlotadas, com medo e euforia. Gaga surpreende como atriz e ainda solta o já conhecido vozeirão.
Assista ao trailer:
SHALLOW Desde sua exibição no Festival de Toronto, em setembro, o novo Nasce uma estrela é apontado como um forte concorrente para a próxima temporada de premiações cinematográficas, que se inicia no final deste ano. Todos os atores que viveram os papéis equivalentes aos de Ally e Jackson nas demais versões conquistaram indicações a prêmios relevantes, mas não chegaram a levar um Oscar.
Em 1977, a música tema do terceiro filme, Evergreen, composta por Barbra Streisand e Paul Williams, foi premiada pela Academia com o título de melhor canção original. Além de possíveis nomeações para Gaga e Cooper (que pode também faturar uma indicação como diretor), a trilha sonora original, composta por Gaga com colaboração de Elton John, mostra grande potencial.
Divulgadas nas plataformas digitais, as canções dão fim a um hiato de lançamentos na carreira de Lady Gaga. Na trilha do filme, ela reprisa o rock com pegada country de seu último álbum, Joanne, de 2016. A grande aposta, entre as faixas, é a belíssima Shallow, dueto com Bradley Cooper, que acompanha os desencontros de Ally e Jackson. O videoclipe oficial já ultrapassou a marca de 20 milhões de visualizações no YouTube. Assista:
GESTAÇÕES ANTERIORES
Relembre outras versões de Nasce uma estrela:
. 1937
Direção: William A. Wellman
Mais romântica e sonhadora que a “estrela” de Lady Gaga, Esther (Janet Gaynor) partiu para a glamourosa Hollywood da década de 1930 para tentar a carreira de atriz. Seu par de cena é Norman Maine (Fredric March), um astro das telonas em decadência.
. 1954
Direção: George Cukor
A música ganhou vez nesta adaptação e nas outras duas que a sucederam. Judy Garland deu vida à nova Esther, que, como a anterior, sonha em brilhar no cinema. O musical tem James Mason como par romântico da mocinha.
. 1976
Direção: Frank Pierson
A versão protagonizada pelos cantores Barbra Streisand e Kris Kristofferson é a que mais se aproxima da de Gaga e Cooper. O universo de drogas e do rock‘n’ roll na década de 1970 fez a indústria cinematográfica sair de cena. O galã da vez é um roqueiro de sucesso e a heroína é uma aspirante a cantora.